Capítulo 3

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Diogo

Os dias começavam cedo para mim. Mesmo tendo alguém para fazer o serviço pesado, eu gostava de estar lá, colocar a mão na massa.

O dinheiro não me fez ser um cara cheio de frescuras, e eu dava graças todos os dias por isso.

Depois de pastorear o gado de um pasto a outro, decidi subir com o cavalo para o outro lado da estrada.

Fazia alguns dias que eu não via Fragoso na sua fazenda, e eu gostava de ver como os animais estavam sendo tratados.

Por sorte, S. Arnaldo, que já era um senhor de idade, era tão apegado aqueles animais, que não os deixava por nada, sempre visitando o lugar para alimentar e dar de beber.

Subi pelo carreador com Tempestade, meu melhor e mais fiel cavalo, passei pela porteira e atravessei a estrada, entrando na propriedade do Fragoso. Como ela estava caída de um lado, nem precisei descer para abrir, já que Tempestade passou por cima de um dos lados.

Fui adentrando o local com cautela, já que não queria encontrar com Otávio por ali. Ele já não ia muito com a minha cara, se me visse "invadindo" sua propriedade, certamente eu teria que ouvir um bocado.

Mas como não vi o carro estacionado no quintal, respirei mais aliviado e parti para o fundo, onde ficavam os estábulos dos animais.

S. Arnaldo estava abastecendo o cocho do cavalo com ração quando notou minha presença, virando-se na minha direção.

— Oi, Martins. — Ele me cumprimentou tocando na aba do chapéu. — Averiguando as coisas?

Arnaldo já sabia da minha preocupação com as animais, tanto que sempre que me via, dava um depoimento sobre como estavam as coisas naquela fazenda. Mesmo não tendo mais responsabilidade com nada de lá, ele fazia o trabalho sem receber um centavo de Otávio, o que já contava para que eu odiasse ainda mais o sujeito. Isso porque ele já estava com uma idade avançada.

— Sempre estou. Como estão os animas?

Aproximei-me da cerca, vendo alguns cavalos pastarem ao longe. Não havia muitos animais, eram algumas vacas, que Arnaldo mesmo ordenhava e mantinha, ficando apenas com o lucro do leite, e dois cavalos.

— Estão bem. Fragoso não vem para cá há uns meses, mas estou tomando conta deles.

O homem passou a mão no chapéu, tirando-o e limpando o suor da testa com o braço.

— Claro que está. Mas se precisar de alguma coisa, sabe onde me encontrar.

Toquei a aba do meu próprio chapéu quando S. Arnaldo acenou para mim, e voltei para minhas próprias terras.

Parei na casa grande, que era dos meus pais.

Mesmo aquelas terras todas sendo minhas, não achava justo deixar minha família de fora. Então eu havia deixado a casa grande para eles, junto com meus irmãos.

Eu tinha construído meu cantinho, que ficava dentro da propriedade mesmo, mas um pouco mais afastada.

Quando decidi fazer isso, minha mãe quase teve um problema no coração, não querendo me ver longe de casa, como se alguns metros de distância fossem do outro lado do Mundo. Mas consegui convencê-la, e construí uma casa para mim. Ela não era tão grande como aquela que estava à minha frente, mas era perfeita para mim.

Parei em frente às escadas, amarrei Tempestade próxima onde havia capim para pastar. Parei ao seu lado, colocando a mão entre seus olhos e ele me olhou fixo.

— Já volto.

O cavalo fez um pequeno gesto com a cabeça. Eu sempre dizia que ele me entendia, e conversava comigo. E pequenos sinais, mesmo que não fossem o que eu realmente queria, me faziam acreditar nisso.

Tirei o chapéu e entrei direto na cozinha, onde se ouvia a gritaria que era a minha família reunida.

— Chegou bem na hora, filho.

Minha mãe já estava na meia idade, com seus cinquenta anos, mas parecia ficar cada dia mais linda. O corpo era magro, os cabelos brancos, sempre muito bem presos e envolvidos por uma toca branca. Estava sempre com um avental em volta do corpo também, já que estava sempre na cozinha preparando pratos deliciosos.

Ela pegou um prato do armário e serviu com um arroz carreteiro que estava impregnando o ar com seu aroma delicioso e me entregou.

Depositei um beijo no alto de sua cabeça e me sentei ao seu lado na mesa.

Meu pai estava sentado na ponta, observando todos comerem. E eu parei um tempo, fazendo o mesmo que ele. Já era um senhor de idade também, mas muito teimoso. Foi por ele que começamos no ramo laticínio, e quando eu comecei a trabalhar com ele, as coisas foram crescendo consideravelmente, e assim pudemos aumentar a produtividade e expandir os negócios. Hoje, tínhamos algumas fábricas de produtos lácteos espalhadas pelo país, o que me deixava muito orgulhoso.

Coloquei o chapéu, que ainda estava na minha mão, sobre a mesa em um canto que não estava sendo usado e voltei minha atenção para a comida e as pessoas.

Levei uma garfada à boca e subi os olhos novamente para o meu pai.

Ele tinha um bigode grosso do qual não se desfazia por nada, nem mesmo os pedidos frequentes de minha mãe, o fazia se desfazer daquela preciosidade, como ele mesmo dizia.

Depois olhei para minha mãe, que sorria de algo que haviam dito e eu não prestei atenção. Suas rugas pareciam aumentar a cada dia. Não que isso a deixasse menos bonita, mas me dava o soco na barriga de que o tempo estava passando muito rápido.

Depois de levar outra garfada à boca, olhei para meu irmão. Ele era oito anos mais novo do que eu. E com seus vinte e três anos, já estava terminando a faculdade e muito feliz atuando na advocacia.

Depois meus olhos caíram na minha irmãzinha caçula. Cecília era a temporã, tinha treze anos, e era a felicidade da casa.

Continuei olhando para todos rindo, se divertindo, em um dia qualquer, sem um propósito maior.

Eles eram felizes, e aquela felicidade, era o que me deixava tranquilo.

Tirei aquele momento para os meus cinco minutos do dia, observando e absorvendo como eu amava aquelas pessoas. Eles eram tudo na minha vida.

Respirei fundo e mentalmente agradeci a Deus pela família que tinha.

O jantar durou mais que o previsto, e ainda fiquei para ajudar João, meu irmão, a lavar a louça.

E quando entrei na minha própria casa, depois de um tempo no meio de tantas vozes, o silêncio me recebeu de braços abertos.

Eu amava aquelas pessoas, mas sentar e ouvir apenas o som de pássaros noturnos e alguns grilos, era relaxante.

Eu gostava de apreciar minha própria companhia.

O Cowboy, a Viúva e o BebêWhere stories live. Discover now