Capitulo 04 Parte 3

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Algumas pessoas acham ruim o que escrevo, imagine se elas soubessem o que eu penso.

-André Suhanov

 Parei abruptamente, mas nem que eu estivesse quase tendo um ataque de medo que poderia me matar, eu não mostraria minha face assustada, odiaria que alguém se sentisse no poder de me amedrontar. Me virei e chutei com toda força as partes baixas da pessoa que ainda estava nas sombras, eu não podia nem se quer ver seu rosto. Ele gritou:

- Haaaa, qual é o seu problema? - Encaro a cena de Liam com as mãos no local a qual eu havia chutado. 

- M...as... - Respirei profundamente antes de continuar a falar - O que você queria? Esta de madrugada, estou andando sozinha por uma rua deserta, e sinto uma mão no meu ombro? Eu assisto filmes!

- V-você assiste filmes muito ruins. - Disse ele, ainda gritando de dor.

-  Não chutei tão forte! - Pestanejei.

- É por que você não esta sentindo! - Retrucou frustrado.

- O que você deseja desconhecido irritante? - Eu sabia quem ele era, só não quis dar o prazer.

-A vodca! - Disse rapidamente.

-Não! - Descordei, também rapidamente.

-Então vamos dividir ou volto para a festa e falo quem roubou a ultima bebida! - Pensei muito sobre aquilo, afinal, não estava muito animada em ser caçada por um monte adolescentes rebeldes por causa de álcool, então aceitei a proposta.

-Idiota! - Deixei escapar com um pouco de intenção.

-Obrigado. - Respondeu cômico.

Estávamos andando pelas ruas de nossa pequena cidade no interior, ele andava um pouco desajeitado ainda:

- Abre a garrafa. - Falei. Começamos a conversar depois de ficarmos brigando um pouco pelo o chute que dei nas... Coisas dele.

- Deve ter um motivo pelo qual estamos nos agredindo por uma garrafa de vodca, ou melhor você! - Não respondi. 

- Me fala qual a sua historia triste?. - Pediu Liam com um olhar indecifrável.

- Não! - Minha voz saiu como se estivesse me defendendo de uma acusação judicial.

-Por que não? - Questionou.

- Não gosto de ser o centro dos cochichos da cidade.

-Não vou contar a ninguém. - Falou meio ofendido.

- E como vou ter certeza? - Perguntei apreensiva.

-Nós falamos tudo o que nos aprisiona, e se um de nos falar o segredo, o outro também dirá. Então ambos não falaram. - Admito que estava propensa a aceitar a segunda proposta naquela noite, era um recorde!

-Promete? - Sibilei.

-Prometo! - Respondeu com um olhar convincente.

- Você primeiro! - Ordenei.

-Eu perguntei primeiro. - Tentou Liam.

-E eu depois, fala logo! 

- Como desejar! Eu recentemente sai do time de futebol. 

-Serio? futebol só isso? 

- Acalme-se, não terminei! - Falou levemente. - Eu deixei o futebol, mas meu pai não aceita minha decisão, ele quer que eu viva, a vida que ele não teve a chance de viver. Sua vez!

-Ok, eu vim nessa festa por que minha mãe deve estar fazendo sexo com mais um de seus namorados, e eu não quero ver nem ouvir isso. - Disse como se já tivesse imaginado contar isso a alguém milhões de vezes.

- Minha mãe morreu.-Ele pegou a garrafa e tomou um enorme gole.

E logo depois continuou.

-Depois disso meu pai começou a ter alguns problemas.- Ele observava o completo nada a sua frente.

-Meu pai também morreu. - Disse, sem uma razão logica. - Acidente de carro. - Completei.

-Minha irmã vai fazer oito anos amanha, meus irmãos e eu fizemos uma "Vaquinha" e conseguiremos fazer uma festa para ela. - Foi a primeira vez que o vi sorrir.

-O que é triste nisso? - Me precipitei. 

-Meu pai não lembrou do aniversario dela, e nem de nenhum dos meus irmãos. - E então o sorriso se desfez com tal facilidade como se havia formado.

A garrafa foi para mãos dele, e continuo assim, nos dizíamos alguma coisa triste sobre nossas patéticas vidas e em seguida bebíamos um pouco.

- Não tenho amigos. - Falei casualmente.

-Nenhum?

- Ninguém quer ser amigo de uma pessoa que questiona a própria vinda ao mundo. - Suspirei e voltei minha atenção a garrafa, e então depois de uma pausa, ele falou:

- Eu tenho varias pessoas ao meu lado, mas nenhuma delas considero meus amigos.

- E sua irmã, seus irmãos? - Questionei.

-Eles são sangue do meu sangue, e os amo, porém acho que eles somente ficam perto de mim por que são obrigados, se não fossemos ligados pelo sangue, seria o oposto.

- Por que não considera ninguém seu amigo? - Talvez fosse uma pergunta muito intima, entretanto deixei que ele tomasse a decisão de responder ou não.

- Não sou do tipo que fala sobre coisas normais, ou é normal. 

-Bem vindo ao clube. - Falei, pensando alto.

-Meu pai morreu em um... - Iniciei. Entretanto logo fui interrompida.

-Você já disse isso.

-Eu sei! Mas a unica coisa que eu não contei é que eu... - Respirei, e continuei como se esvaziasse o copo da minha alma que estava prestes a transbordar.

- Eu estava no banco de trás quando aconteceu. O carro surgiu de repente. Tinha muito sangue, estava por todos os cantos. O pior é que eu só fiquei ali parada. Ele estava com um pulmão perfurado, foi o que os médicos disseram. Ele estava se afogando em seu próprio sangue. - As lagrimas ameaçaram cair, mas não deixei.- Sua voz estava quase impossível de ouvir, mesmo assim consegui decifrar. "Você está bem?" ele disse, enquanto estava praticamente morto. Os olhos se fecharam rapidamente. Tudo aconteceu muito rápido. Eu não disse nada, eu só...assisti.- As palavras sairão lentamente. - Não consigo esquecer.

Liam não pronunciou um ruido se quer, apenas me passou a vodca. Talvez isso fosse minha fascinação, ele não tinha pena de mim. E mesmo com o seu jeito conseguiu tirar mais coisas do que os inúmeros psicólogos.

 Nos despedimos.

Cheguei em casa e a unica coisa que ouvia era minha mãe e qualquer pessoa na cama, fui direto para o meu quarto e coloquei os fones de ouvido no máximo. De algum modo me senti mais leve depois de falar com ele, como se falar ajudasse, eu só escrevia em um diário (Ainda escrevo), mas havia sido diferente. Liam foi o tema dos meus textos naquele dia ( Em vários dias na verdade) apesar de estar um pouco alterada, consegui entender tudo no dia seguinte quando não lembrava nem como cheguei em casa, sempre faço isso quando bebo ou quando estou sóbria, para depois pensar sobre o que aconteceu. O engraçado é que escrevi cada detalhe, fala por fala,tenho uma memoria boa até quando estou bêbada! Sempre achei isso um dom. Um dom maluco. Mesmo assim, um dom!.

[Continua]

8 Anos Where stories live. Discover now