Capítulo XVI - Um interlúdio antes da desgraça

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"Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas.

Se você se conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota.

Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas."

Sun Tzu

Dois anos, sete meses e 7 dias atrás

Akira o ajudou a remover as ataduras com cuidado, suas mãos trêmulas demais para conseguir fazer o movimento. Conseguia sentir sua pele errada no rosto, um repuxar quando movia a boca, a pele sensível no ar frio do quarto.

As mãos dela eram gentis, o rosto não mostrando nada do que ela via, mas Izuku sabia que devia ser uma visão desconfortável. Só havia tanto que se podia fazer com um ferimento daquela magnitude.

Quando as bandagens saíram levou a mão ao rosto e sentiu a pele em alto relevo onde tocava. Ele lembrava com claridade da sensação de pele, músculos e osso se desintegrando, mas agora podia sentir seu zigoma intacto. Sentiu o pulso da sua carótida e fechou os olhos tentando tirar da sua cabeça os olhos de Shigakari naquele momento.

Abriu os olhos quando Takashi sentou ao seu lado na cama e lhe deu um espelho de forma silenciosa.

—Takashi... – Akira tentou refutar a ação, mas Izuku já tinha erguido o objeto, ele não podia mais adiar isso. Havia coisas piores do que uma cicatriz que deformava seu rosto como essa. Ele conseguia ver os dedos de Shigakari claramente, como uma marca pessoal dele em sua pele. Como uma lembrança de que ele não conseguia salvar todo mundo.

Era só mais um lembrete, porque Izuku os via já com frequência, e ele continuaria a os ver nos meses que se seguiriam. Em sonhos em boa parte, mas também ainda acordado. Pelo canto dos olhos ele via Miyagi, com sangue escorrendo pelos olhos, implorando por ajuda, ou Saa caída em uma poça de vômito perto da geladeira quando ia beber água. Na primeira noite que acordou teve a certeza de ver Tsubasa voando pelo quarto, o corpo deformado e monstruoso como o vira da última vez do lado da cela deles.

Ele sabia que eles não estavam lá de verdade, mas as imagens o perseguiam e provavelmente o perseguiriam pelo resto da vida. Mais ainda do que a sensação de Shigakari corroendo seu rosto, se engasgar em seu próprio sangue tendo a certeza que morreria sozinho como todos os outros.

Izuku tinha prometido que ia salvar os outros, mas viu todos morrerem sem poder fazer nada.

Izuku tinha acreditado que salvaria Shigakari, e pagou um preço alto por isso.

— Você ia morrer, Izuku. – O tio tocou o seu rosto, desviando seu foco do espelho. Os olhos dele estavam duros e firmes. Pelo canto do olho ele viu Akira tentar interferir, mas sem saber como. – Você foi estúpido e isso quase custou sua vida e a minha também, se Akira tivesse transferido todo o dano para mim como pedi eu estaria morto, e minha morte estaria nas suas costas.

Izuku fechou os olhos e tentou desviar o rosto, mas ele não deixou.

— Olhe para mim. Akira salvou sua vida, e dividindo o dano entre nós dois ela nunca vai conseguir andar direito e vai sentir dor o resto da vida. Um erro seu custou a nós três. – Izuku soluçou e viu a expressão do outro suavizar, o aperto em seu rosto diminuir. O homem o puxou para perto em um abraço reconfortante, em contraste com as palavras duras de segundos atrás. – Quase me custou você. O que eu ia falar para Inko se eu perdesse você?

—Desculpe...

—Não foi sua culpa. – Ergueu os olhos do ombro do outro e viu Akira o fitar seriamente pela visão borrada. – Minha perna. Foi escolha minha. Eu admito que nunca tinha pensando em usar a quirk dessa forma, podia ter me saído melhor, mas fico feliz que esteja vivo.

A teoria do caosWhere stories live. Discover now