Capítulo 18 - Pra Tudo Há Uma Primeira Vez

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"Ando fazendo coisas que não eu não deveria fazer"
I'm a Ruin - Marina

•••

Eu vinha conversando com um rapaz, que era apenas 1 ano mais velho que eu. Jean era o nome dele.

Eu não botava muita fé que iria rolar algo entre a gente, pois ele morava em outro município, apenas vinha para Recife a trabalho e faculdade. Mas, numa tarde de domingo, eis que ele me chama para nos encontrarmos, ele viria a Recife comprar um presente para o pai dele, e perguntou se eu gostaria de encontrá-lo no shopping. Eu aceitei, enquanto isso, mais uma vez eu inventava uma desculpa qualquer para Adriel.

Bruno
Adriel, estou indo com minha prima no Shopping Guararapes, vamos passear um pouco, devo chegar somente a noite tá, beijos.

Enviei a mensagem e não esperei pra ver a resposta, já estava de saída. Sinceramente, eu não estava afim de sair naquela tarde, primeiro por estar um pouco cansado do trabalho da semana, e segundo por ainda não colocar muita fé naquele rapaz. Será que ele viria mesmo?

Bem, a prova veio quando eu cheguei no local marcado. Era a estação de metrô que interligava ao Aeroporto.

Ele pediu para eu esperar no terminal integrado enquanto ele chegava, não demorou 5 minutos e ele desceu do ônibus em uma parada próxima. Era um pouco mais alto que eu, e usava óculos, tinha uma beleza comum e um corpo esbelto, mas não era malhado.

- Oi Caio, prazer sou o Jean.

Ele estendeu a mão pra me cumprimentar, eu já estava começando a ficar confuso entre o meu nome e os nomes falsos que eu inventava.

- Oi Jean, tudo bem? Fez uma boa viagem?

- Fiz sim, Graças a Deus.

Jean era evangélico. Como eu sei?

Digamos, que ele me falou o nome da empresa que ele trabalha, quando a gente estava conversando. Então eu fui pesquisar sobre a empresa no Instagram e percebi que não tinha muitos seguidores e que a conta era relativamente nova, não tinha nem 6 meses.

Então, enquanto eu deslizava a lista de seguidores, eis que vejo uma foto de Jean, que na verdade se chamava Fernandes, a partir daqui vou passar a chamá-lo assim.

Fernandes tinha o perfil aberto, e era um rapaz que não postava fotos com muita frequência, mas fazia muitos stories. Foi deslizando as fotos, que eu vi que Fernandes era um rapaz evangélico, de uma denominação muito rígida e conservadora. Tinha várias fotos na igreja, e alguns pequenos trechos de vídeos em que ele fazia cantava na igreja, ou algo do tipo.

Mas em momento algum eu o julguei, afinal, eu também era de uma família conservadora e evangélica. Quando conheci Adriel, eu ainda estava na igreja e demorou 3 meses para eu sair, por conta de alguns compromissos que eu tinha.

Eu tinha que sair. Entre assumir a minha sexualidade, e continuar na igreja me reprimindo, eu escolhi sair e viver a minha vida.

•••

Fernandes pediu um Uber que nos levou ao Shopping Recife. Em certo momento da viagem, ele pegou na minha mão e entrelaçou os dedos nos meus. Meu coração palpitou na hora, e não era nada bom, era medo mesmo.

- Tô te percebendo nervoso? - ele perguntou

- É melhor não, sabe. - apontei sutilmente para o motorista

- Eu não me importo

- É mas eu sim - e tirei minha mão suavemente, depois desse fora intencional.

Ele fez que sim com a cabeça, mas não pareceu se chatear, parecia um bocado contente em me ver.

- Eu realmente gostei muito que você veio, tô muito feliz.

Eu queria poder retribuir a gentileza, mas quanto mais ele falava, mais eu me assustava.

"Ele não tá criando expectativa não né? Tipo, ele é bonito e tal, mas isso não é um encontro amoroso." - eu pensava.

Finalmente o Uber chegou no shopping e nós descemos.

- Não precisa, eu paguei no crédito - ele falou enquanto eu retirava o dinheiro da carteira.

- Jean, não precisava, o certo era a gente rachar. Diz quanto deu que vou te dar a metade.

- Não, você vai guardar essa carteira, senão vou ficar chateado. - ele fez uma cara de falso choro e dobrou os braços.

Preferi não prolongar aquilo e guardei a carteira, entramos no shopping e fomos para a loja Renner. Ele já tinha destino certo ao que parecia, e foi na direção das roupas sociais.

Escolheu uma camisa preta com uns detalhes prateados na gola e também um cinto de couro preto. Enquanto conversávamos, uma atendente veio na nossa direção e perguntou se gostaríamos de ajuda, eu mal consegui puxar o ar pra falar algo, até que ele se interpôs na minha frente.

- Minha filha, não tá vendo que eu já escolhi minhas peças? Sai daqui e para de ser inconveniente.

A mulher pareceu engolir em seco, respondeu com um baixíssimo "sim senhor" e saiu de cabeça baixa de volta para o outro setor.

Eu mal conseguia processar tudo aquilo de uma vez, caramba que situação chata.

- O que foi isso Jean? É o trabalho dela perguntar, você pegou pesado.

- Eu não tenho muita paciência pra isso, por mim, se a gente tivesse alguma dúvida, o certo era irmos ao encontro deles perguntar.

- Mas nunca vai ser assim, vendedores tem que correr atrás dos clientes, ela não estava errada.

- Pois ainda bem que eu não trabalho com vendas, e nem quero. Detesto ficar importunando as pessoas.

Achei tudo aquilo muito exagerado e desnecessário. Na verdade, conforme íamos conversando, eu pude perceber o quanto Fernandes era boçal em algumas coisas que dizia.

O modo como falava da vida e das pessoas que o cercam, fez parecer que ele é aquele tipo de pessoa, que se você falhar com ele uma vez, não terá uma segunda chance.

•••

Quando saímos do shopping, fomos para o ponto de táxi. Eu sentei num banco, enquanto Fernandes olhava o celular, mas pude notar que ele não estava no aplicativo do Uber.

- Caio, você tem algum compromisso agora?

- Não, porquê?

- A gente poderia prolongar um pouco o nosso encontro pra algo mais íntimo, Ta afim?

- Eu sei o que quer dizer com "algo mais íntimo", só não tô muito confortável. Eu sei que é motel, mas no caso seria minha primeira vez.

- No sexo? - ele perguntou assustado

- Não, no motel.

- Sério mesmo?

- Sim, não conheço motel nenhum, nem posso te dar indicação. Normalmente, quando me encontro com caras do Grindr, eles sempre tem local próprio.

- Mas não precisa, eu conheço vários por aqui.

Quando um cara fala assim, me vem a sensação de que ele pegou a cidade inteira, e pensar nisso me deixa nervoso.

- Ah, então quer dizer que o Sr. tem vasta experiência com motéis né? - falei para quebrar o clima.

- Eita, não é isso que você tá pensando não - ele falou entre uma gargalhada - Na verdade eu conheço alguns sim, mas conto nos dedos, não é sempre que eu tô com alguém. Já que eu não posso levar ninguém lá em casa, e como eu não sou assumido, fica difícil estar confiando em qualquer um. Mas eu confio em você, e sei que seria ótimo que a gente prolongasse essa noite.

Decidi não pensar muito, eu estava lá, e já que pra tudo existe uma primeira vez, que fosse hoje então.

Eu aceitei o convite, o que fez um sorriso no rosto dele se formar enquanto chamava o Uber. Se eu tivesse prestado uma melhor atenção naquele sorriso, talvez eu pudesse ter notado que ali se escondia uma segunda intenção.

Nada a Esconder [Concluído]Where stories live. Discover now