Capítulo 17

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Eu estava deitada sobre uma superfície áspera e fria, embora o local também estivesse gélido. Empenhei-me a levantar e analisar o ambiente, com a esperança de encontrar algo ou alguém familiar, mas estava muito escuro e eu não conseguia enxergar nada. Ao pressionar a palma de minhas mãos no chão, senti dores inquietantes em diversas partes do meu corpo. Talvez eu realmente não conseguisse ver, pensei. Havia cacos de vidro sobre a pele da minha perna esquerda e grande parte da minha cabeça encontrava-se em um latejar contínuo. Em outra tentativa falha, não consegui retirar os cacos e a dor aumentou gradativamente. Resolvi, então, esperar ali, o que quer que fosse. Àquela altura, eu já não sabia o que era certo ou errado, quem eu era, nem mesmo lembrava o meu nome, muito menos de como fui chegar ali ou o que "ali" era. Mas de repente, como um sinal, pude ver uma única luz, forte, juntamente com um ruído, que preencheu o mar de silêncios que me envolvia. Era um som conhecido e estava muito distante. À medida que se aproximava de mim, reconheci-o, era o som de passos.

Entrei em desespero, sem poder saber se aquele era um bom sinal, se quem estivesse chegando até mim pudesse me salvar. Então, em uma fração de segundo, os passos cessaram bem próximos da minha face. A pessoa se agachou, obstruindo a passagem da luz e levou a sua mão direita a mim. 

Nanda!?! Era a voz de Hugo. O que você está fazendo aqui? Eu falei que não queria mais você.

Posso dizer que dos piores pesadelos que tive nos últimos meses, esse era o que mais machucava. Não via Hugo há alguns dias, ele não se afastou só de mim, se afastou dos nossos amigos e da banda. Mas de certa forma, parte de mim não queria vê-lo por um tempo. Às vezes tempo é o que mais precisamos. Às vezes só precisávamos parar tudo um pouco, pensar e cuidar de nós mesmos. Acho que todos nós precisamos de algo que nos recarregue. Para mim, recarregar as energias significava tocar, cantar, escrever e viajar, por isso ficava insistindo com os meus pais para irmos para a fazenda dos meus avós num final de semana. Preciso de um contato com a natureza, preciso sentir o sol, o vento e as águas da vereda, como nunca faço. Mas eles nunca têm tempo. Recarregar as energias para Eduarda era tirar um dia off para dormir, ler livros e cuidar da pele. Para Danielle, não faço a mínima ideia, mas acredito que seja festejar e agora passar mais tempo com o Gabriel. Para Carol, era estar com os amigos e o namorado e com certeza ter mais tempo para Deus.

Não estava passando bem hoje, então pedi à minha mãe que faltasse à aula da parte da manhã e ela nem chegou a contestar, já que sabia que há dias eu não estava bem.

— Mas você vai trabalhar? — ela perguntou enquanto eu estava tomando café. Assenti.

De repente o carro de Danielle para na porta de casa. Estava tocando Bad Blood da Taylor Swift.

— Eu avisei a Dan que não ia para a aula... — comecei a ir em direção à porta um pouco irritada, mas minha mãe me parou.

— Ela sabe. Vocês vão para outro lugar. — Disse rapidamente, revelando um sorriso gentil nos lábios. — Vá buscar a sua bolsa e leve isso. — Ela me entregou uma vasilha com alguns cupcakes.

— Eu amo vocês! — abracei-lhe e logo subi para o quarto para buscar a bolsa.

No carro estava Danielle, Carol e Eduarda, minhas melhores amigas. A ideia era fazer um piquenique em um dos parques da cidade, que não era o que ficava na frente da minha casa. Elas disseram que eu precisava de novos ares.

Eu nem tinha colocado na minha lista mental, mas uma das coisas que mais me recarregava a energia era estar entre os meus amigos. As garotas não tocaram em nenhum assunto relacionado ao Hugo ou aos seus namorados ou nem nada do tipo, só falamos de nós, dos nossos sonhos, das viagens e de coisas de garotas, como maquiagens, penteados e roupas. Danielle tinha colocado para tocar uma playlist em seu celular, mas não eram as músicas que ela gostava, eram músicas calmas, que em sua maioria eram desconhecidas por mim, até que começou a tocar uma música importante: Finally // Beautiful Stranger da Halsey. Ao ouvi-la comecei a sorrir, porque essa música já não me fazia pensar em Tiago, mas em Hugo. Na mesma hora, percebi que tinha um instrumento em minhas mãos totalmente mágico e inutilizado: a máquina de músicas. É claro que entrar na máquina era algo que sempre estava em meus pensamentos, mas ficava pensando no que Hugo dissera, que não se pode ficar mexendo com o tempo, que tinha que ser cauteloso, mas essa era uma emergência, uma grande emergência interna.

A garota do tênis brancoWhere stories live. Discover now