Entorpecência

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As coisas mudaram depois que o receptáculo de plasma estelar morreu. Riko Amanai foi a primeira pessoa fraca que conquistou seu afeição. Uma menina que poderia ter tido um futuro mais do que satisfatório assumindo-se como um ser além do novo corpo de Tengen, alguém que não deveria ter partido tão cedo.

Ela ter sido assassinada não era exatamente o motivo de sua perturbação, não... em uma carreira como a dele ver o sangue de seus companheiros sendo derramado é algo a se esperar. Era a forma com que a morte dela foi recebida pela sociedade jujutsu que lhe embrulhava o estômago.

Ver aqueles fieis ignorantes aplaudindo com gratificação, como se estar com o corpo morto daquela criança em seus braços fosse algo digno de reverencia... isso fez suas crenças de certo e errado mudarem. Como se não bastasse, ninguém além daqueles envolvidos na missão parecia ser capaz de enxergar a garota como uma perda significante.

Riko foi tratada como uma ferramenta com status de inutilizável, descartável e facilmente substituível. Eles não a viam como a porra de um ser humano. Não como a menina corajosa e cheia de vitalidade que ele conheceu, era apenas mais uma oferenda de sacrifício a ser aproveitada.

Gojo não teria se importado nenhum um pouco se Geto houvesse optado por deixarem de lado seus papeis na sociedade e dado sinal positivo para exterminarem cada pessoa dentro daquele maldito templo. Aqueles odiosos aplausos ainda soavam em sua mente.

Havia mesmo uma razão para estarem ali? Um significado, um propósito? Ele não conseguia ver o sentido de qualquer uma dessas coisas.

Sua humanidade também se rompeu naquele dia. Não por causa de Amanai, mas por causa de um homem comum sem energia amaldiçoada. Fushiguro Toji. Um mercenário que ia contra todas as leis naturais do mundo em que viviam, alguém que contrariava as normas do conhecido e que esfregava na cara dos costumes como eles eram ridiculamente atrasados. Um humano sem poder que o derrubou, o derrotou e o colocou a beira da morte.

A visão da realidade rotineira muda quando você encara a morte pela primeira vez. Satoru nem mesmo costumava considerar isso como uma possibilidade real, não para ele. Ter sua garganta rasgada e suas entranhas expostas ao vento era no mínimo esclarecedor.

"Ao longo do céu e da terra... Eu sou o honrado."

Uma honra e uma maldição, ele era o desequilíbrio das forças, o portador do talento de seis olhos, o último de uma linhagem poderosa demais para o próprio bem e um pé no saco da tradicionalidade.

Sua mente estava atordoada e confusa, agora que a adrenalina havia passado seu corpo carregava um peso que não conseguia suportar, seus pulmões trabalhavam desreguladamente, seu coração bombeava recursos para sua veias com contrações fortes e dolorosas, sua garganta estava seca e suas mãos tremiam. Ele não entendia a sensação, não a reconhecia, mas era horrível e não possuia forças para lutar contra.

Suguru não estava tão diferente. O outro adolescente carregava aquela mesma culpa e tormenta, embora culpasse os cidadãos comuns envolvidos tanto quanto culpava aqueles de alto escalão na sociedade jujutsu. Perder para um cara normal foi um golpe em sua moral, mesmo que ele escondesse seus sentimentos muito bem, não era bom mentiroso ao ponto de enganar Gojo e convence-lo de que não havia levado a situação como uma ofensa profunda.

Haviam essas feridas horrendas em suas almas que quebraram seus ânimos e alteraram seus rumos. Eles voltaram para a escola, entregaram o relatório da missão para seu sensei e caminharam rumo ao dormitório, tudo de maneira tão automática que mal registraram os próprios passos.

O quarto de Geto apareceu diante de seus olhos primeiramente. Seus corpos pararam, exaustos, mas sem realmente quererem descansar. Nenhum dos dois se moveu. Ir em frente em busca das próprias acomodações pareciam um erro, deixar o outro sozinho era ainda pior.

Jujutsu Kaisen - Orbitando um buraco negroWhere stories live. Discover now