Cap. XX _ O enterro

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Há quase onze anos eu visitei meu primo Jonas na cadeia e voltei pra casa sujo de porra, suor e saliva.

Odiava profundamente meu primo, mas, na ânsia de satisfazer meus desejos mais obscuros, permiti que ele me penetrasse em um quartinho sujo e abafado do pavilhão principal do presídio.

Na época, eu ainda morava com meu tio Ivan. Cheguei em casa com a roupa amassada, desfiada e manchada de fluidos corporais. Estava fisicamente esgotado, imundo, arrasado.

Assim que voltei do presídio, já havia tomado a decisão que afetaria radicalmente a minha história.

Não suportava mais viver naquele conflito de sentimentos: amava profundamente meu tio, que me ignorava, e detestava meu primo, que – de uma forma sádica - me desejava.

Me lembro que tomei um banho tão quente que tive a sensação que minha pele escaldava junto com meus pecados.

Meu ânus ainda doía e uma poça de sangue se formou no chão do box quando a corrente d'água passou pelo meu furico.

Mas nem toda água quente do mundo seria capaz de limpar as feridas que assolavam minha alma.

Depois de seco, juntei minhas roupas, documentos e alguns mantimentos em duas malas velhas e uma mochila esfarrapada. Uma cueca gozada de Ivan, que eu mantinha comigo, também foi parar dentro de uma das bolsas.

"Aonde você tá indo, Davi?", Ivan quis saber. Eu caminhava cambaleante em direção à porta de casa, carregando minha bagagem.

"Estou indo embora, tio. Não posso mais viver nessa casa, não consigo mais morar aqui", as palavras me escapavam antes que eu tivesse tempo de articulá-las. Meus olhos marejavam.

"Mas... por que? Aconteceu alguma coisa no presídio?", meu tio estava incrédulo com a minha decisão, mas eu não estava preparado para admitir que seu filho havia me violado em uma cela da cadeia.

"Nada não. É só que...", respirei fundo, tomei coragem e continuei, "é que eu não consigo mais viver sob o mesmo teto que você, tio. Me dói demais continuar te olhando todos os dias e fingir que nunca tivemos nada".

Apesar deste não ser o único motivo para que eu saísse de casa, não era mentira que a nossa situação deixava tudo mais insustentável.

Esse era o máximo de honestidade que eu poderia lhe oferecer. Não disse que estava indo embora porque Jonas havia me traumatizado tão profundamente que seria impossível continuar habitando aquela casa, remoendo minhas dores naquele ambiente onde tudo me lembrava meu violador.

Ivan me encarou com os olhos opacos. Há muito tempo eu não o via demonstrar algum sentimento.

Por um segundo eu achei que ele fosse pedir que eu ficasse. Durante um mísero segundo, tive a esperança que ele me recebesse em seus braços, implorando para que voltássemos a ser amantes.

E talvez eu estivesse disposto a passar por cima de todo o trauma que Jonas havia me feito passar, só para ficar com Ivan outra vez.

Mas Ivan nada disse. Depois de um tempo em silêncio, balbuciou um "eu te entendo", como se liberasse a minha partida.

Continuei caminhando até o portão de casa. Mas antes de batê-lo uma última vez, resolvi confrontá-lo com algo que me incomodava há tempos. Já nao tenho nada a perder mesmo, pensei.

Quis ser o mais sincero com meu tio, tentei buscar forcas para declamar tudo o que nutria por ele, mas os sentimentos me pareciam bregas quando ditos em voz alta. Ao invés disso, apenas o questionei:

"Eu só queria saber se alguma vez você realmente me amou. Se pelo menos uma única vez você sentiu algo de verdade por mim, ou se você só estava comigo porque eu te lembrava a tia Rose".

Os Homens da Casa (GAY)Where stories live. Discover now