I.

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Abelhas Rainhas,
aulas de ginástica e
         chinelos com meia
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Ser um semideus é horrível.

Ótima maneira de começar a narrar minha história, certo?

Acredite, antes de toda essa merda minha vida era um perfeito clichê de garota americana, eu era popular, a maior medalhista do time de ginástica, atriz principal dos musicais escolares e namorava o garoto perfeito. Uma perfeita abelha rainha.

Se esquecermos o TDAH e a maldita dislexia tudo fluía perfeitamente, meus pais comandavam uma gigantesca rede de lojas especializadas em jóias e recebiam mais dinheiro diariamente do que qualquer humano poderia contar sozinho.

Vou contar para vocês como tudo deu um giro de 360 graus.

Estava no corredor quando o sinal soou mostrando o fim das aulas, dispensei as duas garotas que andavam comigo e fui na direção do carro que me esperava. Anton é o motorista das família desde que me entendo por gente, e me levava de um lado a outro desde sempre. Meu pai até deu um aumento salarial pelo tanto de sacolas que ele carrega quando me leva ao shopping.

— Entre no carro, Perdedora. Nós vamos no shopping! — foi o que berrei quando vi Judy, passar.

Judith Stella Underwood é uma garota manca, que usa muletas e roupas completamente fora de moda. Ela ganhou uma bolsa de estudos na Meallan Academy, como? Não sei, nem mesmo sabia que o colégio distribuía bolsas.

— Odeio sua mania de citar garotas malvadas o tempo todo. — o motorista ajudou minha amiga a colocar as muletas no carro e passar as pernas para dentro. — Estou surpresa ter me chamado para compras, achei que Debi e Loide fossem suas amigas de compras.

— Ciúmes delas? Você sabe que mesmo sendo ricas e bonitas que elas sejam, eu gosto de manter conversas maiores do que as monossílabicas oferecidas por elas.

Anton me lançou uma olhadela pelo retrovisor, me repreendendo silenciosamente.

— Limpa aqui. Acho que o veneno começou a escorrer.

Acabei revirando os olhos de forma teatral, Judy podia ser a garota menos favorecida de toda a academia, porém sempre sabia como manter uma conversa fluída, um apetite sem fim e manias adoráveis - essa última parte eu jamais falarei para ela, nem sob tortura. Ela odiava ir comprar coisas comigo, talvez o fato de sempre ter ajudar a carregar minhas sacolas.

Sim, eu uso minha amiga deficiente como cabide ambulante. Me julgue.

— Hoje nós vamos fazer algo diferente, meus pais não vão poder ir no ensaio de ginástica rítmica, então você foi a escolhida para gravar minha apresentação com as fitas e fazer a narração, depois eu mando pra eles.

Ela se animou sob a perspectiva de um outro compromisso que fosse diferente de carregar sacolas, pobre garota, mal sabe que vamos ao shopping quando terminar-mos.

Hi hi.

O caminho para o ginásio onde sempre treinei foi rápido, corri para dentro dele sem esperar o motorista tirar minha amiga de dentro do carro. Meu treinador me mataria caso eu chegasse só meio minuto atrasada. Quando sai do vestiário, já usando um collant, Judy arrumava a câmera em uma boa posição, apoiando o objeto na própria mochila.

Acenei na direção da câmera, mandando beijos que meus pais receberiam futuramente. Era estranho estar ali sem nenhum deles, geralmente eles revezavam para me verem dançar, quase como uma tradição familiar.

Por mais estranho que pareça, os Beauregard não faziam o tipo “pais ricos e negligentes”, na realidade eram bem presentes, as vezes presentes até demais. Como quando apareciam os dois na porta da escola, insistindo em usarem apelidos ridículos comigo.

As fitas nas minhas mãos formavam floreios bonitos e delicados conforme eu as mexia, a coreografia lenta, mas complicada de fazer requeria concentração total. Ginástica sempre seria minha maior paixão, a dança, atuação e o canto também. Sentia como se tivesse nascido para fazer essas coisas.

Pelo fato de ser diagnosticada com imperatividade desde os 6 anos, os Beauregard resolveram arranjar uma boa maneira de gastar minha energia em aulas variadas, de esgrima à tecido artístico. Confesso que sempre preferi as coisas ligadas à arte.

Palmas isoladas ressoaram na acústica do lugar, as três pessoas presentes pareciam satisfeitas com a apresentação, sorri orgulhosa.

Sempre fui a melhor e sempre soube disso.

— Próxima parada? — Judy perguntou, encostando no box do banheiro no qual tomava banho.

— Praça de alimentação, lojas e sorveteria depois. — respondi secando os ombros e colocando um dos vestidos guardados no armário.

Ela concordou, parando frente ao espelho do lugar para ajeitar os cabelos cacheados e volumosos dentro de um boné amarelo estranho. Deus, devo ter espaço no céu reservado só de conviver com uma criatura que combina um chapéu desses com calças jeans largas e moletons enormes.

O que falta para completar a desgraça? Usar crocs? Chinelos com meia? É isso, eu deveria ganhar um prêmio apenas por aguentar as breguices alheias, já dizia o ditado popular.

Quem me dera a pouca noção de moda de Judith fosse meu maior problema. Devo alertar, a partir desse momento as coisas vão de ladeira abaixo.

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  Eai, o que acharam do capítulo?

Eu sei que ficou meio curto e bastante parado, mas juro juradinho que no próximo as coisas se agitam.

Se alguém leu até aqui, não esqueça de apertar a estrelinha.



𝐓𝐇𝐄 𝐄𝐈𝐆𝐇𝐓𝐇 𝐂𝐀𝐍𝐃𝐋𝐄 ▪ LEO VALDEZOnde as histórias ganham vida. Descobre agora