Capítulo 1

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Eu estava deitada sobre uma superfície áspera e fria, embora o local também estivesse gélido. Empenhei-me a levantar e analisar o ambiente, com a esperança de encontrar algo ou alguém familiar, mas estava muito escuro e eu não conseguia enxergar nada. Ao pressionar a palma de minhas mãos no chão, senti dores inquietantes em diversas partes do meu corpo. Talvez eu realmente não conseguisse ver, pensei. Havia cacos de vidro sobre a pele da minha perna esquerda e grande parte da minha cabeça encontrava-se em um latejar contínuo. Em outra tentativa falha, não consegui retirar os cacos e a dor aumentou gradativamente. Resolvi, então, esperar ali, o que quer que fosse. Àquela altura, eu já não sabia o que era certo ou errado, quem eu era, nem mesmo lembrava o meu nome, muito menos de como fui chegar ali ou o que "ali" era. Mas de repente, como um sinal, pude ver uma única luz, forte, juntamente com um ruído, que preencheu o mar de silêncios que me envolvia. Era um som conhecido e estava muito distante. À medida que se aproximava de mim, reconheci-o, era o som de passos.

Entrei em desespero, sem poder saber se aquele era um bom sinal, se quem estivesse chegando até mim pudesse me salvar. Então, em uma fração de segundo, os passos cessaram bem próximos da minha face. A pessoa se agachou, obstruindo a passagem da luz e levou a sua mão direita a mim. De imediato, pude sentir os batimentos bruscos do meu coração. Foi nesta hora que eu acordei.

Era um pesadelo. Só poderia ser. Mais uma vez, o mesmo, em uma noite, preenchendo a minha mente enquanto ganhava na batalha contra os meus sonhos clichês. Eu ainda tinha dúvidas, se era ou não pesadelo, porque não me aterrorizava. Eu não acordava assustada no meio da noite com medo de pegar no sono de novo e voltar para aquela mesma situação. Aquele sonho pedia mais. É como se fosse um livro cuja página final e mais emocionante tivesse sido arrancada. Embora não saibamos se é ruim ou não, se vai partir nossos corações ou se vai nos fazer apaixonar pelo todo e colocar aquele mesmo livro na nossa lista de livros preferidos, ou até mesmo se vai ser apenas um final sem graça. Aquele final é essencial e enquanto não o obtemos, não nos cansamos. É por essa razão que meus olhos estão aterrorizantemente cheios de olheiras. No dia do meu aniversário de dezenove anos.

Embora não goste de demonstrar isso, eu adoro comemorar aniversários e sendo assim, acordei mais animada do que o usual para ir à universidade. De certa maneira, tudo parecia estar diferente. Verifiquei como estava o clima da janela do meu quarto. Era verão e o tempo estava bem aberto. Eu amava ficar olhando aquela paisagem.

Apesar de morarmos em uma cidade grande, Brasília, a minha casa, ou melhor, a casa dos meus pais, de dois andares, possui uma vista para um grande parque da região, o que proporciona a nós uma sensação de tranquilidade em meio ao dia a dia corrido e traz lembranças da minha simples cidade natal e dos meus pais. Eu os ajudei a escolher a casa e pedi que um dos quartos que tivesse a vista para o parque, fosse o meu. O meu irmão mais novo, nascido aqui, não se importa tanto para esse detalhe significativo para nós e por isso nunca discutiu a ideia de trocarmos de quarto.

Meu quarto, assim como todos os outros cômodos da casa, é grande. Eu me lembro de que um dos tópicos mais importantes na escolha da casa para minha mãe era que ela fosse grande, seria uma forma de compensação, já que todas as outras casas e apartamentos que tínhamos morado eram pequenos. Outra atividade que ela fez questão de monitorar foi a escolha do revestimento da casa, que ficou todo baseado em tons claros. O meu quarto, por exemplo, foi todo revestido com uma pintura branca, contra a minha vontade. Sempre gostei de ambientes com cores mais vivas, mas de certa forma a agradeço por tê-lo deixado dessa forma, assim posso decorá-lo à minha maneira, colocando pôsteres, quadros e luzes nas paredes. Os móveis, também brancos, foram dispostos harmoniosamente pela área, suportando objetos diversos coloridos com que eu me identifico. Mas o que mais ocupa espaço no meu quarto são os meus instrumentos musicais, é o que eu mais amo nele.

A garota do tênis brancoWhere stories live. Discover now