3.

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Às vezes, eu penso sobre a minha vida daqui alguns tempos, eu estou crescendo, daqui um ano farei 18 anos e então, esse será o meu fim. Não que seja a pior coisa do mundo completar 18 anos, mas, a saudade de poder ser pega no colo pelos pais, ou de brincar de correr igual a uma criança, ou até mesmo de ir à escola, se é que os universitários sentem falta disso.
Não quero ter que me virar totalmente sozinha, quero dizer, tipo votar, não quero votar, ou ter que fazer compras sozinhas, ou então me mudar para fazer uma faculdade sem ninguém, essas coisas me atormentam e às vezes, até chego a pensar que vou morrer antes mesmo de completar meus 18 anos, o que é algo muito dramático, até mesmo para mim.
Sou tirada dos meus pensamentos anti-felicidade, quando o Sr.Hoster bate na minha mesa com uma régua gigante, fazendo com que todos me olhassem e eu desse um pulo de susto.

- Senhorita Fray, a aula é aqui...- aponta com a régua pro chão indicando o local.- não na Via Lactia.- diz agora rodando a régua sob sua cabeça indicando para o céu.

Todos riram, não sei se foi da minha cara de susto ou das palavras do sr.Hoster. Ele se virou para a lousa e voltou a dar a sua aula e explicar sobre a ideia de robô que ele tinha em mente.
Aquilo estava um saco, ele explicava algumas técnicas para fazermos o robô que ele queria, enquanto todos bocejavam ou tacavam papéis em seus amigos, estavamos todos sentados com nossas duplas, eu no caso, estava ao lado de Bruce, que olhava aquele quadro cheio de anotações como um tesouro perdido. Era inevitável não lembrar do amor de Bruce por essas coisas. Quando tínhamos 9 anos, ele montou uma moto com peças da pia do banheiro que sobraram durante a reforma de sua casa e deu de presente no aniversário de 1 aninho de Brad.
Ninguém anotava nada que estava na lousa, muito menos Bruce.
Hoje era minha vez de ir à casa dele, teremos que nos ver todo dia caso quisessemos terminar esse robô, e isso incluía trabalhar até nos finais de semana. O robô fará com que ganhemos certificados e troféus na área da física, e um certificado por fazer um robô motorizado no meu histórico, ajudaria muito à passar em engenharia mecânica.
Quando o sinal tocou ensurdecendo a turma, levantei-me sendo acompanhada por Bruce até o corredor, mas antes mesmo de chegarmos ao meu armário, Bruce mudou de direção, indo para o dele que era um pouco longe do meu. Coloquei a combinação dos números 1806, e então ouvi o barulho do feixe abrindo-se, abro o armário e começo a guardar meus cadernos na prateleira, na lateral, bem na porta, vejo uma foto minha e de Bruce brincando no quintal de sua casa com a mangueira, tem também, uma carta que ele escreveu quando brigamos para saber quem andava de patinete melhor - a caligrafia estava péssima, mas eu conseguia entender -, e mais embaixo, uma foto minha ao lado do meu pai, abraçados.
Meu pai morreu quando eu tinha 7 anos, ele teve câncer de próstata, e então esse foi um dos motivos para eu vir morar no Sul, ficar mais perto da vovó e deixar o passado em Nova York.
Na minha casa agora, sou só eu, mamãe e Brad, meu irmão de 11 anos, somos bem próximos, brigas são normais, mas sei que morreriamos um pelo outro se necessário.
Ouço o som do chiclete sendo mastigado por Holly em sua boca. Ela nunca reparou o quão nojento isso é? Sério, não é nem de longe sexy, parece um cavalo mastigando capim.

- Ely, pode pegar para mim?- ela joga um caderninho no chão atrás de mim.

Estava visível que aquilo foi proposital e que ela faria algo, não sei porque, mas minha ação foi apenas me virar e abaixar para pegar o caderno caído. Sinto então ela empurrar o meu traseiro com força e meu rosto ir de encontro ao chão, fazendo meu nariz latejar de dor.

- Você nunca aprende, não é mesmo?- ela diz abaixando o rosto até mim e então sai rindo com sua marionetes.

Sento-me no chão para tentar me recuperar do tombo. Provavelmente todos estavam me olhando nesse momento, mas ninguém se atrevia a me ajudar, se não teriam que lidar com Holly, e ninguém queria lidar com ela. O único olhar naquela multidão de adolescentes que me chamava atenção, era o de Bruce, é inacreditável a falta de atitude dele, ele nem se quer falou nada ou veio me ajudar a levantar, ele apenas me encarava e então fechou o armário, sumindo no meio das pessoas. A primeira coisa que sinto, sao meus olhos arderem, aquela altura eu estava deixando algumas lágrimas escaparem, e não só porque eu estava cansada de como Holly me tratava, mas porque aquele garoto que cresceu ao meu lado e que jurou sempre me proteger aos nossos 8 anos de idade, virou as costas para mim, quando eu achava que tudo podia dar certo novamente.
Sinto algo pingar na minha mão e percebo que era sangue do meu nariz, levanto-me e fecho o armário, indo em direção ao banheiro. Assim que adentro o mesmo, percebo que estou sozinha, e aquela era a hora perfeita pra relaxar um pouco, a próxima aula já devia ter começado e eu não tinha nenhuma condição para frenquenta-la. Ligo a torneira deixando a água escorrer pelas minhas mãos, começo a limpar o nariz e então me olho no espelho. Meus olhos estavam vermelhos, eu estava chorando, meu nariz, também vermelho, não só pelo sangue, minhas bochechas rosadas e meu cabelo um pouco molhado devido a água que joguei no rosto. Eu não era bonita, não igual a Holly, não igual a Felicity ou igual a Chloe, eu não era magra o suficiente, nem tinha cabelos loiros, eu era uma ruiva sardenta, não tão sardenta - Deus teve piedade de mim -, mas eu era bem estranha, talvez eu reclamasse demais, mas era o que elas achavam de mim, o que todo mundo achava de mim naquele colégio, que eu não era nada, e sabe de uma coisa, eu já estava começando a acreditar, que eu não passava de absolutamente nada.

Bruce&Ely Where stories live. Discover now