CAPÍTULO 17

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Seu Venceslau pensou que ainda estava casado

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Seu Venceslau pensou que ainda estava casado. Não se lembrou de mim, desconheceu a Sônia e ficou sentado sozinho na mesa do lado de fora com a caixinha de dominó. Nunca conseguiria entender como ele esquecia tudo, mas se agarrava àquele jogo.

Essa era uma das diferenças entre nós dois. Eu não conseguia esquecer de nada e mesmo se esquecesse, não teria nada real para me apegar como em uma espécie de bote salva vidas. Eu vivia à deriva, sozinho, sendo levado pelas águas de um mar que sempre retorna para o mesmo lugar.

— Tem certeza de que ainda consegue me ganhar, garoto?

Ainda tinha três peças comigo e ele uma. Duas batiam tanto no início quanto no fim, assim como a dele.

Dei de ombros e pus uma das peças no início. Ele bateu no fim.

— Já era um jogo perdido pra mim.

O sorriso dele desapareceu quando comecei a embaralhar as peças. Era a nossa terceira rodada e como em todas as outras vezes ele olhava ao redor ansioso em uma espera.

— Esperando alguém?

— Minha esposa, — Parei de embaralhar. — a mulher lá dentro disse que avisou ela onde eu estava.

Não reagi.

Não seria eu que tiraria dele o que era mais importante pra ele.

— Como ela é?

Já havia visto fotos dela na sua casa.

O sorriso bobo marcou as rugas da idade.

— Bonita, inteligente, — ajeitou os óculos. — mais do que eu. — riu. — Vai ficar furiosa quando ver que esqueci o nosso compromisso porque me perdi.

— Ela gosta de Cartola?

Ele mesmo havia me dito aquilo quando perguntei sobre a quantidade imensa de discos de um dos sambistas mais queridos na prateleira da sua antiga sala.

— Como gosta! — Tinha uma alegria infantil nele. Era a primeira vez que via ele tão animado com alguma coisa.

A sua casa era vazia demais apesar de cheia de poeira e saudade em objetos bem cuidados.

— Aquela mulher às vezes parece que ama mais aquele sambista da Mangueira do que eu.

A maneira como falou foi engraçada. Naquela altura ele não prestava mais atenção nas peças. A cabeça e o coração estavam em outro lugar.

— Vamos mais uma?

— Não, não, — Suspirou. — vou tentar ligar pra ela. — Tomou impulso na mesa e ficou de pé, mas não deu um passo.

As sobrancelhas ralas reforçaram o vinco em sua testa naquela expressão confusa.

— Tá tudo bem?

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