Romeu

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Não consegui fechar os olhos pensando em Julia Julieta. É ela, eu sei que é ela. Não fui pra casa, não quis ter de lhe dar com os sermões dos meus tios, então como o sol já saiu, vou até a igreja. Padre Lourenço irá me receber e tomarei café me paz.

Entro na igreja e vou até o jardim, ele ainda está lá, mexendo suas plantinhas fedorentas.

-Bom dia, Padre. –Digo.

- Bom dia, meu filho. Você aqui tão cedo? Posso saber o por que acordou tão cedo? Pelo que parece nem dormiu.

-Não, não dormi. –Digo sorrindo.

-Hum. Esse sorriso sapeca. Não me diga que estava com... oh, meu Deus. Rosa!

-O quê? Não, padre, não estive com Rosa. Na verdade, nem lembro mais quem é. –Digo feliz.

-Ah, que bom, meu filho. Mas por quem Rosa foi tão rapidamente desprezada? –Ele levanta a sobrancelha.

-Ah, o senhor não faz nem ideia. –Digo entusiasmado. –Uma mulher que me ama muito.

-Diga o nome!

-Julieta, claro. Apenas Julieta. Foi assim e assim será.

-De novo essa ideia? Ela existe apenas em seus sonhos! –Diz o padre. –Já lhe disse.

-Não, padre. O senhor não entendeu. Falo de Julieta, de verdade. Julia Julieta Capuleto. A doce senhorita que raptou meu coração e meu amor.

-Ah, meu Deus. –Ele tampa a boca. –A neta do Capuleto que acaba de chegar de viagem?

-Essa mesma! –Confirmo. –O senhor a conhece?

-Mas é claro. Não admira você ter se encantado, ela é uma ótima moça. Eu a conheço desde criança. Admiro vocês ainda não terem se encontrado em todos esses anos. Mas não entendo por que trocar uma pela outra? Rosa foi menosprezada assim, tão rapidamente? Não faço nem ideia de quantas lágrimas derramou por ela.

-Desprezada como ela fez comigo. Pensei que aprovasse, já que me censurava tanto por eu insistir em Rosa, que não me amava.

-Ah, ah! Eu o censurava por você chorar feito uma criança.

-Bom, enfim, padre, eu quero me casar. –Digo.

-Casar? Com uma Capuleto? Você? Um Montecchio? Isso é muito insano.

-Nos case ou viveremos como dois desavergonhados. –Digo.

-Chantagem, Romeu? Certo, certo, caso. Só com os dois, aqui, por vontade própria. Mas me diga, tinha de ser uma Capuleto?

-Não me importo com as brigas das famílias e tampouco com os nomes, apenas com esse sentimento puro e verdadeiro que é direcionado a Julieta. –Digo. –Nos casará?

-Sim, sim. Mas ela tem de vir aqui me dizer. Não acredito que duas coisas aconteçam duas vezes da mesma maneira, como no passado, você sabe bem.

-Ela virá, padre. Ela virá!

Ele assente.

-Eu a esperarei. Agora entre, vou lhe preparar um café.

O sigo e vejo que ele está em uma nova descoberta pela flor que está contida dentro de um frasco em sua mesinha.

-Nova descoberta? –Questiono.

-Ah, sim. Trouxeram ontem. Estou vendo as propriedades medicinais que ela tem a oferecer. Vamos, vamos tomar um café.

Tomo o café com o Padre e vou limpar o jardim. Ele permite que eu tire a camisa, pois o calor é insuportável!

-Já pensou no jardineiro? –Pergunto.

Ele continua olhando fixamente para a flor no vidro e começa a espeta-la e despedaça-la.

-Não, Romeu. Já tenho meu próprio jardineiro. –Diz ele, com os olhos fixos na flor.

-Ah é? E quem é que eu não conheço?

-É você! Termine de limpar o jardim, sim?

-Maravilha. –Resmungo. –Isso é exploração. Estou trabalhando sem salário.

-Não é exploração quando se faz para a casa do senhor.

-Esse é seu jardim.

-E fica no território da casa do senhor. Ah, me dê esse ciscador. E escute! –Ele pega o ciscador da minha mão. –Vá para casa, tome um banho e diga a sua tia, que deve estar arrancando os cabelos de preocupação, que dormiu na capela.

-O senhor mentindo? –Ergo uma sobrancelha

-Para me livrar de você! –Ele diz. –E dos seus choramingos. Senhor, perdoai este pecado. Agora vá. E tenha juízo. E lembre-se, eu só caso os noivos com ambas vontades.

-Pode deixar ela vai dizer o que eu lhe disse.

Assinto, mas não paro de pensar em Julieta. Nós iremos fugir, assim que casarmos e não cometeremos os mesmos erros que nossos antepassados.

Chego em casa e faço exatamente o que o padre disse. Minha tia liga para ele, pedindo confirmação e assim que ouve-a, me libera do interrogatório. Infelizmente, Marco não.

-Sei que você foi ver aquela garota. –Diz ele. –Foi por ela que saímos e você foi procura-la.

-O padre já disse: dormi na capela. –Digo.

-Desde que o mundo é mundo, conheço você. Mas tome cuidado.

-Obrigado pelo aviso, mas tenho que ir fazer uma visita.

-A garota?

-Não. À Romeu e Julieta.

Saio na moto rumo ao cemitério.

Os novos Romeu e JulietaWhere stories live. Discover now