{44} A NOITE ANTES DA BATALHA

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Barton encarou o amuleto sobre a mesa, ainda preso na fina corrente de prata. A face enfurecida do touro e seus olhos feitos de pedras azuis eram inconfundíveis. Lia estava de pé, apoiando-se na mesa, mantinha sua expressão séria, mas Barton conseguia ver seu maxilar tremendo.

- Você o encontrou? - perguntou ele, levantando-se de sua cadeira. - Você encontrou Kraj?

- Sim - Lia admitiu, apontando para o amuleto. - Ele concordou em deixar todos em paz e eu o deixei ir.

- Você o quê?! - O tampo metálico da mesa estremeceu com o soco que Barton deu ao ouvir a notícia. - Você deixou aquele desgraçado ir embora? Era você quem mais queria se vingar dele.

- Isso foi antes de... - Ela deteve-se. Se contasse a Barton o que realmente tinha acontecido na aldeia em Yvrim, só ia piorar a situação ainda mais.

- Antes do quê, Lia? - Ele a pressionou. - Antes de você se lembrar do quanto o amava? - Sem perceber, Lia desviou-se dos olhos dele e deu um passo para trás. - Bem que eu achei que estava estranha nos últimos dias. Eu sabia que era por causa dele, só não sabia que era... por isso.

- Barton acalme-se - Sauly resolveu intervir. - Vamos resolver isso. Lia, onde o encontrou e por que não falou com ninguém sobre isso?

A Niffj voltou a sentar-se, escondeu o rosto entre as mãos e falou com a voz cansada:

- Na ilha. Ele foi até mim. Queria apenas conversar. Ele deixou tudo pra trás, Sauly. Não é mais o Mestre das Sombras.

- E você deixou ele ir? Simples assim? - Barton teve vontade de rir. - Aposto que ele repetiu umas mil vezes que te ama. Engraçado, da última vez que o encontrou você queria arrancar a cabeça dele fora e ele quase te matou e a mim também.

- Eu só quero isso acabe! Que droga, eu cansei de ter sangue nas mãos. Barton, você está tomando o mesmo que caminho que eu tomei, a vingança. É muito fácil se encher de ódio, e essa coisa no seu dedo está piorando tudo.

- Lia, eu... - sua resposta foi quase um sussurro e ela mal pôde ouvir.

- Você ainda gosta de mim, Barton? Então livre-se desse anel. Pode fazer isso? Pode abrir mão desse poder?

Barton fechou a mão, apertou o anel de Ghara no dedo e fixou o olhar em lugar nenhum, como se travasse uma batalha interna para decidir o que faria. Lia teve naquela indecisão a resposta que precisava.

- É isso, então - falou ela com a voz embargada. - Tinha medo que isso acontecesse.

Ela virou as costas e saiu a passos largos da sala, fechou a porta com um baque forte. Barton ainda conseguiu ver os olhos dela faiscando antes de sumir no fluxo de pessoas do corredor.

- Barton - Sauly o chamou calmamente, mas ele nem se quer parecia estar ali, ainda encarava a porta. - Barton, olhe para mim. O que aconteceu naquela ilha? O que você viu quando tocou o anel?

O rapaz saiu de seu torpor com um suspiro pesado, jogando-se na cadeira. Não estava nem um pouco cansado, mesmo depois da longa viajem, pelo contrário, sentia-se mais forte do que nunca. Porém, algo lhe faltava, sentia como se um buraco do tamanho do universo havia se formado em seu peito depois que colocara o anel.

- Meu pai estava lá - confessou ele, encarando a Assassina das Sombras sobre a mesa. - Eu o vi dentro da intercessão. Ele me falou coisas horríveis sobre mim e sobre minha mãe. Então eu... eu...

- Não era seu pai, Barton. - Sauly segurou sua mão. - Não era ele. Era você. O que você viu foi um parte sua, uma parte obscura que o aço de Ghara trouxe à tona para ter uma ligação mais forte com você. O anel não amplifica apenas sua aura, mas o que tem dentro dela...

𝑨́𝒖𝒓𝒆𝒐𝒔 - 𝑺𝒆𝒈𝒖𝒏𝒅𝒂 𝑮𝒖𝒆𝒓𝒓𝒂Onde histórias criam vida. Descubra agora