3 | Desespero

163 15 4
                                    

Assim que abro os olhos, me apronto correndo. Estou ansiosa para saber como será a minha próxima lição. Assim que termino meu café da manhã, procuro pelo mestre na caverna inteira. Até decidir sair dela e torcer para encontrá-lo logo. Assim que saio da Caverna da Cortina de Água, avisto sua silhueta em meio aos primeiros raios de sol, corro até ela.

- Bom dia, mestre! O que vamos fazer hoje?

- Valente? O que está fazendo aqui fora? Entre, rápido!

- Porque? O que houve?

- Só entre na caverna e não saia por nada deste mundo. Me entendeu?

- Tudo bem, vou entrar.

Me tranco no quarto e fico esperando ele voltar. Mas... e se ele não voltar? Barulhos quase ensurdecedores retumbam na caverna, parece até que estão jogando bombas aqui. Meia hora depois, ouço batidas na porta. Suor frio corre minhas têmporas, trêmula, pergunto quem é.

- Pode abrir, Valente, sou eu, Wukong.

Abro a porta e o encontro todo machucado.

- O que houve? Estava lutando? Tem algum animal nos atacando aí fora?

Ele abre a boca mas, ao invés de falar, desmaia. O amparo em meus braços e o deito no batente.

- Wukong? Wukong! Responde! Ai droga, e agora? Como posso te ajudar? Estou sozinha aqui!

Coloco meu ouvido em seu peito e respiro fundo em alívio. Seu coração continua batendo.

Menos mal!

Procuro por kit de primeiros socorros. Quando pensava em desistir de minha busca, achando que ele não tinha nada disso, encontro o kit em seu quarto. Volto correndo para o meu quarto e o puxo para dentro, começando assim, a cuidar de seus ferimentos. Ao terminar, preparo um lanche, para caso ele acordar poder comer algo, uma tarefa quase impossível pois fico tremendo. E se ele morrer? E se alguém daqui pensar que matei ele caso ele...? Será melhor chamar algum curandeiro?

- Valente...!

Ao ouvir a sua voz, largo o que estava fazendo na mesma hora. O encontro no quarto, com a cabeça apoiada no travesseiro que coloquei. Wukong ainda continua bastante pálido e febril.

- Está sentindo dor? Posso chamar um curandeiro?

- Não é necessário, fique tranquila... ai... vou ficar bem logo... ai.

- Estou preparando um lanche, acha que consegue comer?

- Posso tentar.

Após ele devorar alguns sanduíches e suco de polpa de frutas vermelhas, que eu lhe trouxe em uma bandeja, fico mergulhada em mil pensamentos. Ele nunca me conta nada, pelo menos nada do que eu queria saber. Já estou cansada disso, vou dar o meu jeito para dar um basta nesta história! Ou ele me conta o que está acontecendo ou...

- Já sei. Nem precisa falar. Está cansada por eu estar guardando tanto segredo.

- Ex... exatamente!

- Quando seu treinamento terminar... te contarei tudo.

- O quê? E quanto tempo meu treinamento vai durar?

- Isso depende de você. Quanto mais se esforçar mais cedo termina.

- Tem uma base de quanto tempo pode durar?

- Se você se esforçar bastante... um mês.

- Hmmm...

- Mas precisa se esforçar muito. Nesse ritmo, em que estamos agora, é capaz de levar um ano.

- Então o que estamos esperando? Vamos, mestre, preciso de sua orientação!

- Será que consigo dar aula hoje?

- Só me diz o que preciso fazer.

- Como hoje mal posso me mexer... vai ter que repetir a lição de ontem.

- Meditação?

- Exatamente.

- Sem problemas!

- Mas, calma ae, vou com você, caso eu passe mal, vai poder chamar o curandeiro mais próximo na mesma hora.

- Oh, claro - o ajudo a se levantar para ir ao templo. Como ele não consegue se mexer sem sentir dor, decidimos que farei a lição na sua sala.

- E também quero estar te vigiando, para dar conselhos, assim você vai aprender a meditar corretamente.

- Só me responde uma pergunta. Vou ter que lutar contra algo grande... não vou?

- Sim.

- Ok...

Me sento no centro da sala. Wukong se acomoda no sofá que fica em minha frente. Começo a meditar com a cabeça um tanto agitada, fico repassando em minha mente os seus machucados. Um monstro, algum animal deve ter atacado ele, pois Wukong tem arranhões e mordidas por todo o corpo.

- Está abrindo o olho.

- Foi mal, estou preocupada com você.

- Mas tente se esforçar para não abrir os olhos, finja que não estou aqui.

- Certo, certo. Não é tão difícil, eu consigo.

Minha mente continua agitada, sinto um aperto no peito, de repente, vejo flashes de luz branca, gritos e minhas mãos cobertas de sangue, pessoas inconscientes aos meus pés. Urro, quando pensei que essa angústia iria piorar, "acordo" nos braços de meu mestre.

- Valente! Acorda, hey!

- Tive... um pesadelo?

- Depois de dez minutos de meditação... você... teve uma visão. Deve ter sido isso.

- Será isso mesmo? Essa alucinação foi, na verdade, um presságio?

- Creio que não. Deve ser uma visão para exortar a escolher o caminho certo, um aviso de algo que pode ou não acontecer. Pode falar o que viu?

- Foi horrível. Estava em uma guerra onde... eu destruía todo mundo. Muitas pessoas caídas. Foi bem horrível.

- Mais alguma coisa?

- Apesar da angústia que senti, nesse "pesadelo", eu estava rindo muito.

- Hummm. Continue meditando.

- E se eu...

- Não tenha medo, te acordo se necessário.

- Tudo bem.

No dia seguinte, Wukong ainda se sente mal. Fui meditar perto de um lago, dessa vez, sem a sua supervisão. O que ele, a contragosto, permitiu.

Preciso dar o meu melhor se eu quiser entender o que está acontecendo por aqui.

Risadas me desconcentram por completo. Abro os olhos e vejo alguém conhecido no lago. Percebo que Wukong está só de calça, brincando com macaquinhos. Eu seria estraga prazeres se pedisse para parar. Deixo minha antipatia se esvair na medida em que o observo se perder na brincadeira, percebo como seus ferimentos já estão quase todos cicatrizados. Não consigo conter um breve sorriso. Volto a fechar os olhos e medito até sentir uma mão sacudir meu ombro.

- Era para meditar só até as cinco horas da tarde - ele me diz baixinho. Olho ao meu redor, percebo como tudo está bem escuro.

- Meditei até que hora?

- Já são quase dez.

- Foi mal. Parece que foram apenas 5 minutos de meditação.

- Relaxa. O lado bom é que você aprendeu a meditar. As novas lições serão um pouco mais fáceis apartir de agora.

YES!

A Discípula de Sun WukongWhere stories live. Discover now