Romeu

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O que ela disse faz todo o sentido! Se aconteceu com eles, por que não conosco?

É provável. É mais que provável. Muitas coisas estão acontecendo ultimamente. Não do mesmo jeito, mas está acontecendo, e receio que essa é uma das coisas que podem acontecer.

Decido ir, acalmando-a.

Ela casou mal tem dois dias, e já está tão preocupada. Melhor tentar dar conforto da melhor maneira que posso: distanciando-me.

Quando me deitei, depois do banho, meu pensamento projetou sua imagem na minha frente. Levei um susto ao vê-la. Ela parecia tão mais linda. Usava um vestido longo e antigo, da cor bege. E seu cabelo estava encaracolado, com as duas extremidades da frente presas em uma presilha atrás.

-Julieta? –Questionei, levantando-me para ter mais clareza.

-Sim. –Ela respondeu em um sussurro e caminhou até a minha cama, se apoiando com os joelhos, e indo em direção a mim, engatinhando e me derrubando.

-Como chegou aqui? –Perguntei.

-Seu coração, meu amor. –Ela pôs a mão sobre meu peito nu. –Bate junto com o meu.

Ela delicadamente pegou minha mão e a pressionou contra seu peito.

-Julieta, você se arriscou demais. –Digo.

-Shiu! –Ela pede. –Você já se arriscou demais. Estou aqui, agora, fazendo o mesmo.

Franzo o cenho, e ela me beija. Rapidamente minha expressão se suaviza. Ela abre as pernas em torno do meu quadril, provocando-me. Ela está tão mais selvagem, sei que isso não pode ser real.

-Julieta! –Consigo dizer. –Você, não é real!

Ela para e me olha.

-É só coisa da minha imaginação.

Fecho os olhos rapidamente e vejo que era mesmo tudo coisa da minha mente. Sei que será uma tortura ficar longe daquela a quem dei meu coração. Será uma tortura ficar longe de Julieta, mas é preciso!

Frustrado, viro para o lado, abraço um travesseiro, e me frustro mais ainda. Giro pro outro e taco o travesseiro na parede. Agarro outro e cubro a cara, para abafar um grito.

Deus, que tortura ficar longe daquela garota! Daquela mulher! Meu Deus, ela mexe com meu psicológico mesmo a distância!

Decido, depois do meu devaneio, dormir. E sonho, dessa vez não é Julieta, que vejo morta, sou eu! Me vejo, morto! Ela chora. Tento consola-la, mas é em vão. Ela está inconsolável. Pior: não consigo alcança-la.

Ela urra de dor. A dor que recobre seu peito. Aquele é, sim, meu pior castigo. Vê-la sofrendo e não poder fazer nada a respeito. Ela urra mais alto e eu abro os olhos, novamente desesperado.

Estou suado e arfando de susto. Vou até o banheiro, banho-me e consigo despertar para o trabalho.

Desenho, como tenho feito nos últimos dias que tenho sonhado com Julieta. Desenho a cena do meu sonho perfeitamente, e junto o desenho aos outros. Eles se dividem em dois: as cenas de romance e paz, e as cenas de desespero e morte.

Desço as escadas e me junto aos meus primos.

-Bom dia, família. –Digo.

-Bom dia. –Titio, diz. –Romeu, você poderia fazer um favor?

-Claro, tio. O que deseja.

-Vá até a prefeitura e peças o certificado de funcionamento. Já deve estar pronto a essa altura! –Titio diz.

-Claro, tio. Dê-me a autorização que eu vou imediatamente até lá. –Digo.

-Já entregarei. Termine o café e me acompanhe até o escritório.

Assinto.

Assim que termino o café, me dirijo até seu escritório.

-Tio? Estou aqui! –Digo.

-Entre. –Ele pede. –Está aí! –Ele aponta com a cabeça para o envelope lacrado.

Pego o envelope nas mãos e dou uma analisada no papel. Meu tio mantém os olhos na tela do seu computador, então decido sair.

-Romeu! –Ele diz, me fazendo parar. –Você tem um minuto?

Viro e assinto.

-Claro, tio. O que deseja? –Pergunto.

-Sente-se. Creio que devemos conversar! –Ele aponta para a cadeira.

Fico admirado com que ele tenha deixado o computador de lado para olhar para mim. Ultimamente meu tio não perde muito tempo com conversas. Desde que começamos com a construção da nova vinícola, meu tio se confinou ao escritório deixando-nos como seus mensageiros para o mundo lá fora, e era por isso que nós ficamos encarregados da maioria das coisas, óbvio, com ele supervisionando tudo.

-Pois não, tio? –Questiono.

Não estou nervoso, embora devesse estar, já que ele até deixou o computador de lado para nossa conversa.

-Acha que pode ser honesto comigo? –Ele pergunta.

-Claro. –Digo, sem hesitação.

-Então, diga-me: por quê anda estranho? –Ele pergunta.

Franzo o cenho, mas sol um riso abafado.

-Acha que estou estranho, tio? –Questiono.

-Você anda saindo bastante, quase não fica em casa. Sabe que isso nunca me incomodou, que você dormissem fora e tudo o mais.

-Não estou dormindo fora, tio! –Digo. –Ou durmo um pouco mais tarde, ou acordo um pouco mais cedo.

Ele respira fundo.

-Romeu, sabe que não tive filhos, e basicamente adotei vocês três quando eram crianças. Não reclamo, pois vocês três sempre foram motivos de orgulho, então nunca reclamei por não ter primogênitos. Eu me dediquei a vocês! Fiz de tudo para levar o nome da nossa família a um outro nível. Reinventei a vinícola. Tudo por vocês. Principalmente por você, Romeu! Você sempre foi o meio entre tudo. Nunca foi avulso demais ou acanhado demais. Era o limite entre os dois, e eu sempre planejei tudo isso pensando nos três, claro, mas principalmente em você!

-Não estou entendendo, tio. –Digo.

-Eu sei da Capuleto. –Ele diz.

Sinto a tensão devastar meu corpo.

-Capuleto? –Questiono, na intensão da confirmação.

-Rosa. –Ele diz.

Respiro aliviado

-O que sabe? –Questiono.

-Você gostava dela. –Ele diz. –Tudo bem se não quiser falar isso com alguém tão velho como eu, mas eu acho que você deve saber que esses amorezinhos de juventude não vingam. Principalmente por que, bom, eles são nossos rivais. Não quero dizer ou incentivar brigas e rixas, mas eles não são opções para nós. E Rosa, você pode se apaixonar, pode namorar, até ir dormir com ela, mas, perdoe ser tão realista, isso não irá tão adiante.

Levo dois segundos para obter uma reação.

Sorrio.

-Não se preocupe, tio. Não é Rosa. –Digo. É a prima dela!

-Que ótimo! –Ele diz. –Bom, continue seu trabalho. E apareça mais por aqui! –Ele pede.

Assinto.

Saio indo em direção a sala.

Ben me acompanha até a cidade. Temos de resolver nossos compromissos.

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Os novos Romeu e JulietaWhere stories live. Discover now