1 - Dia 0

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Dia 0

6:30h da manhã...

Bati com as mãos no guiador, cantando, enquanto esperava o sinal abrir.
O sol já deixava esperar um dia quente de Verão. Ah o Verão... eu amava isso. O calor, a praia, as férias...
Suspirei. Eu ainda não iria ter férias. Meu patrão era o meu pai, e isso tanto era algo bom, como algo péssimo.
Meu pai era um ex Sargento do exército nacional, que deixara sua carreira longa e incrível, por estar cansado de guerras e morte. Então, um belo dia, decidiu sair do exército, comprar um caminhão e sair por aí, ganhando a vida dirigindo. Não que ele precisasse, mas era bastante complicado para ele estar parado.
Foi nesse ano que perdi minha mãe, uma enfermeira linda, ruiva, de olho verde (tal como eu). Ela morrera de acidente de carro. Morreu no local. A última vez que vi ela, foi quando ela me deixou na escola, ainda eu não sabia ler direito.
Assim que fiz dezasseis anos, meu pai me levou com ele, oficialmente, como sua companheira de estrada.
Ele era bastante legal: sabia atirar, caçar... Cada fim de semana em casa era uma aventura, saíamos para acampar no lago ou na floresta, caçando e vivendo ao ar livre. O resto do tempo, trabalhávamos no caminhão, que ele me ensinou a dirigir para poder ajudá-lo.
Assim, tinhamos uma boa relação.
Olhei para o lado, vendo um homem num carro vermelho.
Ele me olhou e sorriu, aquele sorriso galante.
Revirei os olhos e olhei o sinal, vendo ele abrir.
Pisei o acelerador e foi quando tudo aconteceu.
Do nada, os carros começaram a bater uns nos outros. Vi carros batendo em paredes, em vitrines, voando ao chocarem contra algo, caindo de pontes...
Minha pick up foi jogada contra a parede de um prédio, quando tentei desviar ela da rota de colisão de um ônibus.
O vidro quebrou e bati com a cabeça, sentindo o gosto de sangue na boca e uma dor forte na testa, bem como a sensação de algo escorrendo. Toquei com a ponta dos dedos e percebi ser sangue.
O carro vermelho do homem de sorriso galante, estava agora esmagado sob um caminhão que tombara.
Olhei, incrédula, para tudo aquilo e foi quando vi algo se movendo no céu. Espreitei, me inclinando na frente, e vi um avião caíndo em direção dos prédios da frente.
- Oh merda!
Tirei o cinto nas pressas e me joguei para baixo o mais que pude, protegendo a cabeça com os braços.
O estrondo foi tão grande, que o chão estremeceu e vários carros começaram a apitar. O abalo ainda nem tinha terminado, quando outro estrondo se fez ouvir, mais afastado.
Escutei uma nova explosão, seguido do som de algo queimando e alguma coisa caiu em cima da minha pick up, atravessando o vidro quebrado, batendo nas minhas costas e ficando ali, sobre o banco e sobre mim. O que quer que fosse, estava quente...
Esperei mais um pouco, escutando aquele estalido de coisas queimando, e depois, sem que houvesse mais explosões, afastei o que caíra sobre mim e ergui a cabeça, sentando no banco.
Olhei para o lado e gritei, afastando aquilo de mim, me afastando tanto quanto o interior da pick up permitia.
O que caíra pelo vidro, era nada mais, nada menos, do que um braço queimado, com uma parte do ombro ainda agarrada.
Afastei aquilo ainda mais, o cheiro era horrível a carne queimada, e abri a porta, mas como eu encostara nela, acabei caindo de costas no chão.
Fechei os olhos. Aquilo doera.
Levantei, a custo, tremendo e fiquei ali, de pé, meio curvada, olhando em volta sem acreditar no que os meus olhos estavam vendo.
Fumo saía de todo o lado, chamas se erguiam de alguns ponto, corpos estavam espalhados por todo o lado, sendo em maior número nos passeios da beira da estrada.
Me afastei da pick up e fui até junto de um corpo, ainda inteiro e abaixei. Respirei fundo, mas só queria chorar. Estiquei a mão e sacudi seu ombro.
- Moço. - Chamei. - Moço!
Agora sim, eu queria chorar.
Coloquei dois dedos no pescoço dele... Estava morto.
Sentei no chão, chorando, e tremendo. O que estava acontecendo? Porque todos estavam mortos? Todos menos eu!
Um gato correu, atravessando a estrada, assustado.
Escondi a cabeça nos braços, que estavam apoiados nos joelhos dobrados junto do peito.
O cheiro a combustível, coisas queimadas, incluindo carne, e fumo era horrível e muito pesado.
Ergui a cabeça e vi o sinal fechando de novo. E foi aí que lembrei do meu pai.
Levantei, mancando, e entrei na pick up, desviando corpos que caíram atrás dela, para eu poder passar.
Sentei no banco e olhei o braço, do meu lado.
Respirei fundo, peguei ele e joguei na rua, estremecendo. Liguei a pick up e saí dali, dirigindo até casa.
O cenário era algo surreal.
Carros parados, batidos, amassados, virados; corpos por todo o lado... Uma autêntica destruição digna de filme.
O caminhão do meu pai se mantinha estacionado no mesmo lugar e suspirei de alívio. Talvez ele estivesse bem.
Saí da pick up, deixando ela no jardim, e corri para casa, abrindo a porta e entrando, mas parando ao chegar na sala.
Meu pai estava no sofá, desacordado.
- Não... Você não...
Me aproximei dele, já sentindo as lágrimas caindo pelo meu rosto sujo de cinza e sangue. Minhas mãos negras  e  vermelhas, de terem movido os corpos, agarraram seu ombro e sacudi com toda a força.
- Pai! - Minha voz saiu com falhas, devido ao estado desesperante em que me encontrava.
Ele abriu os olhos de repente e começou a gritar, me fazendo pular de susto e gritar que nem louca.
Depois do susto, abracei ele, chorando e apertando nos meus braços.
- Você está vivo! Você está vivo!
Ele me rodeeou com os braços, com cautela.
- Claro que estou vivo, Lauren, que raio de conversa é essa? - Ele me afastou e olhou minha testa. - Minha nossa Senhora, o que aconteceu com você?
Franzi o cenho.
- Você não escutou? Você não viu?
- Vi o quê? Peguei no sono assim que você saiu. Dormi feito uma pedra até você me acordar nesse estado.
Passei a mão pelo cabelo e olhei para o lado. Como aquilo era possível?
Ele segurou meu queixo e me fez olhá-lo.
- Lauren, o que houve? Você precisa de um médico.
Suspirei. - Temo que médicos já não não existam.
Ele franziu o cenho. - O que... Ficou maluca? Como não existem? Você bateu com a cabeça?
- Por acaso, sim. - Ri.
- Lauren! Me fala o que aconteceu! Porque eu acho que ficou vendo demasiados filmes de zumbi!
Levantei e segurei a mão dele.
- Vem comigo, se eu contar, você não vai acreditar.

LegadoWhere stories live. Discover now