Cicatriz

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Senhora Kim me seguiu escada acima e no quarto fez tudo o que podia para ter certeza de que eu estava bem.

- Não está sentindo nenhuma dor?

- Não.

- Cansaço?

- Não.

- Tontura? Enjoos?

- Não.

Ela pediu que eu tirasse o casaco para medir minha pressão. Assim o fiz, mas logo que tirei notei que seu olhar pousou sobre a cicatriz que possuo no braço direito. Ela se estende na parte de dentro do meu braço, um pouco abaixo do ombro até próximo o cotovelo. Não é feia, mas é bem visível. Ela ficou assim por um tempo e aquilo estava me incomodando um pouco.

- Algum problema?

- Não, nenhum.

Ela mediu minha pressão e virando-se de costas para mim disse:

- Desculpe, mas o que é essa cicatriz em seu braço?

- Ah? Isso? – passei minha mão sobre a cicatriz. – Meu pai diz que a ganhei enquanto corria de bicicleta. Desequilibrei-me e caí sobre ela que raspou forte em meu braço. Foi assim que a consegui.

- Entendo.

- Mas por quê? Algum problema nisso?

- Não, não. Está tudo bem.

- E a minha pressão.

- Está ok.

- Obrigada mais uma vez.

Vesti novamente o casaco, ela sorriu em retribuição e naquele sorriso eu me sentia confortada como há muito tempo não sentia. O conforto de ter uma mãe. Descemos e ela então se despediu de nós. Assim que ela saiu sentei-me em uma cadeira, com a cabeça apoiada nas mãos, em cima da mesa.

- A senhora Kim é uma ótima pessoa.

- É sim. Meu amigo tem a quem puxar. – Boo falou tirando algumas coisas de dentro da geladeira.

- Estou louca para conhecer seu amigo.

- Ele também quer conhecê-la. Com fome?

Eu apenas assenti e ele começou a fazer torradas.

- Boo... - Eu comecei – Tenho uma pergunta para fazer, mas estou meio sem jeito.

- Por favor me chame de Seungkwan. Chamando-me de Boo parece formal demais e não estou acostumado com isso.

Ele sorriu e eu também.

- Mas só se você parar de me chamar de Sanders.

- Combinado! O que você gostaria de perguntar?

- Foi você quem trocou as minhas roupas?

Ele hesitou por um momento e depois de pôr as torradas na torradeira, virou-se para mim.

- Foi sim. Elas estavam congeladas e fiquei com medo de que você não se aquecesse com elas, por isso as troquei.

- Se você me trocou deve ter notado um hematoma na minha barriga?

- Sim.

- Sabe o que aconteceu?

- Para ser sincero não. Você não faz ideia do que seja?

- Não. Antes de sair de casa naquela noite tenho certeza de não possuía esse hematoma.

- Estranho. Mas aconteceu algo antes de você sentar naquela árvore?

- Não que eu me lembre.

Mas depois de dizer isso me lembrei de que havia perdido a consciência sem mais nem menos, logo que me sentei, porém não disse isso a ele. Ele poderia achar mais sinistro ainda. Fiquei encucada e muito desconfiada.

"O que poderia ter acontecido?"

Continuava constrangida e com vergonha de olha-lo por saber que um desconhecido havia me visto seminua. Quase como se soubesse como me sentia ele declarou:

- Desculpe-me se a constrangi, de alguma maneira, não foi minha intenção só queria que você ficasse bem.

- Tudo bem não precisa se desculpar. Você fez o que foi preciso para me salvar e eu sou grata demais por isso. Mesmo que eu ache que minha vida não vale todo o esforço que você está fazendo.

Minha última frase saiu como um sussurro e, apesar de achar que ele não tinha ouvido, ele falou:

- Como assim?

- O quê?

- Como sua vida não vale o esforço?

- É complicado.

- Tem a ver com você indo parar na neve sozinha e no meio da noite?

- Talvez?!

- Tudo bem não vou te forçar a me explicar. Vou esperar quando você estiver pronta para me contar.

- Obrigada.

As torradas logo ficaram prontas e ele me serviu uma enorme xícara de café com leite quente.

- Isso está uma delícia! – falei com a torrada na boca e o queijo derretendo de dentro dela.

- Obrigado!

Ao agradecer ele se inclinou sobre a mesa passando os dedos no canto da minha boca. Aquele gesto me causou um arrepio, que me retrai assustada. Contatos íntimos com outras pessoas não são meu forte e ele estava se aproximando demais.

- O que está fazendo?

- Tirando o queijo.

Ele mostrou que era realmente o que estava fazendo e eu não falei mais nada. Porém ele deve ter notado o quanto me assustei e porquê fui rude com ele, mas não disse uma palavra sequer a esse respeito. Terminamos o café em silêncio. Eu me ofereci para lavar a louça e ele assentiu. Enquanto executava a tarefa, ele continuou sentado me observando.

- A senhora Kim disse algo para você?

- Tipo o quê?

- Se você estava bem ou não?

- Ah sim. Eu estou bem sim.

- Que bom.

- É.

- Posso fazer uma pergunta?

- É claro.

- O que você fazia sozinha àquela hora da noite no meio do nada?

Eu pensei em como responderia a isso, mas não foi preciso. Senti-me aliviada quando alguém bateu na porta. Seungkwan foi ver quem era e eu olhei para fora. A neve caia de forma contínua, porém mais fraca. Não demorou muito ele voltou.

- Algum problema?

- Preciso ir até a casa da senhora Kim. Você se importa de ficar um pouco sozinha?

- Não tudo bem. Pode ir tranquilo.

- Ótimo. Mais tarde estou de volta.

- Ok!

Ele subiu pegou uma mochila e saiu. Eu estranhei um pouco, mas não dei muita bola. Sem nada para fazer, liguei a televisão e me perdi assistindo. Já passava das cinco da tarde e nada dele voltar. Estava ficando preocupada. Quando deram oito horas eu já estava em cólicas pensando em tudo de ruim que poderia ter acontecido. Em seguida me levantei depressa sentindo um cheiro forte, familiar, doce e estava cada vez mais perto. Seria... sangue? 

Filhos da Escuridão ↬ Boo SeungkwanWhere stories live. Discover now