10. Capitão

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Quando chego em casa, são sete e meia da manhã, estou toda suada, tentando recuperar o fôlego que eu perdi enquanto corria. É isso que acontece se ficar duas horas forçando as pernas a correrem por todos os cantos de Millstown.

– Jackie – ouço a voz da minha vó vindo da cozinha – vai querer quantos ovos, querida?

– Dois estão ótimos, vó – apareço na batente da porta, vendo os gatos enfileirados num canto da parede comendo a ração avidamente.

– Dois ovos e a vitamina verde saindo! – minha avó avisa e Augusta surge ao seu lado, sentada e encarando-a, esperando que ela desse os meus ovos a ela por ser uma cadela obediente que precisava comer mais – falando nisso, marquei um médico para você – ela avisa e eu fico boquiaberta – quero que faça os exames, ver se está tudo bem com você antes de sair competindo. Essa temporada de competições me deixa toda preocupada, você sabe.

– Não tinha que ser eu responsável em levar você para o médico, senhora Gwendoline? Acho que estamos invertendo os papéis aqui.

No momento que fala o nome inteiro da minha avó, ela para de mexer nos ovos. Lentamente, ela se vira e por alguns segundos eu fico com medo dela me arremessar a frigideira com os ovos na minha cara.

– Repete, Jackieline, repete. – ela ameaçou voltando a mexer nos ovos.

Não consigo segurar por muito tempo, estou rindo enquanto vejo minha vó me chamar de Jackieline e sobre as minhas malcriações.

– Eu sou de idade, mas consigo ir muito bem sozinha para as minhas consultas, Jackieline. – ela me encara com desprezo – Sem mim, você mal se importaria em checar como você está, estaria apodrecendo aos poucos.

Todo ano, quando chega perto das competições anuais de natação, minha avó sempre me obriga a ir aos médicos, conferir se estou apta a competir, se a alimentação está sendo seguida corretamente e se tudo está em ordem. Uma semana inteira de exames de sangue, de urina, de fezes, correr em uma esteira para ver se o meu coração funcionava bem (mesmo sendo jovem), fazer radiografia para conferir toda a minha estrutura óssea e assim por diante, uma temporada de exames que custa uma grana, mas que ela insiste em fazer e financiar.

Ela começou a me levar a fazer esses milhões de exames logo após a morte do meu avô.

Minha avó amava meu avô de uma forma bastante intensa e inspiradora, era invejável, o que eles tinham era precioso, bem próximo dos romances que eu via em filmes. O luto dela durou até mais tempo que o meu. Por causa desse amor, dessa perda, ela quer fazer tudo ao seu alcance para não ter que ir em outro funeral de outra pessoa que ama. Essas consultas, são desculpas para cuidar de mim, para não perder mais ninguém por um golpe de azar do destino. 

– Vou tomar um banho, senhora Gwendoline, em dois minutos eu desço. – aviso a ela.

– Me chama de Gwendoline de novo que eu enveneno a sua vitamina, Jackieline! – minha vó grita enquanto subo as escadas rindo.

Talvez eu seja um pouco maldosa com a minha vó, mas ela fica incrivelmente fofa quando está brava, meu avô falava o mesmo e é impossível não concordar com ele.

Quando chego ao meu quarto, já coloco meu trabalho dentro da mochila para não me atrasar mais do que já estava. Estava recolhendo toda a papelada, quando meu coração para de repente quando vejo uma chamada de vídeo dos meus pais em meu notebook.

Imediatamente, arrasto a cadeira para perto e me sento agitada. Arrumo meu cabelo rapidamente e sem mais um segundo a mais, eu abro a janela.

O vídeo demora um pouco para se estabilizar, mas aos poucos, consigo ver o sorriso da minha mãe e meu pai logo atrás arrumando a sua bagunça. Provavelmente a bagunça dela. Minha mãe tem a pele clara como a minha, os olhos são escuros e o cabelo castanho claro estava amarrado em um coque frouxo. Meu pai é um pouco mais bronzeado, tinha grandes olhos verdes e sempre arrumando os óculos em frente ao rosto.

Teoria da Sincronicidade [CONCLUÍDO/REESCREVENDO]Where stories live. Discover now