I

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///Giovanna:

- Tem certeza que você não fez nada errado, garoto?! - Pergunto enquanto estou dirigindo.

- Tenho tia, ele só disse que queria falar com a senhora.

- Jesus! Você deveria ter me avisado antes, eu já tinha feito toda a programação do dia hoje, cara! - Falo um pouco impaciente, detesto fugir da rotina.

- Desculpa! - Olho pelo retrovisor. Observo seus olhinhos tristes pelo espelho.

Tem sido cada vez mais difícil para ele.

Pra nós dois, aliás.

- Tudo bem! Não precisa ficar assim! Se você disse que não fez nada, então deve ser só pra acertar algo, alguma documentação. Como é o nome dele mesmo?!

- Eu não sei!

- Não sabe?!

- Ele entrou faz pouco tempo, eu chamo ele de professor e as vezes de tio. - Ele dá de ombros e continua olhando para o celular.

- Ah, entendi!

Entro na escola e direciono o carro para o estacionamento. Meu sobrinho, que está no banco de trás, estuda nessa escola. Ainda estou tentando entender, pelo que eu compreendi é uma escola de esportes do setor privado, onde ensinam várias modalidades, dentre elas futsal, vôlei, handebol, etc.

Meu sobrinho pratica...

- Pietro?! Você joga o quê mesmo?!

- Futsal, tia. Nossa, a senhora é esquecida mesmo. Bem que a mamãe falava.

- Futsal, vou lembrar, prometo. - Pisco para ele.

Tem sido desafiador cuidar de uma criança de cinco anos que acabou de perder os pais em um acidente trágico. O nosso luto é algo silencioso. Eu sofro pela perda da minha irmã. Ele sofre pela perda dos pais. Eu tento não demonstrar minha tristeza. Ele demonstra de todas as maneiras e formas possíveis. Eu finjo conseguir administrar meu emprego, minha nova vida, meu apartamento novo e um escritório com pessoas novas. E ele finge me aceitar como papel de responsável em sua vida.

- Prontinho! - Desço do carro e abro a porta pra ele sair. - Aqui, sua bolsa.

Esse era o único lugar que ele parecia gostar de ir. Durante esses meses dispensou todo e qualquer convite para outros lugares. Mudou o comportamento na escola, rendimento nas atividades escolares e relacionamento com os amigos.

Há uma semana eu tinha sido chamada pela diretora porque ele tinha empurrado um coleguinha. Creio que algo semelhante ocorreu dessa vez também.

Ele sai andando com a mochila nas costas.

- E o beijo da tia?! - Chamo sua atenção.

- Ah, é! - Ele volta e me dá um beijo sem graça.

- Boa aula!

- A senhora não vem?!

- Vou sim, vou só pegar um café ali e já entro.

-Tá bom, tchau. - Ele sai correndo, os cabelos loiros esvoaçando com o vento.

Pego minha bolsa no carro e coloco os óculos escuros indo em direção a um local em frente a escola em que vendem café.

- Bom dia! Um café, por favor, sem açúcar. Pra levar.

Só o cheiro de café me dá uma leve acordada. O dia hoje vai ser cheio. Muitas reuniões, decisões, ligações. Não sabia que chegaria atrasada, mas saí de casa preparada para ir direto para o trabalho.

DonaWhere stories live. Discover now