Essa não é uma história de amor.
É uma história sobre a condição humana a qual estamos fadados.
Condição que nos faz contraditórios.
Vulneráveis.
Que nos limita às circunstâncias deste mundo material, mas nos permite sentir para além da nossa compr...
Talvez por saber que ela iria me ligar no dia seguinte. Talvez pelo receio ㅡ que eu fingia não sentir ㅡ de que a cada ano que passava a chance dela me ligar dia 9 de maio diminuía.
Mas, de qualquer forma, acordei sorrindo de saudade.
Ainda sentia em meus ouvidos as vibrações do seu timbre alto e rouco me ralhando por fugir do banho pós-praia.
Espreguicei todo meu corpo antes de me sentar na cama. Sentado, espiei com o único olho aberto as frestas da janela velha sem cortinas deixando raios finos de sol invadirem o quarto.
O chão gelado de cera acordou meus pés antes que meu outro olho pudesse se abrir.
E descalço, usando apenas a samba-canção de sempre, dei os primeiros passos do que seria um longo dia.
Aquela segunda-feira foi a primeira vez que fui escalado para trabalhar de madrugada na floricultura. Me permiti dormir até mais tarde para poder compensar o sono no fim do dia. Já era quase meio-dia quando levantei.
Horário de almoço. Mas não liguei. Precisava de um café fresco e um pãozinho.
Antes de ir até a cozinha peguei meu celular para colocar uma música. E, ainda movido pela saudade, escolhi aquela que ela cantava para mim.
ㅡ La la la la la la… ㅡ comecei cantando junto, com os olhos fechados ㅡ Now that I've lost everything to you. You say you wanna start something new. And it's breaking my heart you're leaving. Baby, I'm grieving!
E parti para a cozinha para passar o café.
ㅡ Ooh, baby, baby, it's a wild world! ㅡ cantava alto, dançarolando os quadris com o coador em uma mão e o bule quente na outra. ㅡ É vó, você tinha razão. Esse é um mundo selvagem.
Varri a casa ㅡ que não era grande ㅡ, afinei as cordas do meu violão, organizei meus pincéis de pêlo junto das tintas acrílicas no cantinho onde eles ficavam. Já sentia saudade de pintar. Andava tão ocupado.
Mas seria mentira se dissesse que não estava aliviado, mesmo cansado e com dores na coluna. Ter a segurança de um salário fixo me tirou um puta peso das costas.
Me sentei em frente a TV para assistir o jornal da tarde enquanto almoçava, mas acabei me distraindo com as redes sociais no celular.
Rolando a timeline esbarrei em um meme que me lembrou Kim.
Era até estranho que tão naturalmente eu estivesse cogitando compartilhar aquilo com ele. Tinha pouco mais de um mês que nos conhecíamos, ainda lembrava de como ele me intimidou na primeira vez que o vi, mas ao mesmo tempo me deixou tão confortável.
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