Te falta amor, te sobra pau. Morra entalado com ele.

1.8K 165 156
                                    

A característica que representa a personalidade do Tipo A é ter metas e estratégias para alcançá-las. Com certeza, sou do Tipo A. Planejar é minha religião, e a lista das obrigações diárias é minha bíblia. Mas, ao chegar até o meio do corredor do prédio que tem sido meu lar nos últimos dois anos, congelo. Porque pela primeira vez em minha vida, não tenho ideia do que fazer. Estou sem direção alguma. E é aterrorizante. Parece sem peso, como um astronauta sendo cortado de sua âncora, deixando ser levado no espaço. Desolado. Condenado. Minha vida girava em torno de Katsuki. E nunca pensei que precisaria de um plano B.

Primeiro, minhas mãos começam a tremer, depois os braços e joelhos. A batida do meu coração se eleva rapidamente e tenho quase certeza de que estou hiperventilando. É adrenalina. A resposta de luta ou fuga é um fenômeno extraordinário. Cada membro do meu corpo grita para eu me mexer. Para ir. Meu corpo não se importa para onde, para qualquer lugar longe daqui. Corra, corra o quanto conseguir, você não pode me pegar, sou o Flash. Mas o flash tinha sorte, se ele erra-se a mulher maravilha poderia claramente descer e socar o mundo ao meio por ele. E agora me sinto sozinho, sem ninguém.

— Senhor Midoriya?

Não o escuto logo de primeira. O som do meu próprio pânico é muito ensurdecedor, como de mil homens dentro de uma casa fechada gritando por um gol feito pelo seu time favorito. Em seguida, ele toca meu braço, me pondo de volta ao chão, trazendo-me realidade.

— Senhor... Midoriya?

O cavalheiro de cabelo arrumadinho, com olhos cheios de preocupação e um elegante boné esportivo preto? Esse é Tenya Iida, nosso porteiro. Ele é um bom rapaz,  também se casou a pouco tempo.

— Posso te ajudar com alguma coisa?

Se ele pode me ajudar com alguma coisa? Um soco de direita seria muito útil neste exato momento. Nada extravagante, apenas um bocado de gelo no dia seguinte.

— Está tudo bem?

Sabe aquele ditado: "É melhor ter amado e perdido do que nunca te amado"? É asneira. Quem disse isso, não entendia porra nenhuma sobre amor. É melhor ser ignorante, é indolor. Mas conhecer a perfeição, tocá-la, prová-la, respirá-la diariamente e depois tirarem isso de você? A perda é agonizante. E cada centímetro da minha pele dói por causa disso.

— Preciso... tenho que ir...

Sim, aquela foi minha voz. Uma versão atordoada e confusa, como um pessoa ferida em algum grave acidente de carro, que fica dizendo para qualquer um que queira escutar que o farol estava verde. Não era para terminar desse jeito. Não era nem mesmo para terminar. Ele escreveu nas nuvens para mim, lembra? Para sempre.

Tenya olha para a mala no meu ombro.

— Você tá indo para o aeroporto? Está atrasado para algum voo?

Suas palavras ecoam no saco sem fundo que está minha mente agora. eroporto... aeroporto... aeroporto... voo... voo... voo. Quando os pacientes de Alzheimer começam a perder suas memórias, são as mais recentes que somem primeiro. As mais antigas, como o endereço da casa em que eles cresceram ou o nome da professora do segundo ano, ficam porque estão fixas. Elas fazem tão parte deles que a informação é quase instintiva, igual saber como engolir. Meus instintos me dominam agora. E começo a planejar.

— Sim... sim, preciso ir até o aeroporto.

Sabe algo sobre lobos? Eles são animais que andam em matilhas. E famílias. Exceto quando estão machucados. Caso isso aconteça, o lobo machucado sai à noite sozinho, para não atrair predadores. E volta para a última caverna que o grupo ocupou. Pois lhe é familiar. Segura. Fica por lá para se recuperar. Ou morrer.

Obsessed Where stories live. Discover now