CORAÇÃO SELVAGEM

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RIO DE JANEIRO | BRASIL

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RIO DE JANEIRO | BRASIL.
Leona Bonemer.

  EU NASCI DURANTE UMA MADRUGADA TEMPESTUOSA no dia vinte e dois de março de 1967. Não era comum no Rio de Janeiro um clima tão diferente do sol quente e das tardes abafadas que faziam suor escorrer pela pele. Mamãe não parecia muito contente, minha tia me contou uma vez, mas papai estava transbordando de felicidade por sua primeira herdeira ter sido uma menininha; a qual ele poderia mimar e dar o que ela pedisse. Acho que com o passar dos anos, foi isso que o decepcionou. Eu cresci e descobri que gostava de ter minhas próprias opiniões, falar o que viesse à mente ao invés de apenas fingir.

Antes de se casar, minha mãe era professora e aspirava em ser atriz. Eleonor não costumava falar sobre isso, o que se sabia era que ela havia deixado os estudos de teatro quando conheceu meu pai. A vida do papai era mais fácil de saber. Leon Kurtz-Bonemer era filho de um alemão que veio se refugiar no Brasil após a Primeira Guerra Mundial e acabou se apaixonando pela brasileira Vera de Lima Bonemer. Papai era bem alto; 1,92cm de altura e herdou o tom de pele pálido, olhos azuis e o cabelo ruivo-dourado de meu avô. Meu nome, Leona, foi uma homenagem à ele.

Até os meus oito anos, Leon era a pessoa mais legal do mundo. Eleonor sempre foi terrível. Ela parecia nutrir um grande ressentimento, era uma pessoa muito amarga. O que tinha de beleza, tinha de veneno.

Pietra nasceu sete anos depois de mim, desde pequena ela tinha cabelos ondulados e escuros como os de Eleonor, mas seus olhos eram num tom de azul claro como os de nosso pai. Minha irmã era a pessoa mais amável e bondosa que eu havia conhecido na vida, muito boa para ser filha de quem e até mesmo minha irmã. Não a culpo por ter sido usada por nossos pais a todo instante como um exemplo de como eu deveria ter sido. Principalmente Eleonor, que colocava em Pietra a esperança dela ser o que eu não fui.

Mesmo para a década de oitenta, onde as mulheres conseguiam mais direitos do que em outros tempos, mamãe ainda era muito antiquada. Ela pensava que eu deveria ser inteligente, mas não demonstrar isso procurando ter uma carreira. Eu deveria ter bons costumes, estar sempre impecável e todo o esteriótipo de como ser uma futura boa esposa. Essa idéia me apavorava.

Infelizmente, Pietra teve uma dependência emocional por nossos pais que eu não tive, ela faria qualquer coisa por eles sem questioná-los. Era o orgulho da família, a filha perfeita que tinha uma linda moldura na parede enquanto eu era o desgosto. Apesar disso, nossa relação era muito boa. Eu a amava e sempre alertava que uma hora ela precisaria sair debaixo das asas de Leon e Eleonor, procurar seu próprio destino. Era quase tempo perdido, a manipulação feita parecia ser irreversível, porém eu nunca desistiria de tentar mudar seu pensamento. Pietra precisava entender que os dois não eram perfeitos, não eram flor que se cheire. Mas o que a filha rebelde poderia fazer sobre isso?

  Assim que terminei o ensino médio, já sabia o que queria fazer. Era uma certeza: eu entraria para uma faculdade de jornalismo. Só não contava que meus pais tentariam me impedir de estudar. Não adiantava, mesmo que eu fosse legalmente adulta eles conseguiram me proibir disso.

POTESTADEWhere stories live. Discover now