Romeu

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Já é tarde! Cinco da tarde e ainda estou com Ben, que me acompanha até a Igreja.

-Mas por que a essa hora? Aliás, por que temos de vir a igreja hoje? Nem é sábado ou domingo! –Ele diz.

-Deixe de ser importuno, por favor! –O censuro. –É um compromisso meu. Estou fazendo algo, e apenas a esse horário estou livre para prosseguir.

-Que coisa está fazendo? –Ele levanta uma de suas sobrancelhas.

Penso bem antes de lhe dar uma resposta. Algo que o faça entender meus motivos, claro.

-Diga-me, primo, sabe sobre a história de Romeu e Julieta, certo? –Questiono.

-Claro! Quem não sabe! –Ele responde.

-Essa história se interliga a nossa família e a dos Capuleto por muitos anos. Isso não pode se tratar de uma mera coincidência. –Digo.

-De fato. –Ele diz. –Mas onde quer chegar com isso?

-A maldição. –Digo.

Puxo o freio de mão e estaciono o carro em frente a tal casa paroquial. Retiro o sinto e noto que Ben está surpreso, mas ao mesmo tempo não está. Ele suspeita de algo, sei disso. Não é apenas ele que tem o dom de desvendar olhares. Somos parentes, sou tão parecido com ele que nota-se!

Saio do carro logo, e ele depois de mim. Caminho até a porta da igreja e entro no salão. Sei que o padre fechará as portas logo em breve, já que começa a escurecer, então me dou o trabalho de fechar as portas.

Caminho até o jardim do padre Lourenço. Ele está sentado em um banco, por culpa da fadiga, claro! Com o uso de uma lupa, ele analisa a flor que está em sua outra mão. Ben me segue atrás.

-Padre! –O chamo.

Ele gira em minha direção:

-Ah, já não era sem tempo! –Ele diz. –Vejo que trouxe seu primo. Será bom termos ajuda, já que passei boa parte do dia e não encontrei nada que fosse de interesse!

-Boa parte do dia onde? –Questiona Ben.

Me viro para Ben.

-Estou atrás de algo que diga mais sobre essa maldição. –Digo. –Sabemos que a história que Shakespeare relatou em sua peça teve partes omitidas, mas sabemos que alguma são sim verdades, como a morte deles. Isso implica comigo e Julieta, entende? Quero descobrir qual mal pode estar pairando nossas cabeças.

Ben assente.

-Espero poder ajudar então! –Ele responde.

Sorrio pela sua boa vontade.

-Chega de falatório, sim? Vamos ao que interessa! –Ele se levanta.

Acompanhamos o padre Lourenço até a sacristia. Ele levanta a porta do alçapão. Descemos as escadas e focamos no caminho com a lanterna dos nossos celulares. O padre ainda leva com ele seu candelabro, e quando chegamos no grande salão escuro agradeço por ele ter trago. Ele ilumina todo o salão quando coloca o fogo a extremidade.

Ben fica surpreso ao ver aquele lugar.

-O refúgio deles. –Ele diz baixinho, ainda surpreso por saber ou comparar a similaridade.

Na história que sabemos, Romeu e Julieta tiveram de pedir ajuda a igreja já que foi uma das poucas a favor da união. Eles os abrigaram, por um tempo, até Julieta ter de voltar para consolar sua família que estava com a preocupação ao extremo, e acalmar os nervos de Theobaldo. Depois disso, a vida de ambos foi um declínio, e a separação só foi interrompida com a morte, onde ambos ficaram unidos novamente. Sepultados juntos onde podem ficar assim até o fim dos tempos.

-O que o senhor encontrou? –Pergunto ao padre Lourenço.

-Nada que nos sirva. –Ele diz. –Os livros dessa seção, não são o que procuramos, então vamos seguir para a próxima, sim?

Eu e meu primo assentimos.

Nossa busca por um livro diferente que diga algo, nos dê uma pista acerca do assunto. O pior é que não sabemos o que procuramos! Sabemos que é algo, mas não sabemos que algo é esse!

Já passadas duas horas, pontuais, o padre interviu:

-Bom, acho que chega por hoje!

Ouvi meu primo emitir um som aliviado e não culpo. Até eu estava cansado de todas aquelas palavras! Então não protestei a ordem do padre.

Voltamos para a sacristia.

-Amanhã vocês irão retornar? –Padre Lourenço pergunta.

-Irei, claro. –Digo.

-Eu também! –Diz Ben.

Confesso que fiquei um pouco surpreso com sua resposta.

-Acho que isso é do meu interesse também, não? –Ele pergunta.

Sorrio e balanço a cabeça afirmativamente. De fato é, sim, do interesse dele, já que eu e Julieta não somos o único casal a estar apaixonados no momento.

Voltamos para casa.

*

Deve ser quase dez da noite, e a família inteira está dormindo, mas sei que, ao contrário de todos, Marco não fechou os olhos ainda.

Decido que já está mais do que na hora de conversarmos!

Sigo em direção ao seu quarto. A casa está quase toda escura, mas ainda vou devagar com medo de esbarrar em algo que esteja encobrido pela sombra da noite.

Bato de leve em sua porta e ele responde:

-Entre!

Giro a maçaneta e me ponho para dentro. Ele parece surpreso, mas volta seus olhos para a TV que foi colocada no quarto para distraí-lo, já que foi privado de suas atividades.

-É você? –Ele questiona.

Não está zangado comigo, o que é bom. Foi culpa minha ele estar assim!

Puxo uma cadeira e o encaro. Ele desliga a TV.

-Como você está? –Questiono.

-Me sentindo inválido! –Ele diz. –Já que o maldito Capuleto foi o culpado da minha invalidez. Titio me proibiu de sair para trabalhar só por causa desse gesso!

Sorrio e ele parece nem notar meu divertimento, mas respira fundo.

-E o que você quer, Don Romeu? –Ele questiona.

-Não tivemos a oportunidade de conversar direito desde aquele incidente. –Começo. –Mas não vim só saber como está, gostaria de saber o que pensa fazer depois disso.

-O que acha? Vou tratar de acabar com ele! –Marco esbraveja. –Não vou deixar barato, tenha ciência.

Inalo o ar profundamente e o solto fortemente.

-Não vê que isso pode dar mal pros dois lados? Tanto pro nosso quanto pro deles? Céus, Marco! Que ideia idiota! Não pode ir procurar vingança. Não esqueça que nós já recebemos um aviso, e por sorte não ocorreu algo pior. Então deixe esse assunto de lado, primo. –Digo.

-Nunca. –Ele devolve. –Não jogo por empate, jogo pra ganhar, e eu não lhe causei dano, mas ele me causou! Estou invalido por culpa dele!

-E eu o persegui resultando na invalidez dele! –Digo. –Por você, primo! Sabe que nossos confrontos, desde muitos anos sempre acabaram em mortes para ambos os lados! Por favor, não faça mais nada imprudente. Eu não desistirei até que me dê a certeza de que não pensa em persegui-lo atrás de vingança.

-Pois espere, sentado, Romeu! Eu não lhe darei esta confirmação.

Ele se vira.

-Agora, saia. Quero dormir.

Me levanto e saio frustrado. Que droga!

ficmr

Os novos Romeu e JulietaWhere stories live. Discover now