capítulo 35

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Dulce tentou não se deixar dominar pelo sentimento de culpa. Na verdade, pouco se importara com Anahí. Estivera apenas tentando mostrar ao barão e a Christopher que agora era a senhora do castelo e esperava ser tratada com respeito.

— E também quero lhe dizer, minha lady... que não lhe causarei qualquer problema. Não que eu me julgasse capaz disso, entenda. Isto é, ele é seu marido agora e não chegarei nem perto. A senhora não vai me mandar embora daqui, vai, minha lady?

— Não, a menos que você me dê motivos.

— Oh, obrigada, minha lady. Eu nunca lhe darei motivos. Juro. Só espero que sir Christopher permita a Téo continuar ocupando o cargo.

— Quem é Téo?

— Meu irmão.

— Ele é um bom capataz? Anahí sorriu, orgulhosa.

— Oh, sim, minha lady. E o estou elogiando não porque seja meu irmão, mas porque é verdade. Téo sabe manter todo mundo na linha, mas é sempre tão simpático que ninguém nunca fica com raiva. E um dom que ele tem, deixar todo mundo feliz.

Dulce também não tinha dúvidas de que Anahí possuía o dom de fazer os homens felizes, porém achou melhor guardar o comentário para si.

 

— Se Téo é um bom capataz, com certeza sir Christopher não pretende colocar outro no lugar.

— Acho que sim.

— Você não tem nada a temer de sir Christopher, nem de mim.

A criada sorriu, satisfeita. Então Alfonso gemeu como se seu estômago estivesse em chamas, obrigando-as a interromper a conversa.

— Pode ir agora, minha lady. Tomarei conta de seu irmão e o levarei para o quarto assim que ele conseguir caminhar.

Ao sair para o pátio, Dulce notou que os preparativos para a caçada estavam quase no fim. Os cavalariços terminavam de selar os cavalos enquanto vários dos convidados para o casamento, ainda hospedados no castelo, aguardavam, conversando e vistoriando as armas. Oh, Deus, ia ser mais uma daquelas manhãs horríveis em que seria obrigada a passar horas na companhia das esposas dos nobres, bordando e falando sobre assuntos fúteis.

Odiava momentos assim porque pouco tinha em comum com a maioria das mulheres bem-nascidas. Sua vida sempre fora difícil e seus dias mais se pareciam com os de uma criada. De fato, suspeitava ter mais em comum com Anahí do que com qualquer uma das mulheres hospedadas sob o seu teto. Felizmente, pelo que pudera compreender, a maioria delas iria partir ainda naquele dia. Se era assim, não custava aguentar algumas horas de pura chateação.

— Minha lady! — soou uma voz amigável, bem às suas costas. — Permita-me apresentar-lhe Gastão, o falcoeiro.

Era sir Tomáz quem se aproximava, um sorriso gentil no rosto e um pedaço de pão fresco nas mãos. Ao seu lado, um homem de meia-idade trazia um falcão pousado no pulso.

— Gastão, que belo falcão! — Dulce exclamou.

— Sir Christopher gosta do que há de melhor, minha lady — Gastão respondeu, sorrindo nervoso. — Felicidades pelo seu casamento.

Assim como Uckermann, os cabelos castanhos de Gastão iam até os ombros. A barba rala, porém, não disfarçava as inúmeras cicatrizes finas no rosto. Percebendo o olhar admirativo do falcoeiro, Dulce experimentou uma pontada de insatisfação. Seria porque era esposa de sir Christopher? Mas não era o que queria? Certamente seria demais esperar que fosse respeitada por si mesma, por seus próprios méritos.

— Obrigada. — Ela virou-se para Tomáz, sentindo que o falcoeiro relaxava agora que não o fitava diretamente. — Suponho que Christopher não vá comparecer à missa, não é?

Tomáz balançou a cabeça de um lado para o outro enquanto Gastão caminhava na direção dos cavalos.

 

— Ele disse que não vai à missa e duvido que estejamos de volta até a hora do almoço. Por isso tomei a liberdade de pegar um pouco de comida na cozinha. Perdoe minha rudeza.

Dulce brindou o cavaleiro com um sorriso genuíno. Pelo menos ele a tratava com respeito. Também pedira-lhe desculpas e agradecera com sinceridade.

— Gastão me parece um homem nervoso para ser falcoeiro — Dulce comentou tão logo ficou a sós com Tomáz. — Ele não assusta os pássaros?

— Gastão fica nervoso apenas quando está na companhia das mulheres, minha lady. Junto aos falcões, é um titã. Certa vez, vi quando um falcão quase reduziu parte de seu rosto a tiras sem que ele movesse um músculo. Apenas continuou imóvel, tão calmo quanto nós dois estamos agora.

— Tomáz! — Christopher gritou e o clima de cordialidade imediatamente evaporou. Uckermann montava um garanhão negro, tão magnífico quanto o próprio dono. — O que diabos você está fazendo? Vamos, monte.

— Só um instante — Tomáz respondeu, retribuindo o sorriso incerto de Dulce. — Creio que um marido nervoso na manhã seguinte seja um bom sinal.

Dulce suspirou vendo Tomáz afastar-se. Segundos depois o grupo atravessava os portões do castelo e saía em disparada na direção da floresta. Sem ter o que fazer ali fora, ela caminhou para a capela onde passaria um bom tempo ouvindo padre Reverte ressonar e celebrar a missa nos intervalos.

Esposa Rebelde - VondyWhere stories live. Discover now