CAPÍTULO 06

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Repassei o número do Asilo Girassol incontáveis vezes pela minha cabeça

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Repassei o número do Asilo Girassol incontáveis vezes pela minha cabeça. Já sabia de cór, mas não tinha coragem para ligar para lá. Uma dúvida ficou martelando na minha cabeça e era algo que nunca teria resposta. O Alzheimer é uma daquelas doenças cruéis que te dão alegria em um dia e no outro tira tudo o que mais importa de você. Eu vi aquilo na minha frente e não tive capacidade para lidar, por isso fugi, me mantive bem longe do meu pai que só sabia direcionar ofensas à mim, mas não tinha coragem para me afastar do Seu Venceslau ainda mais sendo ele quem era para mim.

Quanto mais tentava ignorar, mais ele voltava a minha mente como algum tipo de memória recente e vivaz, daquela que é sempre muito importante, e no fundo ele era muito importante pra mim talvez por isso que tinha tanto medo dele nunca mais me reconhecer.

Observei o reflexo do Sol de primavera sobre o vaso de comigo-ninguém-pode encostada na parede cinza do lado direito. Tinha uma samambaia minguando lentamente no vaso pendurado na parede. Eu e Amália não falamos mais sobre o Oscar, nem sobre o que sentíamos de verdade. Às vezes tinha a certeza de que tudo o que um dia tivemos desapareceu das suas lembranças e só sobrou o que eu persistia em sentir. Aquilo tudo era só meu.

Suspirei de exaustão mental. Desbloqueei o aparelho e apenas disquei o número do Asilo, ligando a cobrar atrás de alguma notícia do Seu Venceslau. Mesmo após três toques ninguém atendeu. Tentei de novo e minha esperança foi pelo ralo quando depois do primeiro toque desligaram a chamada. Ninguém quer pagar por nada. Era nesses momentos que os orelhões faziam a maior falta.

Pensei em ir até o apartamento do Inácio, mas tinha aquela sensação estranha de estar ocupando camadas mais profundas da sua vida, e não dizia apenas dos três últimos dias que passei limpando, cozinhando e fazendo apenas companhia enquanto tomava banho, ou almoçava, era mais algo sobre o último ano e nossos eternos silêncios juntos.

Acho que estava com medo daquilo.

Mas tinha outra pessoa que talvez pudesse me ajudar sem todo esse drama mental. Por isso desci até o 102 e no segundo toque da campainha, fui atendido por Luena. De blusa social e short jeans ela parecia profissional da cintura para cima.

— Tobias?... — Juntou as sobrancelhas surpresa com a minha presença. — Tudo bem?

— Tudo. — Apesar de estar confuso com a sua arrumação pela metade.

Ela assentiu devagarinho sem saber que palavras usar.

— Eu tô em uma aula online agora, — Indicou o apartamento atrás dela. — o que foi?

— Foi mal, não queria atrapalhar. — Estava pronto para ir, mas ela sorriu.

— Pra você descer até aqui, ou tá com saudade de me ver ou é algo importante.

Voltei para a atenção dos seus olhos na soleira da porta. Era impossível não sorrir com aquele sorriso bonito.

— Na verdade, — Cheguei pertinho apoiando o corpo no batente. — eu precisava usar o seu telefone. — Franziu o cenho. — é que o meu pré-pago, — balancei o celular carente de qualquer inovação. — só funciona se tiver crédito. — Ela achou graça.

🏳️‍🌈| O Mar que Aqui RetornaWhere stories live. Discover now