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Carter

Duas semanas passaram desde que o Leonardo teve o acidente. Os dias transformaram-se numa rotina de visitas ao hospital, ora com a minha mãe, ora com o Michael. Mesmo que o meu relacionamento com o Daniel estivesse a progredir, as sombras do que aconteceu com o Leonardo ainda me assombrava, especialmente quando estava sozinha.

Era terça-feira. Estava sentada no meu gabinete enquanto trocava mensagens com a Blake. Ela tornou-se a minha confidente e uma asseguradora da minha sanidade mental. Era alguém com quem podia partilhar tudo aquilo se passava e isso dava-me uma sensação de conforto e familiaridade, na minha vida.

O meu telemóvel vibrou pela vigésima vez em cima da secretária e nesse momento a porta do gabinete abriu-se, revelando a figura alta do Daniel.

Ele aproximou-se, com um sorriso encantador no rosto. Sem pensar muito, dei-lhe um beijo rápido. Mas a excitação que calor dos seus lábios trouxe levou-nos a tornar o beijo em algo mais intenso e descarado. A consciência de que estávamos a fazer algo que não deveríamos no local de trabalho, excitava-me.

- Senti a tua falta hoje durante o almoço. - murmurou, entre beijos.

Não soube o que responder, por isso não falei nada, apenas intensifiquei o beijo, para não lhe permitir falar coisa do género. Era estranho. Eu inicialmente estava tão ou mais interessada nele do que ele em mim e se tivesse que avaliar a situação à distância, eu tinha tudo para estar caidinha pelo meu colega de gabinete. Ele era exatamente o tipo de homem que eu sempre procurei. Mas então porque é que eu não ficava molhada com a simples ideia deste homem maravilhoso querer arrancar a minha roupa sempre que me beijava?

Eventualmente os beijos cessaram, mais pela falta de ar, do que qualquer outra coisa e o Daniel sugeriu jantar fora.

- Eu adorava, mas esta noite não posso. Vou com a minha mãe e o meu padrasto visitar o Leonardo depois do trabalho. - expliquei, esperando que ele compreendesse.

Ele arqueou uma sobrancelha, revelando um sorriso travesso. Parecia um miúdo - Se não soubesse que ele é teu meio-irmão, ficava com ciúmes. Vais visitá-lo todos os dias?

Ri-me de nervoso. Se ele soubesse da missa a metade não usaria um tom descontraído, certamente - Parece que sim. A situação é complicada, mas sinto que devo estar presente. Eu e o Leonardo não somos muito próximos, mas ele não deixa de ser parte da minha família agora.

Ele assentiu como se compreendesse. - Entendo. A família em primeiro lugar. Mas prometes que reservas uma noite para nós em breve?

Concordei com um sorriso. - Prometo. Uma noite só para nós.

Quando saí da universidade já a minha mãe e o Michael me esperavam. O caminho para o hospital foi preenchido por um silêncio pesado, quebrado apenas pelo som abafado do trânsito. Ao chegarmos, dirigimo-nos ao quarto do Leonardo, e a rotina familiar de preocupação e espera continuou.

Vinte minutos depois, tive de sair do quarto para buscar um café. A ansiedade dentro do quarto estava a causar-me desconforto e eu sentia-me sufocada. Enquanto caminhava, cruzei-me com o Liam.

A sua expressão foi estranha, como se estivesse a evitar o contacto visual. Ao aproximar-me, ele murmurou um breve "Olá" e continuou o seu caminho rapidamente, como se estivesse a fugir de algo.

Sem pensar duas vezes, decidi segui-lo, curiosa. Ainda que não o conhecesse bem, algo em dizia que aquele não era o tipo de atitude convencional dele. Contornei o corredor e, sem que ele me notasse, escondi-me. Talvez estivesse completamente fora de mim, mas o meu instinto dizia-me que algo não estava certo.

O Liam tirou o telemóvel do bolso e começou a falar em voz baixa. Parecia nervoso, como se estivesse a discutir algo. Os sons de fundo do hospital, não me permitiam perceber bem o que ele dizia, mas consegui ouvir nitidamente uma frase, que me deixou com uma pulga por trás da orelha.

- Não sei até que ponto conseguimos manter esta história.

História? Que história?

Antes que pudesse ouvir mais detalhes, o Liam notou a minha presença. Os seus olhos encontraram os meus, e uma expressão de pânico surgiu no rosto dele.

- Tenho de desligar. – informou - Falamos depois.

- Olá Anna, desculpa há bocado não te ter cumprimentado como deveria, estou sobrecarregado com tudo o que se passou...- os seus olhos pareciam sondar-me, como se estivesse à espera de algum tipo de reação da minha parte – É difícil vê-lo assim, somos melhores amigos desde sempre e ele foi sempre tão forte, mas ali deitado naquela cama, parece tão frágil...

Assenti compreensivamente, ainda a processar a troca de palavras que tinha ouvido momentos antes.

- Não precisas de te justificar, Liam. Estamos todos a lidar com isto da melhor forma. - respondi, tentando parecer calma, apesar da quantidade de perguntas que me saltavam na cabeça.

Ele esboçou um sorriso forçado, como se a conversa telefónica o tivesse deixado ainda mais perturbado.

- Espero que o Leonardo melhore em breve. - acrescentei, procurando mudar o rumo da conversa.

O Liam assentiu e agradeceu. Parecia aliviado por eu não fazer qualquer tipo de pergunta acerca do que ouvi no telefonema. Vi-o desaparecer no corredor, depois de se despedir com um 'Xau' quase inaudível e voltei para o quarto do Leonardo.

A minha mãe e o Michael estavam exatamente no mesmo sítio em que os vi, quando saí do quarto. Uma enfermeira estava a monitorizar de perto os sinais vitais do Leonardo, enquanto um médico falava com o Michael.

Os olhos do Leonardo começaram a abrir-se lentamente, como se estivesse a emergir de um sono profundo. A sala pareceu congelar por um momento, e todos pararam o que estavam a fazer.

- Leonardo? - a minha mãe sussurrou, mantendo a respiração suspensa.

Ele piscou os olhos várias vezes, como se estivesse a ajustar-se à luz e à realidade ao seu redor. - Onde estou? - a sua saiu fraca, mas clara.

Um suspiro coletivo encheu o quarto. Ele estava acordado.

- Estás no hospital, filho. Tiveste um acidente, mas agora estás em boas mãos. - explicou o Michael, emocionado.

Os olhos do Leonardo percorreram a sala, fixando-se em cada rosto familiar. Quando o seu olhar se cruzou com o meu, algo nos seus olhos denunciou uma emoção inexplicável. Eu senti um nó na garganta, sem entender o porquê de me sentir daquela forma.

- Anna... - murmurou ele, num sussurro quase inaudível.

A surpresa varreu-me. Ele estava a chamar por mim? 

TouchWhere stories live. Discover now