BECOS MALDITOS

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BECOS MALDITOS

Irmã Daiana

Ela era muito nova quando aconteceu. Virgem. Inocente.

Voltava da escola feliz, saltitante. Faltava pouco para concluir o último ano. Pensava distraída nas inúmeras possibilidades de seu futuro.

Foi atravessando a rua que ouviu um choro estridente seguido de um grito abafado.

Voltou-se para o beco de onde vinha o som, a fim de verificar o que acontecia ali.

No ímpeto de ajudar, e ainda inebriada pela felicidade, Daiana não viu as sombras se arrastando pelo chão atrás dela.

Chegou ao local e não havia nada. Nada além das paredes gastas e do longo corredor apertado à sua frente.

Um mau agouro crepitou as suas costas. Sentiu aquele calafrio, o arrepio doloroso que lhe deu a certeza de que era observada.

Virou-se, pronta para gritar, e uma sombra terrível a cobriu. Mãos invisíveis a tocaram. Dedos gelados por todos os cantos. A sensação de gelo nos ossos. Visões obscuras a inundaram. Se debateu mas foi inútil. Tentou gritar e não pôde.

Horas depois, jazia caída no chão. Arfante. Trêmula.

Tocada pelo mal.

Não compreendia o ocorrido. Sabia apenas que estava poluída.

Depois de retomar o fôlego, voltou para casa. Não contou a ninguém.

Dois meses se passaram, sessenta noites de suspeitas e pesadelos. Até o horror ser constatado com o resultado do exame de gravidez. Positivo. Grávida. Virgem. Órfã, e sem dinheiro.

Assim, Daiana fugiu da casa de seus pais adotivos. Tomada pelo medo, pela vergonha e pela desesperança. Pois ninguém acreditaria na sua história, e ninguém poderia ajudá-la.

Encontrou refúgio no orfanato Alis Angeli, perto de Winterhill. Nove meses depois, o menino nasceu. A família bondosa que o adotou quis ficar com o nome que Daiana escolheu: Mathews. Em homenagem à Bíblia, pois graças a ele, descobriu sua vocação para freira.

Seu filho partiu de seus braços mas nunca deixou seu coração. Soube que mudaram-se para Los Angeles, e muitos anos depois saiu em todos os jornais a desgraça que se acometeu sobre a família. Os pais adotivos de Mathews foram assassinados durante um assalto.

Seu peito afundou por não poder fazer nada para ajudá-lo. Pouco tempo depois, descobriu que, já adulto, havia seguido carreira na polícia e se tornado inspetor.

Enquanto descansava do almoço, Irmã Daiana pensava nas ironias do destino. Ou crueldades, por assim dizer. Tantos anos depois, seu filho estava logo ali. À distância de um corredor. Visivelmente acometido pelo mesmo mal que se apoderou dela naquele beco, ou por algo ainda pior. Ela sempre se perguntou o que seria daquela alma quando amadurecesse. Mas era apenas um bebê inocente, e todos não devem merecer uma chance?

Agora ela sabia. Talvez, não. E, às vezes, para seu próprio bem.

Será que as desgraças nunca encontrariam seu fim? Até quando mais e mais inocentes seriam arrastados? Será que tudo que fez até então, todos os segredos que ocultou, os atos dos quais ainda se arrependia, serviriam para alguma coisa?

Perdoe-me. Senhor, não deveria duvidar de seus atos.

Prestes a iniciar uma oração para se libertar de pensamentos ruins, ouviu Julie chamá-la do corredor:

— Irmã Daiana, ele acordou!

Suspirou e levantou-se do colchão.

Chegava a hora de encarar aquela outra parte de seu passado.

Irmã Daiana viu a sombra se alastrando pelas paredes do orfanato.

Sabia que verdades ainda piores seriam expostas nos próximos momentos. Inclusive suas próprias.

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Gennnte, o final do livro está chegando =O

Estão preparados?

O Templo - Livro 2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora