COLORAÇÃO

2.9K 298 5
                                    

Coloração

Nathaniel

- Olha só, quem apareceu.

Ver Gaia com seu vestido de couro vermelho e maria chiquinhas nos cabelos curtos saltitando em minha direção, trouxe de volta a irritação adormecida. Claro que não me ajudaria a deixar o deserto. Preciso matar essa ingenuidade que ainda me ilude.

- Estive ocupado.

- Ah, eu sei Nate – ela apertou minha bochecha e fez bico – não precisa se desculpar. - Venha, senta aqui.

Eu não estou me desculpando.

Gaia esticou as pernas na frente e as cruzou.

- Por que você nunca deixa o deserto? – me sentei onde ela indicou.

- Estou aguardando sua adorável companhia para ir comigo até NY.

- Minha companhia? - arqueei as sobrancelhas - O que há para você em NY? – Exatamente onde Liza se encontra.

- Assuntos pendentes.

- Então não deveria resolvê-los em vez de me esperar?

- Que anjinho mais impaciente. Eu não fico no deserto o tempo todo, Nate. Simplesmente sei quando você chega aqui, do meu lado das areias.

- Simples. – bufei cutucando a areia no chão a minha frente.

- Você está muito impaciente, Nate. Mas não estou vendo suas ruínas.

- Desculpe, hoje não trouxe seu jantar.

- Grosso. Fico feliz de ver que está progredindo. – fingindo estar magoada ela enrugou a testa e entristeceu as feições.

Meneei a cabeça para os lados. Quanta perda de tempo. Seria injusto de minha parte admitir que não ligo para nada dessa história de anjos e de todos os ensinamentos de Johan? Se no final, não me levassem a ela, de nada adiantariam.

Por outro lado, injusto por que? Nada do que sou me trouxe nenhuma vantagem até hoje.

- Vou indo Gaia. Não sei bem o que vim fazer aqui.

- Já lhe contei da coloração das almas? – perguntou cinicamente para incitar minha curiosidade.

Eu era facilmente fisgado pela falta do saber. E também não queria voltar até Johan.

- Não. Mas caso pretenda me contar, ficarei.

- Então vamos dar um passeio. – ela ficou de pé ao meu lado e me ofereceu a mão, o que eu ignorei. – Só lhe conto se segurar minha mão.

Impaciente, a segurei com mais força do que pretendia.

- Adoro um homem forte. – riu Gaia.

No instante em que nossas palmas se encontraram me senti puxado para outro lugar. Apesar do meu corpo tentar oferecer resistência, em dois segundos meus olhos acostumados com a noite no deserto, doeram com uma luz forte vindo de cima, reconheci o corredor de um hospital.

- Agora olhe, Nate. – Gaia tamborilou os dedos no vidro à nossa frente. Do outro lado, havia uma dúzia de bebês em pequenas incubadoras.

Esforcei-me alguns segundos, cheguei a estreitar os olhos. Como enxergar a alma, quando já foi inserida no humano? Talvez por serem recém nascidos, eu conseguisse.

O Templo - Livro 2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora