VIII- O gênio e a síndrome

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Agosto passou muito rápido, e já estamos em setembro. Agora são 91 dias. Se não fosse por Thierry, eu não saberia que hoje é dia 1 de Setembro. Sim, não tenho estado muito bem, e nessas duas últimas semanas quem ficou doente foi eu. Natasha desmaiou no refeitório uma semana atrás, e está no quarto até hoje. Dessa vez, eu sinto que ela piorou muito, o que me preocupa. O que será que ela tem? Perguntei a uma enfermeira se são os sintomas da AIDs que estão a deixando assim, mas ela disse que talvez não fosse. Ela fica muito cansada, com o corpo cansado. O corpo dela não é forte como o meu. Maggie me disse que Natasha emagreceu muito de uns tempos para cá, e que um mês antes de eu vir morar aqui, mais ou menos, ela já apresentava esses surtos de "gripe". Eu acho que isso é muito estranho para uma gripe. 

Uma das enfermeiras deixou, sem querer, uma fresta da porta do quarto de Natasha aberta. Eu obviamente dei uma olhada, quando estava passando por lá. Colocaram cortinas pretas no quarto, e trocaram a lâmpada por uma luz bem fraca. Natasha vomitava o tempo todo. Logo pensei: "Será que está grávida?", mas grávidas não podem ficar em ambientes escuros e fechados por muito tempo. Ela não estava grávida. Uma das enfermeiras que cuida dela saiu e me pegou espiando.

"-Hey, o que está fazendo aí?"

"-Só queria ver como a minha amiga está. Por que vocês colocaram cortinas pretas no quarto dela?"

"-Sua amiga está muito sensível a luz. Fica tonta como um morcego. Lamento informar, mas vai ter que se mantêr longe por um bom tempo."

Eu deixei uma lágrima escorrer do olho, e a enfermeira percebeu. Perguntei:

"-Desta vez ela está pior?"

Ela fez que sim com a cabeça, um pouco desapontada com a resposta que me deu. Mas ela sabia que eu precisava saber a verdade. Eu amo muito Natasha, e não quero que ela morra. Eu sei que ela vai sair dessa, se Deus quiser ela vai! Agora sou eu que estou doente, mas o que eu tenho é gripe mesmo. Fiquei resfriada pois o tempo mudou rapidamente, e ficou seco e frio. Raramente aqui no Rio faz frio, mas fazem uns 3 dias que uma frente fria assolou a cidade. Eu tenho rinite, e isso piora minha situação. As enfermeiras me trazem chá quente e remédios, enquanto Thierry vêm me visitar um pouco a tarde com Adrian. Uma enfermeira fica de olho na gente nessa hora. Estou aqui a uns 4 dias, e já estou melhorando. Estava com uma dor de cabeça muito forte, dor no corpo e na garganta. A 5 dias atrás eu consegui o que queria: falar com Joseph. Eu só posso ser maluca! Eu tenho - ou tinha- medo de Joseph. Ele arrancou meu cabelo aquela vez, lembra? Demorei a escrever aqui pois estava meio que sendo "vigiada" 24 horas do meu dia, por estar doente, e não quis que nenhuma enfermeira pegasse o meu diário. Eu sabia que se achassem meu diário, iriam levar até a psiquiatra e eu ficaria sem ele, o que demoraria meu processo para sair daqui o mais rápido possível. As coisas aqui são assim, e qualquer coisinha que eles descubram sobre nós será usado contra nós. 

Eu encontrei Joseph rondando o "bando" de novo, e infelizmente Natasha não estava lá para me proteger. Maggie se irritou com ele e mandou-o xispar, como se ele fosse um cachorro. No horário da tarde daquele dia, eu resolvi ir atrás dele, disfarçadamente, e com muito medo. Eu o vi apreciando algumas flores no jardim, e então recuei. Eu entro em desespero quando o vejo. Ele não tem uma aparência de dar medo, mas sua última atitude é o que me dá medo. Esperei alguns minutos, e ganhei coragem de novo. Eles estava parado, olhando para o chão. Eu falei em tom alto:

"- Meu nome é Ana Laura."

"-Eu já sabia. Uma vez nos apresentamos, e isso foi antes de você se afastar de mim."

Ele foi ignorante comigo. Mas eu assustei ao ver o quão lúcido ele era. Sim, Joseph não me parecia totalmente maluco. Fiquei um tempo calada, parada perto dele. Ele ficou remexendo nas flores amarelas que saíam de uma planta alta no jardim. Ao perceber que ainda estava ali, ele se irritou.

380 dias- Diário de um hospícioOnde histórias criam vida. Descubra agora