Capítulo sete - Primeiro Ataque

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Hikari foi a última a chegar à cozinha. Lá, encontrou todos já sentados ao redor da grande mesa retangular, jantando. A comida fora comprada por Sofie em um restaurante das proximidades. Para Hikari, isso não era surpresa... Poderia contar nos dedos as vezes em que sua mãe se dispusera a cozinhar. Não que cozinhasse mal, pelo contrário, saia-se bem preparando pratos simples da culinária francesa ou mesmo massas... Mas não tinha muita paciência para isso. Hikari podia dizer, sem exagero, que era uma “cria de fast-food”.
Em silêncio, puxou uma cadeira e sentou-se.
O jantar prosseguiu, num clima de tensão, onde ninguém pronunciava uma única palavra. A jovem Guardiã de Áries percorria os olhos pelos demais ali presentes. Se Sofie falava a verdade quando dizia que sua equipe era unida e nutria uma sólida amizade, era notório que o mesmo não se repetia na atual geração de Guardiões.
Sofie foi a primeira a terminar o jantar, pedir licença e levantar-se. Hayato logo se apressou em segui-la. Em poucos minutos, Qiang fez o mesmo. Pouco depois foi a vez de Micaela e Maire saírem juntas. Então, Sniper soltou um longo suspiro, que chamou a atenção dos que restaram.
– Aleluia, podemos respirar. Os neuróticos se retiraram.
Ouviu-se o som de algo batendo contra a mesa. Voltaram-se para Ryan, que alinhava o copo do irmão ao seu. Diante da incredulidade de todos, Sniper se corrigiu:
– Certo, quase todos os neuróticos se retiraram.
– A Maire é legal. – Declarou Mau – O que a estraga é a tal Micaela Angeli... Lésbica insuportável.
Shermmie riu.
– Idiota! Fala como se a Maire não fosse lésbica também.
– São as más companhias que fazem isso.
– Quem é lésbica? – Indagou Eric.
Sniper empolgou-se em responder:
– As duas minas mais gostosas da equipe.
– Hm... – Eric passou os olhos pelas garotas que permaneciam ao redor da mesa: Anne, Shermmie e Hikari, em quem parou seu olhar por mais tempo – Eu gosto da japinha.
Hikari fez cara de nojo. Sniper tratou de corrigir o novato:
– A Miss Kari não, cara... Falo das que saíram agora: a loira de Gêmeos e a ruiva de Libra.
– Uau... Elas são lésbicas, é?! – Eric deu um longo gole em seu suco – Que da hora!
– Que coisa anormal. – Bufou Ryan, mais uma vez alinhando o copo que seu irmão colocava de volta à mesa.
– Olha quem vem falar de normalidade. – Retrucou Sniper.
– Eu também acho aquelas duas estranhas. – Declarou Shermmie.
Anne, que até então estava calada, perguntou:
– Por que acha isso?
– Você ainda pergunta por quê, fraquinha?
– Não esquenta, loirinha – Disse Maurício – A Shermmine acha todo mundo estranho.
– A começar por você – Retrucou a morena – E meu nome é Shermmie. S-H-E-R-M-M-I-E.
– Mas por que ela chama a todos de “estranho”? – Insistiu Anne – E por que me chama de fraquinha?
Sniper riu e adiantou-se em responder:
– Freud explica, Miss Anne: as pessoas gostam de transferir para os outros os seus próprios defeitos.
– Imbecil... – Rosnou Shermmie. Tomou fôlego para dar prosseguimento à discussão, mas calou-se quando viu Hikari levantar-se subitamente.
– Com licença. – Pediu a japonesa. E, apressada, saiu da cozinha.
Todos (com exceção de Ryan, que estava ocupado demais redobrando um guardanapo), seguiram a garota com os olhos, intrigados.
– Não acharam a Hikari estranha? – Perguntou Maurício.
– Só... – Respondeu Eric. Após pensar por um instante, franziu a testa – Por quê, hein?
Shermmie começou a explicar:
– Ela estava tão...
– Tão... – Sniper tentou continuar.
– Tão... – Repetiu Mau.
Anne concluiu a frase, resumindo o pensamento de todos:
– Calada.
– É... – Repetiram Mau, Sniper e Shermmie, em uníssono.

 *****

Quando Shermmie e Anne chegaram ao quarto, encontraram Hikari sentada em sua cama, com um celular em mãos.
Olhando para as recém-chegadas, a japonesa disparou:
– Trinta e sete chamadas não atendidas. Sabem o que isso significa, num dia como hoje? Trinta e sete convites para sair! – Irritada, jogou o celular sobre a cama e começou a caminhar de um lado a outro no quarto – Eu devia ter ido ao colégio, têm noção do número de mimos de professores e presentinhos de amigas que eu deixei de ganhar?
– Você é tão popular assim? – Indagou Shermmie, levantando uma das sobrancelhas.
– Sou, especialmente no dia do meu aniversário!
– Hoje é seu aniversário? Não disse que sua mãe sempre te dava folga nesse dia?
– Pois é... Mas, ao que me parece, esse ano ela esqueceu.
– Esqueceu? Como isso é possível? Minha mãe nunca esqueceria um aniversário meu. Não é normal os pais esquecerem uma data dessas... Não é, fraquinha?
– Er... – Anne pareceu pensar um pouco. – Meu pai não “esquece” o dia do meu aniversário, porque não pode esquecer o que não sabe.
– Cruzes! – Assombrou-se Shermmie. Olhou para Hikari. – Tá vendo só? Tome a fraquinha como parâmetro e sinta-se muito amada.
– Hunf... – Hikari deixou-se cair sentada na cama de casal – Mas minha mãe sabe muito bem o dia do meu aniversário... Ela nunca tinha esquecido, nunca...
– Pra tudo na vida tem uma primeira vez. Aff, estou morrendo de sono, boa noite.
Shermmie ia subir para o beliche de cima, mas Hikari correu e bloqueou o seu caminho.
– Ei, espera, não pode dormir. É meu aniversário, alguém tem que comemorar comigo.
– Ano que vem a gente pensa nisso, tá? Agora eu preciso dormir.
Dizendo isso, Shermmie subiu para sua cama. Anne sentou-se na sua, começando a prender os cabelos num baixo rabo de cavalo, para dormir. Hikari a observou em silêncio, a mente começando a ter ideias.
– Escuta, Anne-chan.
– Pois não? – Anne a olhou.
– Gosta de balada? 
A loira franziu a testa.
– Como assim?
– Balada. Night, entende? Noitada! Festa, boate, discoteca... Som alto, gente animada...
– Hã?
Shermmie tentou traduzir, ao seu modo:
– Ela fala de som ensurdecedor, uma fumaça nojenta no ar, muita gente suada aglomerada num ambiente apertado, bêbados e drogados pra tudo quanto é lado...
– Acho que não gosto disso. – Respondeu Anne.
Hikari olhou para a morena.
– Você tem uma tendência a olhar tudo pelo lado negativo.
– E você pelo lado empolgado. Bem, mas eu tô morta de sono. Boa noite pra vocês. – Shermmie virou-se e fechou os olhos.
Hikari tornou a olhar para Anne.
– Então, Anne-chan, é legal! Nunca foi a uma?
– Bem... Na minha mansão sempre tinha festas.
– É? Que tipo de festas?
– Festas. Iam os sócios do meu pai e os filhos deles, os empregados serviam champanhe e caviar, e...
– Não! – Hikari a interrompeu – Isso não é balada!
– Então eu acho que nunca fui a uma.
– Você irá a uma... e hoje!
Anne se assustou com o sorriso que Hikari abriu.

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