Capítulo 15

13 1 0
                                    

Feliz aniversário

O café da manhã naquele dia foi o mais silencioso que Bianca já presenciou naquele orfanato, ninguém olhava para ninguém, todos estavam de cabeça baixa encarando a mesa da cozinha, com exceção da diretora Irina, que comia um misto quente com um pequeno sorriso nos lábios e com a expressão plena, como se uma pessoa não tivesse se suicidado no dia anterior.
"–Estamos em um orfanato Srta. Madson, não é anormal desistir de tudo". –Essas foram as palavras da diretora, Bia não acreditava de maneira nenhuma naquilo, ela declarou que estava satisfeita e subiu para seu quarto. Assim que abriu a porta deu de encontro com Roberta e Ângela se separando, as duas estavam sentadas na cama de Roberta.
–Mas que inferno! Você não sabe bater não? –Elas foram para lados diferentes da cama, Ângela fechou a cara.
–Esse é o meu quarto Ângela, e aliás, vocês não têm que se intimidarem comigo, não cresci em uma caverna. –Bianca, apesar de gostar de meninos, já tinha beijado Peny, em jogos de verdade ou desafio, isso não mudava sua sexualidade, é claro, mas ela não via anormalidade em duas meninas se beijando.
Ângela a olhou fixamente. Bia percebeu que aquele tipo de aceitação não era muito comum para ela. –Bom, mudando de assunto, eu não consigo ficar lá embaixo com todo aquele silêncio, então sinto muito, mas não vou dar privacidade a vocês.
–Tudo bem, eu estava querendo falar com você de qualquer forma. –Bia franziu o cenho.
–Sobre o que?
–Hoje é o aniversário de Alice, ela não gosta de comemorar, mas pedi a diretora Irina, e ela me permitiu fazer um bolo para ela, preciso que você a distraia quando voltarem da aula, até que eu deixe tudo pronto no quarto dela.
–Não sei se consigo.
–Vai ter que conseguir, agora tenho que ir, devo me apressar para algumas coisas. –Ângela deu um selinho rápido em Roberta e saiu do quarto. A garota, antes sombria e misteriosa, corou as bochechas. Bianca ergueu uma sobrancelha olhando para ela.
–Não se atreva a dizer uma palavra. –Bia virou para o outro lado e esperou a hora em que sairia para a escola, com um sorriso nos lábios.

***

As aulas já estavam acabando, eram os últimos minutos, Bia vigiava Alice do fundo da sala. Quando finalmente chegou a hora de ir para casa, ela tentou a acompanhar, seguindo em sua direção em meio a multidão de pessoas, mas acabou a perdendo de vista, começou a se preocupar e então saiu empurrando as pessoas para alcançá-la. Chegou até a rua de saída e não conseguiu vê—la em lugar algum, como pôde perdê-la assim?
Ela entrou na escola novamente, já não havia mais ninguém por lá, os alunos sumiam rapidamente do lugar assim que chega o momento de ir embora. Bianca procurou em cada sala até chegar o refeitório, onde viu a garota sentada em uma cadeira com a mochila sobre a mesa.
–Alice? O que está fazendo aqui? –Ela perguntou se aproximando.
–Apenas esperando Ângela terminar de preparar as coisas. –Bia ficou atônita.
–Você já sabia? –Ela perguntou o óbvio, procurando por uma explicação.
–Sim, ela sempre tenta fazer alguma coisa para me animar, costuma não dar certo. –Bia viu um chaveiro na mochila de Alice que nunca tinha visto antes, ele tinha o formato de um par de asas de borboletas coloridas.
–Foi um presente de Jéssica. –Ela revelou, notando que Bia encarava o objeto. –Ela sabe que gosto de fadas. –Bia assentiu com a cabeça.
–Eu conversei com Miguel ontem a noite. –Alice a olhou de súbito. –Foi muito rápido. –Bia acrescentou, para que ela não pensasse que não a chamou de propósito. –Ele me salvou de alguma coisa que tentou me matar, mas eu não pude ver o que era, logo depois ele foi embora, mas não antes de dizer que havia uma coisa sinistra rondando o orfanato, algo que ele nunca tinha visto antes, nem mesmo no mundo dele, de fantasmas.
–Ele não perguntou por mim? –Alice quis saber.
–Ele disse que quando tivesse forças falaria com você, disse também que vai estar sempre nos vigiando, para nos alertar se um perigo surgir. –Alice já chorava com um pequeno sorriso nos lábios. –Nós podemos não conseguir vê-lo, mas ele pode estar conosco nesse momento. –Alice concordou com a cabeça.
–Hoje faz três anos. –Bia a encarou franzindo o cenho. –Que meus pais morreram. –Ela continuou. –Foi exatamente no meu aniversário. –A garota de pé sentou ao lado da amiga, se preparando para a história provavelmente triste que estava para ouvir. –Tínhamos acabado de comemorar, depois da festa eles foram fazer uma reserva em um restaurante, não estavam atendendo o celular, então tiveram que ir até lá, e, no caminho, uma pessoa bêbada os atingiu em cheio, os três morreram na hora. –Algo chamou a atenção de Bia.
–Como sabiam que o motorista estava bêbado? –Ela ergueu uma sobrancelha.
–Por que tinham garrafas de Vodka no porta—malas do carro dele. –Aquilo deixou Bia apavorada.
–Alice, foi exatamente assim que minha mãe morreu. O mesmo acidente de carro, a mesma justificativa do homem bêbado, a vodka no porta—malas, tudo igual. –Alice a olhou veementemente.
–Acha que tem alguma relação?
–Você acha que não? –Bia a perguntou sincera.
–Com certeza tem, pode ter sido armado, para cada um de nós, que estamos aqui e que estão no abrigo. Nós temos que descobrir o que está acontecendo aqui, e temos que conseguir sair daqui, sem abandonar ninguém, nós temos que salvar todos eles Bia.
–Sim, nós temos, e nós vamos, mas hoje não, hoje é seu aniversário, e nós temos que ir para aquele lugar de novo e você vai fingir uma surpresa enorme quando chegar lá, por que se não eles vão pensar que eu não consegui e aí a Ângela me mata, agora vamos. –Bia pegou a mão de Alice e as duas saíram da escola.

O Orfanato da TormentaWhere stories live. Discover now