Eu Sou Alice • {yoonseok}

08

Tudo é líquido e tem um cheiro estéril. Yoongi se afoga, se liquefaz e reaparece no desconhecido.

A horrível sensação de parecer ser feito de água, dentro da água, é algo que ele não deseja experimentar nunca mais. Ele não sabe o que está girando descontroladamente e agitando-se para todas as direções; ele ou todo o resto? Ou mesmo, ambos, em direções opostas? A vertigem atinge o loiro com força enquanto ele vê o Cosmos; nebulosas coloridas e salpicadas de luzes de todos os tamanhos lhe preenchem a visão. Planetas, asteroides, estrelas, cometas, constelações e sistemas, tudo tão rápido quanto um lapso. É como se ele tivesse sido jogado dentro de uma máquina de lavar junto com o próprio espaço sideral. O acontecimento todo não dura mais que um segundo e, mesmo assim, parece eterno — mas não que este seja um sentimento totalmente desconhecido para o Min. E de repente, ele está novamente de pé, do lado de fora do espelho. Yoongi sente uma tontura absurda e vontade de vomitar e demora um pouco para se recompor, apoiado na parede de madeira que não pertence à sala de Seokjin. Sente cheiro de pó e naftalina e ao inspirar profundamente e abrir os olhos, ele sabe que não está mais no País das Maravilhas.

Ele toca o espelho novamente algumas vezes, mas nada acontece. O objeto não ondula, não emite sons e muito menos prega peças. É só mais um espelho comum, a superfície lisa e perfeita do vidro reflete a imagem de um Yoongi completamente confuso e enjoado, tal qual o ambiente atrás dele.

Está num antiquário, por sinal.

As estantes ao redor são abarrotadas com coisas antigas e camadas e mais camadas de poeira. Desde objetos legais como astrolábios, relógios-cuco ou instrumentos de medição e instrumentos musicais, até umas misturas macabras de madeira e ferro que bem se assemelham a objetos de tortura — e ele pode jurar que vê sangue seco em alguns. Yoongi espirra algumas vezes enquanto caminha por entre as estantes altas, corredores de madeira empoeirada e velhice. Quando chega ao final das estantes, próximo à saída, o loiro encontra alguém sentado em frente a um balcão também de madeira clara, tricotando algo que se parece com um rascunho de cachecol em seu colo. É um híbrido também, mas de carneiro. Ele usa óculos redondos e tem olhos muito grandes, sardas e uma barbicha rala no rosto bonito e os cabelos ruivos encaracolados mal escondem os pequenos chifres curvos, além disso, as orelhas compridas por pouco não chegam até seus ombros. Veste roupas de lã confortáveis em tons de marrom e parece adorável, fazendo caretas para o nó que tenta desatar com a ajuda das agulhas finas.

— Hã... oi? — murmura, ao que o pobre híbrido dá um pulo na cadeira e quase cai para trás. Ele se levanta assustado, e quando o faz, Yoongi pode ler em seu crachá feito a mão que seu nome é Kyungsoo. — Desculpa, eu não quis te assustar.

As pernas do híbrido tremem consideravelmente ao que ele ajeita seus óculos no rosto e gagueja:

— Você... você veio do espelho?

— Bom, sim. E eu queria saber...

— Ah, não. Não, não, não... — Kyungsoo deixa seu tricô sobre o balcão e, agitado, começa a andar em círculos ao redor do móvel, levando os dedos à boca para roer as unhas audivelmente.

— Qual é o problema, carinha?

— As Rainhas. Elas... — Ele para de andar e morde os lábios. Yoongi franze o cenho. Rainhas? De repente, todo o semblante de Kyungsoo muda completamente e ele ajeita a postura, embora suas pernas continuem tremendo. Tenta falar de forma despreocupada com Yoongi. — Não é nada, Alice, nada com que deva se preocupar. Vai querer algo da loja?

— Quero primeiro saber onde eu 'tô. — Yoongi aponta para trás, em direção ao espelho. — Aqui não é o País das Maravilhas... certo?

— País das Maravilhas? Não, não, não. — Kyungsoo enxuga o suor de seu rosto, ainda que ali dentro não faça calor, exatamente; só está abafado. Ele ajeita novamente o óculos, embora não precise fazê-lo, e dá um sorriso forçado. — Aqui é o País do Espelho, Alice.. Ou, ao menos, foi assim que ela chamou. A primeira a passar pelo espelho...