30 | Fênix

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Ok, ok. Não esperava por isso. Fazer uma anotação mental para evitar aceitar propostas de qualquer pessoa, pois isso é o cúmulo, de novo me ferrando, fala sério, não esperava terminar dessa forma e se tivesse dito não a um certo yokai ruivo, mais especificamente um primata celestial, nada disso estaria acontecendo. Burra, burra, burra!

Sorrindo, um demônio estende um pergaminho na escrivaninha em minha frente. Me obrigo a ler.

"Caro Grande Sábio Igual ao Paraíso, Sun Wukong

Sua sucessora, Valente, foi atingida em cheio por um tacape do guardião de pomar das manfruits. Isso a fez vir parar no mundo de Yama's House. Estamos lhe enviando esta carta para avisar: venha tirar o corpo da sua discípula da época errada! Qualquer reclamação, recorrer a staff. Abaixo, segue uma assinatura da alma de sua ex aprendiz para confirmar sua estadia conosco antes de reencarnar.

Agradece, o secretário particular do nobre senhor Yama."

- Está brincando com a minha cara? - empurro o papel de volta.

- Só assina logo essa porcaria - o demônio me empurra o papel.

- Não vou assinar nada! - empurro de volta mais uma vez. - Estou no meio de uma missão importante! Me mande de volta para o mundo dos vivos!

- Vou chamar o seu mestre, ele vai resolver isso já.

- Se eu fosse você, não faria isso.

- Porque? Nunca vi seu mestre mas, por não ver esse cara no reino celestial, com certeza não é ninguém importante.

Dou uma risada, das mais exageradas que consigo. Estou presa em uma espécie de masmorra no mundo dos mortos e ainda tenho que aguentar um estagiário chato que nem se quer sabe quem é Sun Wukong. Ok, isso tinha que piorar de vez.

- Ficou louca? - ele contorce a cara em ódio, seus dois chifres cintilam no semi breu do escritório todo da cor negra.

- Você que deve estar louco se acha que vai resolver as coisas chamando ele! Ele já destruiu essa parte do submundo antes, ele pode fazer isso de novo.

- Ela... - um outro demônio irrompe ofegante na saleta - ela tem razão!

O demônio recém chegado fala algo no ouvido do outro que logo desfaz a cara rabugenta, diz ao ofegante:

- Sério? Caramba! Porque não me disse isso antes?!

- Caham! - ajeito a gola de minha veste, para chamar mais atenção. - Ainda vão me manter aqui?

- Vou pensar no seu caso... é... vai... bem, vai ficar aí enquanto analisamos a sua situação - o demônio estagiário ajeita alguns papéis da mesa evitando a todo custo um mero contato visual. O outro se retira rapidamente. Reprimi um suspiro, a nova informação recebida não foi suficiente para me libertar desse cárcere que todos os seres vivos mortais estão destinados a conhecer mais cedo ou mais tarde.

De repente, sinto um tremor tomar conta do meu corpo. Não posso estar me decompondo, só tem minha alma aqui. Reparando bem, meu corpo ou alma está se fragmentando. Antes que eu pudesse perguntar o que estava acontecendo, levanto de um chão verdejante mais pesada do que costumo me sentir.

- Ai... - levo uma mão a cabeça, me sinto como se tivessem me atropelado. Já passei por isso, de novo ter essa sensação é algo que definitivamente não esperava.

Doce e leve azedume contemplam a língua. Farelos de algo descem a garganta. Alguém me empurrou uma manfruit quando não estava no mundo dos vivos. E esse alguém está me encarando perto de mais. Estou tentada a dar um safanão nele e alertar sobre a falta de educação que é invadir o espaço pessoal dos outros.

- Pode se levantar? - Wukong pergunta ao se afastar com a manfruit metade mordida por mim ainda em suas mãos.

- Por algum milagre, sim.

- Forcei sua mandíbula a morder essa belezinha, te salvei.

- O monstro! - finalmente lembrei de meu algoz.

- Se acalme - Sandy acalenta - nos escondemos, ele não vai nos encontrar tão cedo aqui.

- Menos mal - lanço olhando a moita que nos cerca.

- Au! - Wukong geme quando piso em sua cauda.

- Isso foi culpa sua! - aponto o dedo para seu focinho.

- Minha? Se uma certa lobinha não estivesse lá, eu poderia ter dado conta daquele demônio sozinho - posso ver como ele está todo rasgado, com certeza foi um martírio me arrancar das garras daqueles Yaoguais.

- Sei - limpo as vestes dando tapinhas rápidos.

- Será que já podemos sair? - Pigsy questiona enquanto tenta ver alguma coisa pelas fendas dos arbustos.

- Érr, não! - declaro ao fitar, entre uma brecha própria, gigantes chifrudos vagando perto de nós.

- Não podemos ficar presos aqui! - Pigsy se desespera.

- Mas se a gente sair também... - Wukong se espreguiça. A calma desse cara é impressionante às vezes.

Passamos um bom tempo na moita, conversamos baixo aleatoriedades a fim de manter a calma e poder esperar com um pingo de tranquilidade ameaçando evaporar a qualquer instante. Quando finalmente os monstros guardiões se afastaram, saímos da planta e nos deparamos com lanças voltadas em nossa direção.

- Então foi você que comeu minhas frutas? - fala uma garota através de uma máscara horrorosa, sua lança quase me rasga. Alguns estão apenas com a cara pintada, a maquiagem é horripilante também.

- Céus, isso tinha que piorar - levanto as mãos, me rendo para ver até onde isso vai dar.

- Uaaah! - Wukong se espreguiça, para a irritação do Team Tripitaka.

- Está bem tranquilo para quem vai virar um assado - digo a Sun ao observar alguns inimigos salivarem.

- Já passei por isso antes, não vai me fazer mal - Sun boceja, me controlo para não esganá-lo. Está claro que empatia passa longe desse macaco, o restante da turma incluindo a mim, não são tão resistentes fisicamente quanto ele. Finalmente pude entender porque Tripitaka teve que colocar essa faixa de controle no Wukong.

Então é assim que a vida de Valente acaba, não morta por yokais vigias mas por donos das frutas com formas de bebê. Somos levados até uma cozinha suja, sabe se lá, a quanto tempo. Pigsy e Sandy são colocados em uma fornalha, Sun e eu em outra, ambas sem fogo... ainda. Renasci feito fênix, hora de partir novamente igual a uma.

A Discípula de Sun WukongWhere stories live. Discover now