10_ Jonny

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Terminamos de comprar tudo o que eu coloquei na lista, incluindo coisas de farmácia, e finalmente saímos do mini shopping. Deviam ser quase três da tarde, tinham pequenos raios de sol escapando por entre as nuvens que deixava o céu de Manitou Springs dublado.

A cidade tinha cheiro de café fresco e maçã. Talvez torta de maçã.

Frank colocou todas as bolsas no porta-malas enquanto ele e Drake conversavam. No pouco tempo que conheci Frank, da para notar que ele é um cara extremamente auto astral, fala o que pensa, faz piadas idiotas, não liga para o que os outros estão pensando, ri de qualquer coisa e parece ser muito gente boa, mesmo com o fato de trabalhar para a máfia e nitidamente usar drogas ilícitas.

Já Drake é diferente. Ele é muito na dele, caladão, gosta de observar e as vezes, quando está com um olhar sério, parece até um assassino. A pele dele é branca, os olhos negros feito petróleo e o cabelo de mesmo tom. Ele tem uma postura impecável, é alto e tem ombros largos. Tem uma cicatriz no braço que não sei ao certo o tamanho. Não sei se tem tatuagens, pois nesse frio de início de inverno, tudo o que ele tem usado são jaquetas, mas torço para que não. Já é estranho eu achar atraente o cara da máfia que me sequestrou, se ele tiver tatuagens...

Além de toda a aparência de galã de filme de ação, Drake parece carregar um peso nele. Como se viver... Fosse doloroso. 

Balancei minha cabeça quando me vi com pena do cara que me trouxe para esse fim de mundo sem meu consentimento. " Ah, mas ele está salvando a sua vida " quem garante? Até semana passada eu nem conhecia ele!

ㅡ Ta tudo bem? ㅡ Ouvi a voz de Drake e o olhei. Assenti sem nem ter certeza do que ele tinha perguntado e desviei meu olhar, voltando a observar a pequena cidade.

Uma coisa eu precisava admitir: as montanhas já repletas de neve eram um cenário lindo demais. A cidade era cercada por elas e isso era de tirar o fôlego.

Acabei parando meus olhos numa pequena escola de dança. Talvez eu devesse parar de dizer que tudo aqui é pequeno. Talvez os da cidade grande sejam grandes demais. Pareço esnobe.

A escola tinha toda a parte da frente de vidro, como se fosse uma vitrine. Não sei se é de propósito, mas qualquer pessoa que passasse, consegue ver as alunas tendo aulas lá dentro. E era isso o que eu estava fazendo. Estava parada observando cerca de cinco garotas uniformizadas de collants, meias e sapatilhas, fazendo uma sequência na barra.

ㅡ Você pode... ㅡ Drake parou ao meu lado e indicou a escola com o queixo.

ㅡ O que? ㅡ Meu " o que " soou mais como " nem pensar ".

ㅡ Você não gosta de dançar? ㅡ Ele abraçou os braços virado para a escola, mas com os olhos em mim. Olhei para as meninas lá dentro sendo instruídas por uma mulher que parecia ter dois metros de altura e neguei com a cabeça.

ㅡ Eu não gosto de dançar. ㅡ Olhei para ele. ㅡ Esse só era o meu ganha pão. ㅡ Virei de costas para a escola.

Drake não disse mais nada, e eu agradeci por isso. Não queria explicar nada sobre a minha medíocre vida em que a única coisa que sou boa, é algo que eu nem gosto de fazer.

Percebi que estavam colocando várias cadeiras brancas na praça, viradas para o coreto. Fiquei curiosa para o que iria acontecer, mas não perguntei. Estava com dor de cabeça e queria ir para casa.

Casa...

Drake dirigiu de volta para a casa. Frank sumiu depois que Drake lhe pagou por ter sido nosso empregado no shopping e Drake logo saiu também, novamente na tentativa de me deixar mais a vontade na casa.

Passei um tempo guardando e organizando tudo no que seria o meu quarto agora. Arrumei as novas roupas no guarda-roupas, os produtos de higiene no banheiro, os sapatos na sapateira de prateleiras e o resto dos acessório na cômoda. Quando terminei tudo e me peguei sem nada para fazer, encarei o quarto já escuro por já ter escurecido e saí dali rapidamente, tentando evitar o que estava por vir.

Andei pela casa, observei os cômodos, as mobília caras, as molduras sem foto alguma, os vasos que antes deviam ter flores. É esquisito, essa casa parece uma casa familiar, como se já tivesse morado uma família ali, mas todas as lembranças e vestígios foram apagadas.

Desci para o andar de baixo, liguei a televisão e observei por pouco tempo o desenho com cores vibrantes que passava na tela. Abaixei o volume e saí da sala. Passei pela cozinha e saí pela porta dos fundos. O jardim atrás estava escuro, somente a lua e as luzes que vinham das casas vizinhas iluminavam o suficiente o gramado.

Estava tudo tão silencioso. Era difícil encontrar esse tipo de silêncio em Long Island. Geralmente o barulho dos carros, das músicas vindas das lojas, o falatório, sons de construção, tudo isso de uma vez só só ia diminuindo lá pra três da manhã. Agora eram sete da noite e já estava tudo quieto.

Uma vez ou outra dava para ouvir algumas risadas vindas das casas vizinhas, mas nada estrondoso. Nada que incomodasse.

Me sentei numa rede que estava pendurada na área com cobertura e deixei que acontecesse. Me permiti chorar. Eu ainda não tinha chorado e isso estava entalado em mim.

Droga, a minha vida não podia ser mais fácil? Por que eu não cresci como a maioria das pessoas que conheci? Por que não tive um lar? Uma mãe? Um pai? Um irmão ou uma irmã? Nunca tive prazer de chegar na escola para ver meus amigos e nunca tive prazer de chegar em casa para ver minha família. Nunca jantei em família num dia de ação de graças ou no Natal. Nunca senti que alguém realmente se importava comigo, a não ser a Mary, mas ela tem a vida dela, não tem tempo para ficar arrancando os cabelos por minha causa.

O vazio que eu senti era tão grande. Parecia que eu não vivi, mas que eu apenas sobrevivi por todo esse tempo.

Meu celular começou a vibrar no meu colo e só fiz chorar mais quando vi o nome no visor.

Jonny

Recusei a chamada e deixei que as lágrimas inundassem o meu rosto. Chorei. Chorei de soluçar. Tentei desabafar tudo o que pude naquelas lágrimas. Toda a dor que eu sentia por não saber realmente o que era viver.

O pior é que eu tinha me dado de conta de que não vivi até hoje e agora estava correndo risco de vida. Eu poderia morrer antes mesmo de saber o que é ter prazer em fazer algo gosta, em abraçar alguém que ama, em sorrir para pessoas que se importam...

O turbilhão de mensagens tomaram o meu celular após a segunda tentativa de uma ligação, também recusada.

Jonny: Chloe?
Atende o telefone
Por favor
Chloe
Onde você está?
Estou na frente da sua casa
Precisamos conversar
Por favor, não faz isso comigo, eu não tive culpa
Por favor, abre o portão
Chloe
Chloe, por favor
Eu não vou sair daqui antes de falar com você
Por favor

Ignorei todas as mensagens pensando ser um lado bom não poder responder ninguém.

Desliguei o celular para não ver mais as mensagens e abracei meus braços, observando a noite.

Já estava com as lágrimas secas na bochecha quando ouvi sons na casa. Olhei na direção da porta da cozinha até Drake aparecer nela e se escorar no batente, exatamente como fez ontem.

Ele não disse nada e eu também não. Ficamos apenas nos olhando, por vários segundos. Eu não o conhecia, não confiava nele, não sei o que esperar e nem o que vai acontecer, mas tenho medo de pensar que ele realmente se importa comigo e por isso está fazendo isso tudo. Tenho medo pois... Nunca dá bom quando eu confio em alguém.

•••
Continua...

Me ame, ChloeOnde as histórias ganham vida. Descobre agora