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Tenho passado bastante tempo trabalhando, mais do que o necessário, tudo para evitar o Aidan, evitar meus amigos, evitar ficar em casa e lembrar da dor novamente. O trabalho me distrai, é o que estou fazendo, me distraindo o máximo possível, todo momento que fico sozinha eu choro, e não posso recair novamente, não quero ter que reviver a dor novamente. Faz algumas semanas que não falo com Aidan, e nem quero falar, nem com ele nem com ninguém, muito menos com Daniel, que tem tentado conquistar meu perdão.

Eu sei que se eu falar com Aidan, terei que lidar com a dor dele também, e não quero fazer isso, estou poupando nos dois, ele de lidar com a minha dor e eu de lidar com a dele, não posso ver o Aidan sofrendo, eu sei que ele está péssimo, Isabela me contou, e por isso mesmo não quero vê-lo, posso estar sendo egoista, mas eu não tenho como vê-lo sofrendo, se eu precisar terminar com ele para parar de sofrer é o que eu farei.

Eu permaneço acordada, estou fazendo plantão na emergência. Cole tem tentando falar comigo também, e ele é um dos mais difíceis de evitar já que ele trabalha comigo. Mas dou meu jeito.

Eu saio da minha sala e caminho até a cafeteira, Cole para em meu lado, não dou muita bola, pego meu café e procuro o adoçante, sei que ele vai vir com a lição de moral desgastante dele.

- Como o Aidan está?

- Não sei - Acho o adoçante que está aparentemente vazio. Cole está com o adoçante cheio na mão. - Pergunta pra ele - Tento pegar o adoçante mas ele tira de meu alcance.

- Achei que era namorada dele. - Eu coloco uma mão dentro do bolso da calça e suspirou. - Achei que...

- Achou errado - Eu o interrompo - Você é ninguém tem o direito de opinar sobre como eu estou lidando com a MINHA perda, você não tem nada haver com isso.

- Sua e do Aidan - Eu reviro os olhos - Todos nós entendemos que você está triste, tenta nos entender, tenta entender o Aidan... Você não está sozinha, tem amigos que se preocupam com você.

- Tentar te entender? Fui eu quem perdi um bebê, fui eu que gerei e fui eu quem perdi ele, isso não é na conta de nenhum de vocês tá legal? - Eu estendo a mão e ele me entrega o adoçante.

- Se sente culpado.

- Eu não me... Não me sinto culpada, para de se meter na minha vida! - Eu me afasto dele e entro em minha sala, sento em minha cadeira e ponho o adoçante no café. As lágrimas preenchem meus olhos, mas me contenho, respiro fundo e volto a atenção para o computador.

Eu preciso muito beber.

Falta vinte minutos para dar seis horas. Eu aguardo encarado o relógio de ponteiro na parede da minha sala, quando o relógio alcança o número eu me levanto e recolhe minhas coisas. Saio do hospital o mais rápido possível e caminho a pub mais próxima.

Preciso esvaziar a cabeça, nas semana seguinte que perdi meu filho eu sangrei de novo, o médico disse que o meu corpo estava expelindo o feto e que eu deveria fazer uma cirurgia para tirar os restos dos resíduos, disse que eu havia provocado o aborto já que tinha mais de 22 semanas.

Não consegui fazer.

Estou me sentindo tão vazia, tão culpada, acho que prefiro morrer. Não sei que mais sentindo faz viver se carregarei a culpa, essa culpa dentro de mim. A culpa de ter matado meu filho tão desejado. Sei que tenho que superar, mas é mais difícil que parece, acho que nunca irei superar.

Me pego a maioria da parte do tempo olhando os sapatinhos que Aidan tricotou para o bebê, são minúsculos. Eu choro, fico olhando as chupetas, as roupinhas e guardo novamente. Nada tem sentido pra mim. A culpa foi minha. Não quero olhar o Aidan e dizer que essa dor que ele está sentindo é minha culpa.

Estou sofrendo, eu sei, e não suporto ter que ouvir de outras pessoas que tenho que pensar nos outros, eu perdi meu filho, eu perdi meu bebê. Eu não quero conversar.

Eu viro meu décimo quinto copo de bebida. Vejo um homem se aproximar. Pergunta-me se estou sozinha, eu concordo sem muita consciência de nada, ele puxa papo comigo, eu ignoro, bebo o resto da cerveja e continuo o ignorando.

- Eu tenho namorado - Eu respondo sem paciência.

- Não sou ciumento - Olho ele de cima abaixo e volto a beber minha bebida. - Você quer ir lá em casa? Dar uma passadinha? - Eu olho para meu copo e passo o dedo pela boca do copo. - Uhm? Eu te levo pra casa... - Ignoro os restos de suas palavras. Me sinto fraca demais para responder algo.

Eu só quero morrer. Eu desisto.

Me levanto da cadeira após pagar a conta, pego minha bolsa e saio do bar, tento achar o caminho de volta para casa, minha visão está embaçada, seguro com força na mão direita e chego em casa, não consigo achar a chave, me sento na escada e encosto a cabeça na porta. E choro.

Sinto um homem se aproximar, não vejo quem é, eu berro, esperneio, e grito que tenho um namorado, ele ignora, me puxa e me leva. Quando acordo estou com dor de cabeça, dentro da minha casa, olho em volta e vejo Aidan na cozinha. Pisco algumas vezes e tento me levantar, estou bebada demais pra isso. Desisto, tento pegar meu celular mas Aidan chega na sala, ele está com um boldo na mão, passei tempo demais do lado de fora com a chuva caindo sobre mim, estou molhada, e espirrando.

Ele aproxima uma colher de minha boca e eu me afasto, procuro minha bolsa e está no chão. Ele sorri para mim e beija minha testa.

- Está com 38 de febre, toma a canja meu bem. - Ele aproxima a colher de minha boca e eu tomo dessa vez, depois que chega na metade ele coloca a sopa sobre a mesinha de centro, tira minha camisa molhada e minha calça. Eu suspiro e ele me cobre com a coberta.

Eu durmo por umas três horas, quando acordo Aidan está do meu lado, está lendo um livro, seus óculos estão um poucos sujos, observo sua roupa casual, ele está com uma blusa branca e uma calça preta. Eu me sento no sofá e ele olha para mim e sorri fraco. Eu praticamente me jogo sobre ele, beijo seu rosto e ele me puxa com força para seu colo, me beija por inteira.

- Eu te amo - Ele diz e eu encosto minha testa na sua. - Eu te amo muito meu amor, muito. Vamos superar isso juntos, tudo bem? - Assinto e ele beija meu nariz. Ele olha para os sapatinhos pequenos na mesinha de centro e eu pego eles com um pouco de dificuldade.

- Ficaram lindos... - Ele sorri e eu mordo o lábio inferior. - Me desculpa, eu não queria ver você sofrendo. - Ele tira o cabelo de meu rosto e joga para trás da minha orelha. - Eu sou louca por você, eu te amo e... Eu não consegui lidar com isso, me desculpa.

- Tá tudo bem - Ele beija meu nariz e eu concordo. - Vamos fazer isso juntos. - Eu concordo e olho para os sapatinhos de tricô.

- Podemos dar emoldurar. - Ele sorri e concorda. - Vamos... Emoldurar. - Eu deito a cabeça em seu peito e ele faz cafuné em minha cabeça. - Como você está? - Eu pergunto e ele dá os ombros.

- Estou mal, mas eu sei que você também está, sei que está se sentindo culpada, eu sei que dói... Mas vamos resolver meu amor, vamos superar isso juntos, vamos sofrer juntos, ok?

- Tá bom

- Então não vai me evitar por quatro semanas não é? - Eu concordo e beijo ele. - O que quer fazer?

- Podemos tirar uma semana para nos, passear, podemos ir com a Maria também... O que acha? - Ele concorda e me abraça beijando meu pescoço. - Eu senti sua falta.

- Eu senti mais - Ele me puxa para um beijo e eu sorri o abraçando novamente.

Um amor puroOnde histórias criam vida. Descubra agora