10 | Wukong

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Wukong

Assim que conheci Valente, pela primeira vez, identifiquei a enviada para deter... MK. A espionei por dias a fim de ter certeza.

Com a aluna da profecia segura em meu reino, minha preocupação voltou a ser somente o novo Yama. Como MK ficou assim? Ainda estou investigando. Quero muito saber quando exatamente as coisas saíram do controle desse jeito. Sou seu mestre! Eu, mais do que todos, deveria saber! Todas as lições e missões dadas a ele não poderiam transformá-lo nesse monstro em que se tornou. É um absurdo, não faz sentido, é um mistério.

Macaque não pode ter algo a ver com isso, também não faz o menor sentido ele estar por trás dessa catástrofe, afinal esse macaco exibido já está livre das amarras de Lady Bone Demon há meses. O que ele ganharia, dessa vez, por importunar meu discípulo?

Estou preparando Valente para enfrentar todo tipo de ataque, é difícil, pois lhe falta autoconfiança que, às vezes, se converte em perigosas atitudes precipitadas como quando eu tive que tirá-la da jaula onde ela enfrentou meu discípulo pela primeira vez. Até para um imortal como eu, ver a morte frente a frente mais uma vez, me fez duvidar se estou fazendo a coisa certa. Logo eu, o Grande Sábio Igual ao Paraíso, achar que está errando e precisando de ajuda, é cômico e bem mais bem desesperador.

Hoje vamos direto para o reino das mulheres, uma ilha chamada Womanland onde verdadeiras Amazonas são criadas. Espero que o treinamento de lá seja mais do que suficiente para adiantar a criação da guerreira com garra que o mundo tanto precisa.

Ser mestre de dois discípulos ao mesmo tempo está me deixando sobrecarregado. Se é que ainda posso considerar MK meu aprendiz. E eu achava que finalmente iria descansar quando me tornasse mestre... ia colocar todos os meus discípulos para cuidar do meu lar enquanto o rei aqui ia ficar deitado na nuvem voadora, só se entupindo de pêssegos. E do céu, para ficar ainda melhor. Ok, ser mestre é ser mais do que um velho explorador, com certeza, dá tanto trabalho quanto ser pai... talvez. Nunca tive filhos mas deve ser algo parecido.

- Vai ficar aí dormindo até quando? Já almoçamos e você disse que devemos estar lá assim que a gente terminasse de comer - Valente me cutuca, ao limpar a boca com um guardanapo.

- Que apressadinha, você.

- Deve ser meu pior defeito. Mas pelo menos me faz ser pontual.

- Ok, "mocinha pontualidade", convoque a sua própria nuvem e vamos.

- Érr. Não sei como faz isso.

Nos dirigimos para fora da caverna.

- Lembre da meditação, se concentre... aí chame "nuvem cambalhota" ou "nuvem voadora" e logo a magia vai acontecer.

- Fácil falar.

- Ao menos tente.

- NUVEM VOADORAAA! - ela esperou meio segundo para só então dizer... - viu como não acontece na-

E é atropelada pela própria nuvem voadora. Engulo a risada e a ajudo a ficar de pé.

- Tome mais cuidado da próxima vez... até porque meus tímpanos ainda são essenciais, sabe?

- Ah claro! Ai! Obrigada por perguntar se estou bem!

- Partiu Womanland! Uhul!

Pulo na minha nuvem e ela sobe na dela, na maior dificuldade.

- Nossa, está animado além da conta. Como é esse reino?

- Vai ver por si só, tenho a impressão de que vai gostar bastante. Já estive lá algumas vezes.

Nossas nuvens nos levam para longe de casa, logo somos agraciados com um vasto oceano de azul exuberante. Como é bom sentir uma briza oceânica correr através dos pelos, fazia tempo que não experimentava tal coisa. Preciso fazer isso mais vezes, quantas vezes o rei macaco viveu ao invés de só existir? Não fui atrás da imortalidade à toa. Preciso aproveitar mais, experimentar mais, tantos anos vivi lutando... está passando da hora de curtir mais do que somente trabalhar e trabalhar.

- Se MK estivesse bem... o que estaria fazendo agora, mestre?

- Bem... - me surpreendo um pouco com a sua fala, a guria parece ler meus pensamentos.

Ao analisar bem a sua fala, vinda de uma garota do ocidente, minha mente é tomada por imagens de uma festa barulhenta e colorida, na minha ilha mais do que paradisíaca, talvez divinal mesmo, regada a muito vinho celestial, dançarinas de vários reinos, conhecidos e amigos presentes se deleitando do bufê. Algo que é a cara dela imaginar isso. E isso não estaria acontecendo nem em um bilhão de anos, por mais agradável e possível que fosse, ainda assim não seria condizente com a realidade, mesmo em uma época pacífica. Ok, talvez eu tenha exagerado um pouco, bem capaz de'u dar uma festinha similar se o mundo ou o universo não acabar. Após viajar nisso, me forço uma imagem mental mais realista para os dias de hoje. Talvez eu estaria pedindo para MK demolir mais um muro um tanto acabado. É, seria mais ou menos isso.

- Estaria passando alguma lição ao MK.

- Como ele era?

Putz! Essa será uma looonga viagem! Achava que a sua cota de perguntas de menina super curiosa tivesse acabado, pelo visto, não. O que não é tão ruim, nem sempre meu passatempo favorito se resume a ficar em silêncio, meditando.

- MK?

- Sim.

- Ah... um garoto legal, esforçado, trabalhava entregando macarrão de um restaurante, tirava um tempo para ir me ver e seguir meus ensinamentos. Certamente "um figura", tinha que ver. É praticamente meu fã número um, tem tantos action figures de mim que você possa imaginar. DVD's de filmes, videogames, séries. O cara montou um museu de mim, sério.

- Como podemos salvar ele?

- Iremos conversar sobre isso, acho que em breve.

- Vamos salvar ele, não vamos?

- S-sim, claro.

Se ela soubesse quais planos tenho para meu agora provavelmente ex aluno, com certeza já teria me derrubado dessa nuvem sem pensar duas vezes. Talvez nunca mais olharia na minha cara. O que estou fazendo? Que belo mestre eu sou.

Se bem que ela pode não ser tão certinha, ainda mais levando em conta como nos conhecemos, quem sabe nem se importa de fato com qual fim MK terá, afinal está tão feliz por ser minha discípula, difícil ela ligar mesmo para isso, tem cara de "tanto faz desde que isso acabe logo"... e todas essas perguntas foram feitas no calor da emocionante aventura que está se desenrolando diante de seus olhos, algo único na sua curta vida humana e mortal. Em seus sapatos, eu estaria pouco ligando se conseguiria salvar o "monstro".

De alguma forma, lá no fundo, ainda sinto aquele garoto lá. Queria muito poder resgatá-lo, queria mesmo. Quem conheceu MK de verdade aqui, fui eu e quem, mais do que ninguém, sente a dor de ter perdido ele sou eu, ela não tem nem ideia de nada disso.

Olha só para ela! Sorrindo como se testemunhasse o nascimento de algo extremamente maravilhoso, parece ter esquecido de ter levado uma bela surra do Yama terrestre e dos resultados do relatório de caos mundial. Não sei se fico tranquilo por ela não estar se descabelando, satisfeito por alguém ainda ousar sorrir no fim de mundo em que nós estamos ou se a repreendo por se divertir em meio a tantos problemas, sendo o de como ressuscitar pessoas ceifadas por MK, um deles.

Respiro fundo e opto por deixar a guria relaxar pois, o que nos resta de paz, pode nos ser tirado a qualquer momento.

A Discípula de Sun WukongOnde histórias criam vida. Descubra agora