Seja Você Mesma

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Não pretendia me arrumar no apartamento de Richard, muito menos depois do episódio no quarto. No entanto como eu estava evitando falar com ele, fiquei em um canto decorando as regras de etiqueta até que batesse a hora de me aprontar.
Richard me entregou uma sacola com um vestido tubinho marsala e sapatos plataforma. Aah meu Deus... Um belo salto quinze... Que maravilha.
Fiz uma careta ao olhar para o par de sapatos verniz.
- Não podia ter escolhido uma sandália? - Falei deprimida, embora eu estivesse impressionada com seu conhecimento pela moda. Geralmente os homens não eram assim. Aaaah... espere, ele havia mencionado aquela atendente atrevida... Hm.
- Não me diga que não consegue andar com isso - Mordi o lábio inferior - Aaah Não...
Dei de ombros.
Ele coçou a cabeça insatisfeito.
- Vão me deixar com calos mais tarde mas posso tentar usá-los.
Seu olhar era pura desconfiança.
- Tem certeza que não vai acabar caindo em público?
Dei uma risada balançando a cabeça. Não garantiria nada.


Não tinha ficado tão ruim. O vestido servira em mim sem ficar super apertado. Já os sapatos...
Bom, eles também serviram mas o problema não era esse, o problema era andar cambaleando feito uma idiota. Como alguém consegue parar em cima de um troço daqueles?!
Fiz um coque bagunçado, passei batom cor de vinho e máscara de cílios que deu destaque ao cinza de meus olhos.
Richard, claro, estava maravilhoso com camisa social cinza e calça jeans. Tinha como aquele homem ser menos que magnífico? Aparentemente não.
- Está pronta?
Me examinei brevemente.
- O que me diz?
Deu de ombros após uma avaliação rápida.
- Acho que dá pro gasto - Fechei a cara, mostrando a língua como uma criança de cinco anos. Eu e minhas manias ridículas. - Tudo bem, está ótima!
Abri um sorriso de contentamento.
A lembrança da nossa conversa no quarto ainda invadia minha mente em cenas coloridas e de alta definição.
Não conseguia nem se quer olhar para Richard sem instantaneamente me transformar em um pimentão e acredito que ele tenha percebido meu constrangimento pois tentava ao máximo não me encarar, porém pressentia que isso não fosse apenas para evitar o fogo em minha pele e sim para evitar o seu constrangimento também), de qualquer forma, estava melhor assim, por mais estranhas que as coisas estivessem...
Suas palavras mais cedo me deixaram com a cabeça a mil. Luz na escuridão... A expressão se repetia muitas vezes em meu cérebro. Minha nossa, eu estava ficando maluca!


Richard havia reservado uma mesa em algum restaurante caro que ficava em um bairro de nome estranho do qual nunca ouvira falar.
- Quer me dar uma sugestão do que comer? - Perguntei insegura enquanto Richard manobrava o carro no estacionamento.
- Hmm... Escargot?
Fiz careta.
- Nem pensar.
Ele riu. Pelo jeito seu humor havia melhorado bastante. Não vi isso como um consolo.

Nossa mesa ficava de frente para um palco pequeno onde três violinistas mostravam todo o seu talento. Música clássica não era meu forte.
- Como você suporta isso? - Cochichei para Richard assim que nos sentamos, um do lado do outro na mesa de quatro pessoas. Os convidados da noite ainda não tinham dado as caras.
- A música? - Franziu o nariz - As vezes dá vontade de fazer esses caras engolirem aquele troço - Creio eu que o tal troço era uma referência pouco gentil ao violino.
Soltei uma risada. Por um momento pude ver o garoto que morava em uma casa humilde com os pais e mais duas irmãs. Talvez ainda restasse um pedacinho dele em meio ao homem sério que agora estava em um dos restaurantes mais caros da cidade e pagava um mensal altíssimo para residir naquele apartamento enorme.
Um garçom educado veio nos atender, Richard pediu apenas um copo de água, alegando que esperava por mais gente. Me contentei em balançar a cabeça deixando bem claro que não queria nada.
Naquele momento senti a mão de Richard apertar meu braço, como se fosse um sinal de aviso, levantei a cabeça a tempo de ver a mulher de vestido verde empinar o nariz e atravessar o restaurante toda pomposa, o companheiro a seguia em passos lentos. Seu paletó feito a medida lhe caia como uma luva.
Não parecia muito velho, o rosto era longo, os cabelos pretos tão moldurados que parecia ter gasto um vidro de gel inteirinho, já a mulher ... Seria um eufemismo dizer que era bonita. Com aqueles cachos dourados que batiam nas costas, batom vermelho e uns 1,80 de altura ela era incrivelmente linda, para dizer o mínimo.
Richard se levantou e senti que precisava fazer o mesmo. A mulher,que pelo que me lembrava, atendia por Megan, mediu-me com os olhos, de cima a baixo. Will parecia ser menos esnobe.
- Meu velho amigo - Exclamou, apertando a mão de Richard. Seus olhos pretos como carvão caíram sob mim - Oh! Essa deve ser a namorada de quem tanto fala, e posso lhe dizer meu amigo, você não exagerou nos elogios.
Senti uma vontade imensa de rir. Então ele chegara ao ponto de inventar detalhes sobre a namorada invisível? Para minha surpresa Richard teve a cortesia de corar. Se eu continuasse a olhar para seu rosto iria cair na risada e acabar com tudo antes mesmo de começar.
Will apertou minha mão.
- É um prazer conhecê - lo - Sorri - Richard fala muito do senhor.
Ele riu. Visivelmente era um homem bem animado. Como podia ser amigo de alguém como Richard?
- Espero que fale apenas coisas boas, porque conhecendo meu amigo... - Estalou a língua - Ele nem sempre é muito gentil com as palavras.
- Eu que o diga... - Murmurei.
Meu "Namorado" arregalou os olhos para mim e a sra. Hoffer franziu a testa.
Ei, qual o problema?
- Perdão? - Will perguntou confuso. Não tinha ouvido.
- Ãh, estava dizendo que Richard foi bem... Gentil à seu respeito.
Me lançou um sorriso e se sentou na cadeira em frente à de Richard.
Megan abriu o mais forçado dos sorriso ao me cumprimentar.
- Grande prazer - Falei amistosamente.
- Todo meu - Não acreditei que fosse bem assim.
O garçom voltou a nossa mesa. Fizemos o pedido de alguma coisa que continha frutos do mar. Não devia ser tão ruim assim, certo?

Inverno Em Saturno Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon