CAPÍTULO 01

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Maio de 2022

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Maio de 2022

O sino da Igreja tocava todos os dias, às seis da manhã, meio dia, três da tarde e seis da noite, era um ritual. Ele batia alto e em todas as madrugadas, desde quando passei a ocupar um dos quartos vazios no Asilo Girassol, eu ouvia, envolto por insônia e inquietude aquele barulho, mas tocar às oito era incomum.

A Sônia insistiu para eu ficar ali depois que contei a minha história triste pra ela. Apesar de ser a enfermeira chefe, e praticamente a única pessoa que se preocupava com os idosos, ela não teve poder imediato para me ceder um quarto. Joana não me queria ali, mas era aquela coisa, eles precisavam de alguém para ajudar e eu precisava de um lugar para dormir.

De novo fiquei na posição de suportar determinadas coisas, só para meu bel prazer. Amália não me ligou depois que fui embora em meados de Dezembro. Ignorei as ligações do Inácio, mesmo depois dele ter depositado a última parcela do meu dinheiro. Luena era a única com quem eu queria manter contato. Foi na casa dela que dormi na noite que a Amália me expulsou. Foi com ela que fui pra praia na virada. Ela que me levou para o bloquinho em Santa Teresa e pra ver o desfile na Sapucaí. Era ela que me mandava diversas mensagens falando sobre as séries que estava assistindo.

Desde aquela noite não pisei mais no Edifício no Centro, nem na Praia do Flamengo ou em qualquer ponto que fosse perto demais. Queria esquecer que algum dia estive lá, mas isso era um pensamento estúpido para quem sempre guarda as coisas e despeja sentimentos em coisas que não tem valor algum.

— Acho que tá quebrado.

Expeli a fumaça com os olhos na torre da Igreja.

Atrás do asilo era o melhor lugar para ver a Igreja e fumar bem longe dos olhos atentos da Joana.

— Tem coragem de subir lá e arrumar? — Tombei os olhos na direção do Gustavo que colocava a mochila no chão.

Ele riu todo sem jeito.

— Subo nada. Tenho medo de altura. — Aquela foi uma piada engraçada. — Tô falando sério.

O cara subia em andaimes para arrumar a laje do prédio adjacente ao asilo e queria dizer que tinha medo de altura.

— Vou fingir que acredito.

— Seja como for. — Fez o sinal da cruz e beijou o escapulário no seu pescoço. — Sempre bom pegar benção. — Não reagi ao seu gesto comum. — Tem cigarro aí?

— Viu a Joana? — Olhei para o corredor atrás dele, na tentativa de ver a figura dela andando por ali.

— Quando entrei aqui ela tava indo pra igreja.

Sustentei o cigarro entre os lábios e tirei o maço e o isqueiro do bolso. Gustavo fez as honras.

— Menos mal. — relaxei as costas na parede.

Não estava com saco para lidar com suas repreensões tão cedo. Já estava velho demais para aquilo.

Observei seus gestos silenciosos do meu lado. Gustavo era um dos ajudantes do Beto, o pedreiro que foi contratado para finalmente reformar aquele prédio anexo. De acordo com Sônia, a igreja conseguiu verba suficiente para comprar os materiais e pagar a mão de obra. A reforma da casa principal e a compra de novos remédios para o estoque do asilo ficaria para depois, assim como aumentar o quadro de funcionários. Em cinco meses vivendo ali, percebi que a irmã Joana preferia ter voluntários dos mais diversos.

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