capítulo 40

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A sentinela relaxou um pouco e embainhou a espada, uma expressão respeitosa no rosto.

— Parece que vai ser uma bela noite — Uckermann comentou num tom agradável.

— Sim, meu lorde.

— Qual é seu nome?

— Nico, meu lorde. De repente, o som de uma risada feminina cortou o ar. Olhando
para baixo, Christopher viu um casal apaixonadamente abraçado, junto à muralha.

— Tenho a impressão de que alguém está festejando.

— É Simón. Ele vai se casar na próxima semana, meu lorde.

— Ah, sim. Simón não é aquele sem a metade do polegar?

— Sim, meu lorde.

— Não foi muito inteligente cortar uma fatia de pão e um pedaço do dedo ao mesmo tempo, não é?

Nico quase sorriu.

— Não, meu lorde. Desde então, Simón nunca mais tocou num copo de vinho.

Christopher sorriu pensando, não sem uma pontada de satisfação, que Dulce não era a única capaz de conquistar o respeito e o afeto de subordinados. Ele apenas não estava acostumado a se esforçar. E nem planejava fazê-lo em relação à esposa. Não que acreditasse ser necessário ganhar o respeito ou a afeição dela. Era dever de sua mulher agradá-lo, não o contrário. Por outro lado, ao lembrar-se do beijo que haviam trocado, perguntava-se se não valia a pena tentar uma reconciliação.

 

Afinal, não era um monstro. Era um nobre. Teria apenas que ser gentil e, assim como Simón, ficar longe do vinho.

— Continue alerta, Nico — Christopher falou, jovial, descendo a escada que conduzia ao salão.

Dulce decidiu não esperar Christopher voltar de onde quer que ele estivesse. Seu marido não dissera nada a ninguém sobre seu destino, nem quanto tempo ficaria ausente. Simplesmente desaparecera em silêncio, o rosto sombrio. Sem a presença de Alfonso e do sempre atencioso sir Tomáz, o jantar teria sido insuportável.
Talvez as prostitutas da aldeia fossem a explicação para a ausência prolongada de Christopher. Na noite em que haviam chegado ao castelo Uckermann, recordava-se de ter ouvido Alfonso mencionar duas moças que trabalhavam na taberna da aldeia com um certo ar saudoso.

Que Christopher permitisse o funcionamento de um bordel em suas terras não tinha importância. Na verdade sentia-se feliz por livrar-se de um dever tão custoso. Como dissera ao irmão no dia de seu casamento, sabia o que se passava entre um casal para gerar filhos, mas tudo lhe parecia nojento. Podia viver muito bem sem aquele tipo de intimidade.

Tendo isso em mente, Dulce resolveu que seria melhor já estar dormindo quando Christopher voltasse de suas andanças noturnas, pois talvez ele decidisse exigir seus direitos de marido, obrigando-a a...

De pé junto à janela do quarto, Dulce olhou o céu, cheio de estrelas. Pensativa, começou a escovar os cabelos, tentando relaxar.

Suspirando fundo, virou-se, atraída por um ruído quase imperceptível... Christopher acabara de entrar e fitava-a com aqueles olhos escuros e intensos. Ela devolveu o olhar, assustada a princípio, depois determinada a esconder a surpresa e a confusão interior. Engolindo em seco, abaixou a escova, a mão tremendo incontrolavelmente.

— Você nunca viu uma mulher escovar os cabelos antes? — indagou desafiante, já não conseguindo suportar o peso daquele olhar.

— Não em muito tempo. — Ele fechou a porta do quarto atrás de si, isolando-os do resto do mundo. — Você tem cabelos lindos, apesar da cor.

O meio-elogio a desagradou, fazendo-a responder quase com raiva.

— Escovo meus cabelos todas as noites. Christopher aproximou-se um pouco mais, o olhar penetrante, o silêncio pesado do quarto cortado apenas pela respiração de ambos e o arder das chamas. Será que ele sentia a tensão crescente, tão forte quanto o odor de cera derretida?

 

Ainda sem dizer uma palavra, ainda fitando-a, Uckerman começou a desfazer o nó que prendia a túnica. De repente, Dulce sentiu a coragem abandoná-la e virou-se para a parede depressa, o coração batendo descompassado no peito, o rosto em fogo. Por que o marido fora procurá-la? O que estava fazendo?

Covarde!, ela se repreendeu em pensamento. Enfrente-o!

Entretanto, não foi capaz de encará-lo. Mas, se o olhasse, veria que as mãos masculinas também não estavam muito firmes.

— Todos parecem encantados com você — ele murmurou junto ao seu ouvido.

— Estou apenas tentando... — Ela parou no meio da frase, sem saber como continuar.

— Você está tentando ser o exemplo de uma boa esposa? E isso?

Seu marido estava tão perto agora que ela mal conseguia respirar, lembrando-se do primeiro beijo que haviam trocado na noite de núpcias, das sensações desconhecidas que a carícia despertara.

Então ele segurou-a pelos ombros, obrigando-a a fitá-lo. O toque foi leve. Suave. Gentil. Desacostumada a qualquer demonstração de ternura, Dulce não sabia como reagir.

Entretanto não suportaria se sua vulnerabilidade e insegurança ficassem expostas. Assim, fixou o olhar no peito forte, reparando nos pêlos escuros pela abertura da túnica. Os ombros e os braços musculosos revelavam poder e virilidade, uma mistura além da sua capacidade de manter-se indiferente.

 

Estaria errado ser mais fraca do que ele? Seria possível que, com o seu corpo de mulher e o seu desejo insidioso, continuasse a resistir-lhe?

— Você está se saindo muito bem. — A voz de Uckerman soava como uma carícia. — Tudo o que precisa fazer para me agradar completamente é obedecer-me.

No mesmo instante Dulce ficou tensa e afastou-se, a raiva renovando-lhe as forças.

— Sou um ser humano dotado de raciocínio e sentimentos, não um animal à sua disposição. — As palavras vibravam de desprezo. — Tampouco um cão a ser treinado. Não preciso de sua aprovação, sir Christopher de Uckerman. Sei que estou me "saindo muito bem", assim como me "saí muito bem" cuidando de meu pai. E veja de que todo aquele esforço me serviu.

— Não há necessidade de você me falar assim. Tinha intenção apenas de fazer-lhe um elogio. — Os olhos do marido expressavam surpresa, incredulidade e desapontamento, porém Dulce não se importou.

— Não sou uma simplória qualquer, meu lorde. Sei qual era a sua intenção. Você quer obediência. Quer ter à disposição uma criatura tola, incapaz de pensar, alguém que dirija a sua casa sem incomodar o administrador ou os criados, claro. Alguém que se deite em sua cama, submeta-se aos seus abraços e gere os seus filhos. Uma estúpida, com a pouca inteligência de uma égua parideira. Pois muito bem.

Com movimentos rápidos e furiosos, Dulce arrancou a túnica e atirou-a para longe. Nua, porém indignada demais para sentir vergonha, deitou-se na cama, sem no entanto deixar de fitá-lo.

— Aqui estou, sir Christopher. Faça o que quiser comigo e se lhe agrada acreditar ter-se casado com uma mulherzinha obediente, que seja. De minha parte, cumprirei o meu dever e enquanto você tira o seu prazer de mim, estarei pensando em assuntos domésticos.

Esposa Rebelde - VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora