Capítulo dez

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Mais tarde , bem tarde quando Frank chegou , eu estava acordada pensando no atrocismo que estava ao meu redor e que nada podia fazer para mudar o quadro tenebroso .

Me levantei e fui até  ele , que de costas se virou para mim , eu o questionei; na verdade eu o acusei.

- Você! apontei o dedo para ele no pouco espaço  que nos ligava.

- Você  é  um monstro! Tentei abafar minha voz descontrolada :

- Eu vi o que você  fez , eu sei exatamente o que você  faz . Como pode? Seu próprio  povo.

Franki colocou uma palidez no rosto transfigurado pelo que dizia. Não  sei se pela minha descoberta ou se pela minha ousadia.

Respirou fundo o homem-
monstro para me responder:

- Sou obrigado  a fazer o que faço.  Foi a sua resposta.

Os outros que moravam em nosso pequeno alojamento estavam dormindo e nós  dois ali em pé  aquela hora da noite.

A minha raiva fazia meu fraco coração  bombear mais forte. Eu o observava de nariz inclinado e ele retornou meu olhar de desaprovação e colocou a mão no rosto , subindo e massageando a careca e voltar ,  cubrindo o rosto chorando baixo feito uma criança.

Esperei ele parar seu tormento momentâneo até  que o choro baixo virou soluços  abafados.

Meu ódio  permanecia inalterável  enquanto ele chorava ao falar :

- Eu não  posso ter o luxo de desobedecer as ordens aqui.

A voz de Frank estava embargada. -  Era eu ou eles.

Eu tenho que mata-los , cumpro ordens.

Se for obediente posso sobreviver, porque a cada par de meses eles nos matam sem piedade e depois somos substituídos. 

Muitos de nós  morremos nas mesmas condições  que os matamos.

- Então  porque compactuar com este horror ?  falei alterando um pouco a voz.

- Porque quero prolongar a
minha vida, já que Serei fuzilado, posso ao menos ter algum conforto nesta miserabilidade em que me encontro.

Eu vivo em choque  constante
Eu sou um assassino! Mas faço o que me mandam. É  assim que funciona.

- O que mais vocês  fazem conosco?

Frankie me olhava e parecia exausto e eu o escrutinava horrorizada enquanto ele prosseguia desabafando :

- Eu libero homens, mulheres e crianças para a Câmara  de gás em que em breve será  o meu destino e outras atrocidades sob o comando deles.

Eu , antes de tudo isto ocorrer eu era um judeu ortodoxo.

Eu oro todos os dias , procuro tentar rezar  para ver se alivia o meu remorço . Eu me culpo todas vezes , horas dias , minutos e segundos, mas nada posso fazer, ele balançava a cabeça  em uma negação  de seus próprios atos.

- Fique então  com a sua pouca vida de MERDA. Porque então  estais aqui, morando nesta casa? Não  tem as suas regalias? Pelo que sei vocês possuem seus próprios  alojamentos. Então VÁ. Disse raivosa.

- Sou também  vigiado como todos o tempo todo.

- Mas estou aqui com um propósito, a mando de meus superiores por conta da minha formação  médica.  É  só  o que posso dizer.

Eu queria saber , afinal ele não estava ali por acaso.

- O que vai ser então?

Frankie  enxugou as lágrimas  e me disse :

- Se eu tivesse coragem já teria me suicidado, porém  sou um fraco.

Ele se sentou em um banco com a cabeça  baixa , respiração  ofegante e fedendo aos mortos que ele matava.

Me afastei de Frankie e seu remorso infrutífero e fui para o meu canto.

Não peguei o olho a noite toda , o horror do que presenciei me deixou despedaçada.

E ele tinha salvado a minha vida mesmo assim .
Eu poderia estar ali naquele máquina, morta.

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