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O loiro veste um moletom azul por cima de uma regata branca velha e calças bege, os pés descalços, próximo à mureta de seu apartamento. Todos os acontecimentos no País das Maravilhas lampejam em sua visão rapidamente, memórias apostando corrida, mas ao fim do fluxo ele só enxerga a escuridão mais abaixo, nas ruas parcialmente iluminadas de seu bairro periférico. A brisa fresca das ruas cheira a lixo e o vento fraco é facilmente ignorado por sua mente agitada.

Está levemente tonto pelo efeito do álcool e percebe que, na verdade, nunca saiu dali. Yoongi nunca pulou e nunca foi parar em nenhum mundo mágico de fantasia, nunca sequer saiu dessa mureta, muito menos de sua própria dimensão. Por vários minutos ele somente fica ali encarando o nada e vazio demais para sequer se mover, mas quando percebe já estar sóbrio, resolve se levantar e calçar seus chinelos. Chegou muito perto de se matar desta vez, bem mais do que gostaria de pensar.

A procura por um telefone público por ali — já que está há meses sem pagar a conta — não costuma ser tão difícil quanto hoje, mas o Min só percebe realmente o que está fazendo quando, após um piscar de olhos, já discou o número conhecido sem nem mesmo pensar sobre. A voz sonolenta de sua mãe o interrompe do transe e é ao ouvi-la que ele segura um soluço. Uma enxurrada de lágrimas vem sem aviso como uma cachoeira e de repente ele não é capaz de parar. Yoongi quer e necessita de uma esperança, e as últimas pessoas do mundo com quem gostaria de precisar contar são seus pais. Mas diferente do que esperava, Jaeyoon, sua mãe, apenas pergunta com toda sua preocupação exposta na voz cansada.

Yoongi, é você? O que houve?

Afoito, seu choro agudo é o único som na madrugada e carrega muito mais dor do que todos os outros até ali. Tão louco havia ficado em sua depressão que, além de ter tentado se matar, havia ainda alucinado completamente com o álcool no sangue e imaginado uma vida num lugar muito, muito longe dali. Uma vida em que ele era mais que alguém que simplesmente existia, num mundo alternativo no qual Yoongi tinha um propósito, tinha coragem, amigos e... um amor. E como havia criado em sua cabeça alguém tão incrível quanto aquele Chapeleiro?

O pior de tudo é que o Min sabe que corre o risco de esquecer toda aquela aventura, mesmo porque ela jamais aconteceu. Ele é, infelizmente, só o que se pode ver agora: um pobre fracassado de 24 anos sem um puto no bolso que tentou se matar por não aguentar as coisas - e nunca passou disso. Os soluços atrapalham sua respiração e os sons que sua mãe deve estar ouvindo do outro lado da linha não passam de evidências do quão quebrado ele está por dentro. Dessa vez, entretanto, é diferente: parece que algo foi arrancado dele com brutalidade, e só sobrou um buraco tão vazio em seu peito que suga tudo ao redor, transformando-o em alguém que carrega um vácuo de pura tristeza e angústia dentro de si, a ponto de fazê-lo duvidar que seja possível algum dia sentir-se completo de novo. Sente que o que perdeu nessa madrugada de domingo foi sua própria vida, e mesmo assim, ainda tem forças para continuar na ligação e ouvir a voz de sua mãe, embargada pela emoção e preocupação com o único filho:

Estamos indo aí, meu bem, então nos espere, 'tá bom? Seja qual for o problema, nós vamos resolver. Juntos.

Yoongi retorna ao apartamento para esperá-los, fazendo questão de se manter longe da sacada. Não recolhe as latas de cerveja ou a garrafa de vinho do carpete, na verdade não mexe em nada nem mesmo para fingir para os pais — não faz mais sentido deixar seu apartamento apresentável, então apenas larga-o como está, abandonado e cheio unicamente de solidão e melancolia, assim como seu dono. Ele suspira, se perguntando o que vai fazer agora e de onde vai tirar forças para seguir em frente, sendo que o fato de não ter um objetivo concreto ou sonhos que queira realizar deixa-o absolutamente perdido. Não é vida se não há prazer em nada, e ele sabe muito bem o quão desesperador é viver mergulhado em apatia, fazendo coisas que não quer fazer, simplesmente porque não há nada que realmente queira. Então como conseguirá driblar todos estes sentimentos para ter vontade de continuar vivo, ao invés de apenas existir - ser mais que alguém que respira e tem o coração batendo; ser mais que alguém que come, se droga, dorme e, às vezes, assiste à filmes de comédia de caráter e qualidade duvidosos na Netflix, para rir um pouquinho antes de se lembrar de como sua existência é inútil —, como conseguiria ignorar o mais profundo pesar de seu peito? Uma frase ecoa em sua mente, uma voz da qual não se lembra, dita pelo dono de um rosto que começou a se esquecer: às vezes, o simples fato de existir exige uma válvula de escape.

Eu Sou Alice • {yoonseok}Where stories live. Discover now