29. ESPAÇOS

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you were good to me - Jeremy Zucker
"Mentir não é melhor do que o silêncio
Flutuando, mas parece estou morrendo
Porque você era bom para mim."

Any

Eu não podia estar ouvindo direito.

Uma doença terminal?

— Não, não — neguei-me, tentando não afogar-me nas lágrimas. — Como assim? O que quer dizer com isso? Por favor, me diga que está brincan-

Ele respirou fundo e me interrompeu em alto e bom som:

— Eu vou morrer, Any, e não há nada que possa ser feito. Absolutamente nada.

Me agarrei à parede mais próxima, e meu mundo ficou em silêncio. Pensamentos não paravam de surgir e eu não conseguia controlá-los.

O que eu faria agora?

Josh me deixaria aqui, sozinha?

— Porque não me contou antes? — perguntei, agora já não conseguindo segurar o choro. Fiz meu máximo para controlar meus soluços a fim de não acabar em uma crise.

Ele poderia ter evitado todo aquele sofrimento.

— Eu sei, eu sei que deveria — admitiu, abaixando a cabeça. — Mas eu queria viver algo diferente. Queria me sentir livre.

— Como assim?

— Quando eu tava em Toulouse, minha família e meus amigos agiam como se cada dia fosse o meu último — começou e causou uma pontada em meu peito. — E eu sei que não faziam por mal, mas... parece que esqueciam que aquele não podia ser apenas o meu último dia, mas sim o de qualquer outra pessoa. A gente não sabe quando vai embora, e o fato da minha doença aumentar as minhas chances não anula isso.

Ouvir tuas palavras machucou-me ainda mais. Ele havia passado por tudo aquilo sozinho, e eu o interpretei mal diversas vezes, fazendo-o sofrer ainda mais.

— Sabe...  — continuou Josh — também queria proteger você de tudo isso. Querendo ou não, o câncer é um grande fardo, e eu não queria afetar a sua vida com ele. Eu consigo carregá-lo sozinho.

— Mas eu poderia ter te ajudado. Eu pensei que você confiasse em mim.

Doía em mim ser um pouco rígida com as palavras, mas senti que precisava ser completamente honesta com ele.

— Eu sei... mas cheguei a um ponto que não sabia mais como te contar. Guardei esse segredo por tanto tempo que me acostumei com isso.

Senti que se ficasse ali por mais tempo iria explodir em palavras não pensadas e isso não seria o ideal.

— Me desculpa, Josh — disse, limpando as lágrimas e levantando do chão que nem percebi que havia caído. — Preciso de um tempo sozinha.

Ele assentiu dolorosamente e eu saí, sem rumo, sem saber o que fazer, como agir e para onde ir.

Não poderia recorrer a Shivani, pois ela não sabia da doença e aquele segredo não era meu para espalhar. Por mais que estivesse chateada, eu ainda era um ser-humano decente.

Noah, muito menos, pois sempre iria tomar o lado de Josh e com certeza não era alguém bom para me escutar.

Bailey esfaqueara-me pelas costas. Meus amigos locais estavam muito ocupados com futilidades e àquele ponto, não sabia se eram realmente meus amigos. Minha mãe não queria nem saber da minha existência.

Eu não tinha ninguém.

Josh era alguém que eu confiava. Mas ele poderia me deixar em breve.

Sem pensar, corri até o último andar da faculdade: era ali que o bar se localizava. Não havia ninguém, apenas os funcionários e eu, em uma situação péssima.

Cheguei ao balcão e supliquei:

— A coisa mais forte que tiver, por favor

O atendente mostrou-se confuso e assegurou;

— Tem certeza?

Tentei limpar as lágrimas e parecer menos desorientada: sem sucesso.

— Sim, tenho — respondi.

Ele preparou algo que eu não fazia a mínima ideia do que se tratava e colocou o copo na minha frente. Agarrei-o com força e dei meu primeiro gole, sentindo minha garganta arder e também me sentindo péssima.

Não era uma boa forma de fugir dos meus problemas.

Ao beber mais, percebi que a dor não estava indo embora. Tudo estava ficando pior. Estava me consumindo por completo.

— Any! — ouvi uma voz desesperada e não me virei para olhar. Não queria que fosse Josh.

Entretanto, o indivíduo chegou mais perto e agarrou meu braço, continuando:

— Eu estava procurando por você.

Era... Noah?

Em um ato inesperado, o garoto me abraçou de forma reconfortante. Parecia que me entendia completamente.

— Agora você também sabe, né?

Urrea me afastou do balcão ao perceber que eu não conseguia responder pois os soluços me impediam.

Ele pediu ao atendente um copo de água e devolveu a bebida, o que me aliviou. Noah fez o que não consegui fazer antes.

Quando finalmente consegui oxigênio necessário para tal, descarreguei:

— Eu só não consigo acreditar que Josh esteve sofrendo calado por todo esse tempo e não há mais tempo para consertar.

Ele assentiu, acariciando uma de minhas mãos.

— Eu entendo, Any, eu também estive em uma situação parecida com a sua. Claro, descobrimos de formas diferentes, mas eu também fui surpreendido com a notícia de que meu melhor amigo estava morrendo. Sei como você se sente.

Suspirei aliviada. Diferente do que pensara, Noah parecia ser sim a pessoa certa para conversar. Ele sabia exatamente o que eu estava passando.

— Eu estou completamente perdida, Noah.

A notícia foi um baque tão grande que não havia sido capaz de digerir. Como aquilo aconteceu em tão poucas horas? Fomos de um casal apaixonado para um prestes a desmoronar, assim, em um estalar de dedos?

— Confesso que no início foi difícil para mim também. Sei que parece impossível, mas você vai se acostumar com essa ideia e vai aceitá-la. Você sabe o que vai acontecer, sabe que é uma doença terminal e que não vai terminar bem. Você vai sofrer, se lamentar, mas não pode deixar que isso pare sua vida agora, nem depois. Assim como Josh não o fez quando recebeu o diagnóstico.

As palavras de Noah foram reconfortantes, mas não acabaram com toda a dor. Claro, isso iria demorar para acontecer. Ainda havia um lado meu que não aceitaria tal destino.

– Você acha que eu devo ir falar com ele? – perguntei, realmente confusa.

– Isso é você quem decide. Mas saiba que você precisa esperar a cabeça esfriar e Josh também precisa de um tempo para se acostumar com isso. Agora, todo mundo vai saber – respondeu. – Mas também não pode esperar demais. Você pode se arrepender de perder alguns momentos no futuro, entende?

O garoto podia não ter curado tudo, mas conseguiu esclarecer algumas ideias perdidas na minha cabeça. Então, estava decidida: iria falar com Josh, mas não naquele momento. Se eu pude esperar tanto tempo equivocada, tendo uma visão distorcida da realidade, ele também poderia esperar um pouco para eu entender tudo aquilo.

Mesmo que isso custasse alguns minutos perdidos.

Room 369 | BeauanyWhere stories live. Discover now