Prefácio: Um mal de Família

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Não é como se Davi tivesse conseguido esquecer o que viveu durante os quinze anos que morou com seu primo opressor. Ele só evitava com todas suas forças pensar no assunto.

Mas agora ele não tem mais escolha. Uma morte inesperada é seu convite para recordar um tempo onde os dias eram mais inocentes. E assustadores na mesma medida.

Anos atrás, Davi socorria seu tio que chegava mais uma vez alcoolizado da esbórnia. Naquela ocasião, as estrelas que brilhavam do lado de fora da janela de casa eram a única fonte de luz a tornear o torso negro de seu tio semi-nu.

Agora Davi entende que lembranças são como aqueles mesmos corpos celestes que outrora ele tanto venerou: mesmo depois de mortas, elas insistem em brilhar a milhões de anos-luz de distância a quem possa observá-las.

Então Davi tem a chance de ressiginificar sua própria história. Resta saber se ele está disposto a passar tudo a limpo.

Afinal, como ressiginificar uma história que ainda não acabou? Uma história na qual ainda se está vivendo?
Trauma e desejo.
Medo e vontade.
Pecado e redenção.
Memórias que preferíamos deixar represadas em algum canto escuro da mente. Para Davi elas parecem se impor cada vez mais intensa e concretamente.

A cada passo em direção ao velório de seu antigo amado, uma nova lembraça que insiste em germinar.

O cheiro da colônia vagabunda que o tio usava.
O canto dos pardais que insistiam em fazer ninhos no telhado do quintal.
O sorriso debochado do primo.
O toque.
O calor da pele.
Os lábios.
A boca.
A língua.
Os dentes.
O soco.
O sêmen.

Uma história de luto. E por isso mesmo, de recomeços.

Mas não há o que temer, Davi. Você está em família.
Você sempre esteve.

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