Capítulo 05

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- Patrícia? Você ainda está na cama? Já passou das sete horas! O que há com você?

Acordei com minha mãe gritando no meu quarto. Isso não fazia parte do costume dela, mas como era a segunda vez seguida que eu me atrasava, já dava para imaginar que ela iria ficar irritada.

Levantei bem rápido da cama e corri para o banheiro. Enquanto tomava um banho sem as minhas enrolações diárias, tive tempo para pensar na pergunta dela: o que há com você?

É verdade, o que há comigo? Onde foi parar aquela menina que dormia e acordava no horário certo? Que cumpria perfeitamente a rotina?

Eu precisava de uma resposta para isso tudo, pois, com certeza, essas coisas seriam questionamentos para uma reunião de família que minha mãe insistiria em ter.

Em casa sempre foi assim, se tem algum problema, algo fora do comum: reunião de família! Qualquer membro da família poderia convocá-la, e quem o fazia, deveria redigir.

Quando entrei no quarto, apressada para me vestir, mamãe estava o olhando em todos os lugares. Claro que ela já percebera a falta de objetos que o João Lucas me deu. Além disso, eu havia feito um mural enorme com várias fotografias nossas, e agora a parede onde ele estava é apenas um vazio.

Ela olhou para mim, como se estivesse pensando qual o melhor jeito de abordar o assunto. Quando abriu a boca para falar, ouvi o Gustavo gritar no andar de baixo "vamos, Patrícia!".

Peguei minha mochila, e antes de sair do quarto, dei um beijo em sua bochecha e sussurrei "reunião de família" em seu ouvido.

Não sei o porquê, mas a Dona Leide, porteira da escola, nos deixou entrar atrasados hoje. Talvez ela soubesse do fim do meu namoro e estivesse sentido pena. Sua feição transmitia isso. Ela sempre sabia das fofoquinhas que rondavam o colégio.

Entrei na sala de aula e todos haviam formado duplas. Eu tive que sentar com o Murilo, o garoto mais preguiçoso da sala. Ele estudava com a gente desde a sétima série, e ninguém nunca entendia como ele passava de ano.

Fiz, rapidamente, a atividade para nós dois, e pedi licença para ir ao banheiro. Eu tinha saído de casa apressada, penteei os cabelos no carro, e estava com o rosto limpo, sem maquiagem alguma. Meu medo era que as pessoas me vissem com aquele rosto cheio de olheiras e pensassem que eu estava sofrendo por causa do João Lucas.

Entrei no toalete da escola e comecei a fazer uma maquiagem simples, tentando esconder as imperfeições enormes abaixo dos olhos. Eu havia passado a madrugada afogando mágoas no Twitter e só dormi pela manhã.

Enquanto lutava para deixar meu rosto, no mínimo, apresentável, alguém entrou no local. Vi uma garota olhar para mim através do espelho. Ela era loira, com olhos azuis e corpo perfeito. Senti a raiva queimar meu rosto. Era a Aline. Será que ela sabia que era eu a ex-namorada coitadinha do João?

- Olá! - Fiquei um pouco assustada quando ela me cumprimentou com uma voz feliz.

- Oi - até que soou simpática a minha resposta.

- Tentando esconder as olheiras? Sei como é isso... Será que posso te ajudar?

Eu não sei por quais motivos, mas aceitei a ajuda. Enquanto ela passava alguns itens em meu rosto, comecei a pensar que poderia ser tudo um truque para sacanear comigo. Era a razão mais óbvia. Já ia a mandar parar quando ela disse:

- Eu fico lendo até tarde e sempre acordo cheia de olheiras também.

- Você gosta de ler? - Perguntei surpresa.

- Eu amo!

- Que gêneros de livros?

- Nada especifico. Leio de tudo... Mas adoro mesmo a Emily Giffin e o John Green.

-Sério? Eu também os adoro. Tenho todos os livros deles! - Falei, animada demais. Sempre ajo assim quando encontro pessoas com o gosto literário igual ao meu.

-Uau! - Ela respondeu maravilhada. - Pra mim falta "Quem é você, Alasca?" do John, e "Presentes da vida" da Emily.

- Ah, "Quem é você, Alasca?" é o melhor do John Green. Você tem que ler! E "Presentes da vida" é lindo também. Se quiser eu te empresto!

De repente eu tinha esquecido que ela era a Aline, que roubou meu namorado, e só conseguia vê-la como a menina que gosta de ler, e que conheci no banheiro.

- Sério? Eu tomo muito cuidado com todos os livros. Adorei conhecer alguém parecida comigo... Aliás, eu sou nova por aqui, meu nome é Aline. Qual o seu?

Ela não sabia mesmo quem eu era. Meu lado ruim e vingativo quis dizer "sou a menina cujo namorado foi roubado por você". Mas ela era legal demais para ser tratada assim. Também pensei em inventar um nome falso, só que não daria certo. Optei pela verdade.

- Eu sou Patrícia Menezes, prazer.

- Ah, Patrícia... - A voz dela vacilou um pouco. Então ela conhecia meu nome.

Decidi fingir que não sabia nada sobre ela e o João Lucas.

- Isso... Deve ter ouvido falar. Logo no primeiro dia de aula meu namorado terminou comigo e a notícia se espalhou. Até a porteira da escola sabe! - Eu dei uma risada forçada e depois fiz uma feição triste. De propósito, claro. Ela deveria se sentir um pouco culpada.

- É, acho que não ouvi não... Tenho que ir. Foi bom te conhecer. A gente se vê por aí.

Ela foi embora apressada, esquecendo comigo uma pequena bolsa cheia de maquiagem.

Não comentei com minhas amigas sobre a Aline e nossa conversa no banheiro. Ainda estava um clima bem ruim entre nós, porque eu realmente fiquei chateada com a insinuação da Amanda. Decidi esperar pelas desculpas dela, coisa que eu acho difícil.

Quando cheguei em casa, muito cansada, continuei as mudanças pelo meu quarto. Queria uma nova decoração. Então liguei para a Isadora e fomos juntas fazer compras. Passamos a tarde mudando móveis de lugar e customizando algumas coisas. Foi divertido e eu senti muita vontade de contar sobre o Facebook e a Aline. Mas depois achei melhor esperar mais um tempo.

Após o jantar tivemos a reunião de família. Minha mãe redigiu, elaborando uma rotina nova para mim e para o Gustavo. Eu contei, muito séria, que o meu namoro tinha acabado. A reação dos meus pais foi me mimar muito, mesmo eu explicando que foi melhor assim, e que eu ainda ia encontrar meu príncipe encantando. Eu estava mesmo disposta a esquecer o João.

Antes de dormir, entrei no Twitter. Era difícil eu ter notificações novas por lá, e quando vi uma reply* fiquei surpresa. Como eu havia passado a madrugada twittando coisas como:

@patriciamnzs:

"Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar, que tudo era pra sempre... Sem saber, que o pra sempre, sempre acaba..."

Recebi uma resposta de um perfil desconhecido.

@rafa_the_dark:

Meninas que vem para o Twitter lamentar-se é tão entediante, @patriciamnzs. Não estamos interessados pelas tuas mágoas. (:

Fiquei apenas segurando o celular e olhando a resposta. Quem esse garoto pensa que é?

Eu sabia que tinha que dormir, senão ia acabar me acostumando a dormir tarde e acordar atrasada. Mas, mesmo assim, não podia deixar alguém que eu não conheço falar desse jeito comigo. Decidi que ele precisava de umas respostas bem dadas, e foi isso que fiz.

@patriciamnzs:

Nós não nos conhecemos e é muito arrogante de sua parte tratar alguém assim, @rafa_the_dark.

O perfil é meu, e me sinto livre para postar o que quero. Se acha ruim o que posto, sugiro que não leia, @rafa_the_dark.

Reply*: quando você responde ao tweet de alguém.

O amor em 140 caracteres [completo]Where stories live. Discover now