Capítulo catorze - Amor proibido

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Enquanto despertava, antes mesmo de abrir os olhos, Micaela começou a tatear o chão ao lado de sua cama, à procura de seus óculos. O ombro, ferido, ainda doía, mas bem menos do que no dia anterior. A cabeça era o que doía mais. Por qualquer razão que ela não saberia explicar, quase não conseguira dormir, pois sua mente esteve ocupada demais, relembrando de antigos fatos. Fatos estes que, no momento, ela tornava a visualizar.

Tinha cinco anos de idade. Sentada no chão, usava uma chave de fenda para abrir um rádio antigo e, em seguida, começou a tirar cuidadosamente cada uma das peças e a espalhá-las no chão à sua frente, onde já estava a caixa de ferramentas de seu pai.

Parou o que fazia quando avistou um par de sapatos parando diante de si. Subiu com os olhos, até avistar o rosto de seu pai. Sorriu para ele, que, tentando manter uma expressão séria, abaixou-se diante da filha.

– Mic, che cosa fare?

– Papà! Estou consertando o rádio para o senhor!

– Mas ele não está com defeito.

Ela coçou a cabeça e olhou para todas as peças espalhadas pelo chão.

– Agora está! – E sorriu, inocentemente.

Enzo Angeli não mais aguentou e deixou-se sorrir diante da cena. Não restava dúvidas de que sua única filha fosse uma criança especial. Diferentemente das demais, ela não ligava para televisão ou brinquedos convencionais: sua maior diversão era desmontar aparelhos eletrônicos. Aos cinco anos de idade, já sabia fazer contas simples e demonstrava afinidade com cálculos. Sentia-se bem no meio de adultos e não dava muita atenção a outras crianças.

– Sabe que sua mãe não gosta que você desmonte os aparelhos de casa.

– Mamma não está aqui.

Ele deixou de sorrir, ao notar a tristeza na voz da menina.

– Ela logo estará de volta.

– Eu sei. – Começou a mexer nas peças menores, separando-as das demais – Ela foi pro Japão pra fechar a barreira dos youkais e não deixar que eles venham pro nosso mundo.

– É. E sabe por que ela fez isso?

A pequena Micaela esboçou um leve sorriso e respondeu, sem tirar os olhos do que fazia:

– Porque ela me ama e não quer que nenhum monstro me machuque.

– Exatamente.

Os olhos de Micaela ficaram marejados.

– Mas eu também amo a mamma. Por isso sinto a falta dela. – Uma lágrima ameaçou vir à tona, mas Mic rapidamente passou as costas das mãos pelos olhos, impedindo-a.

Enzo tocou levemente o queixo da filha, levantando-lhe o rosto e, assim, fazendo-a olhar para ele.

– Ela quer que você seja uma menina corajosa e não chore. Logo ela estará de volta.

Mic moveu a cabeça, numa afirmação. Então, sussurrou, como quem conta um segredo:

– Não conta pra ela que eu quase chorei!

– Pode deixar! – Ele também sussurrou e os dois riram, juntos. – O que acha de sairmos para tomar um sorvete?

– Mamma não gosta que eu tome sorvete antes do jantar.

– Mas a mamma não está aqui. – Ele, novamente, sussurrou. – Pode deixar que esse será outro segredo nosso.

A menina rapidamente levantou-se e abriu um largo sorriso, gritando:

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