30 - next to you

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As palavras do curto e-mail da galerista ainda ecoavam na minha mente horas depois, enquanto eu sentia a água quente do chuveiro bater nos ombros e tentava processar o que aquilo tudo significava.

Cara Helena Oliveira,
Aqui quem fala é Charlotte Bourgogne, da Galeria Espace 22. Eu e a minha equipe gostaríamos de fazer uma proposta de trabalho para você.
A galeria irá realizar uma mostra especial para comemorar os 70 anos do Grande Prêmio de Mônaco, exibindo quadros e peças que contam a história das corridas no principado, e precisamos de uma consultora com experiência em montagens de exposições narrativas. O seu nome nos foi indicado por uma pessoa de confiança, e esse contato é para entender se essa função seria do seu interesse.
Caso a resposta seja positiva, aguardo o seu retorno para que possamos marcar uma reunião mais detalhada a respeito do trabalho.
Atenciosamente,
Charlotte Bourgogne

Eu li e reli aquele parágrafo diversas vezes para ter certeza de que tinha entendido direito, e que aquilo era realmente um convite de trabalho. O meu primeiro convite de trabalho oficial, como curadora de arte, e ainda para uma exposição sobre automobilismo. Em Mônaco!

Charles, por sua vez, não teve dificuldade nenhuma em acreditar naquele acontecimento, rapidamente me assegurando o quanto eu era talentosa e capaz, e que era a melhor escolha para que aquela exposição fosse um sucesso. É claro que o fato de estar em um relacionamento com um piloto de Fórmula 1 não escapou das minhas elucubrações, me perguntando o quanto isso tinha influenciado para que aquele convite acontecesse, mas guardei a dúvida para mim. No entanto, encaminhei o e-mail de Charlotte para Francesca assim que o peso do que ele realmente significava tomou conta de mim, pedindo desculpas por incomodá-la no segundo dia do ano. Eu precisava desesperadamente de orientações da minha orientadora. E, se a galeria tivera tanta pressa ao me contatar tão cedo, era porque também precisavam de uma resposta em breve, e a minha conversa com Francesca não poderia esperar.

O cheiro de queijo, manjericão e molho de tomate alcançou o meu nariz assim que eu saí do quarto de Charles depois do banho, encontrando-o sentado no chão da sala de estar junto da mesinha de centro, com a pizza que tínhamos decidido pedir para o jantar ocupando o centro dela. Eu ainda estava uma pilha de nervos, mas aquela visão tão rotineira que eu já presenciara tantas vezes naquele apartamento ajudaram a aliviar um pouco a tensão no meu peito.

– Está mais calma? – Charles perguntou, parecendo ser capaz de ler os meus pensamentos, e abriu espaço para que eu me sentasse ao seu lado.

– Uhum – eu murmurei com um meio sorriso, vendo a expressão satisfeita no rosto dele. – Mas vou ficar mais depois que Francesca me responder.

Charles riu, dando um gole no copo de água e passando o outro, com Coca-Cola, para mim, junto com um punhado de guardanapos.

– Vai dar tudo certo, amore – ele falou, com a voz suave como veludo.

Eu não era capaz de entender o motivo, mas ele conseguia me fazer acreditar em qualquer palavra que saísse de sua boca, e aquela afirmação tão convicta e serena diminuiu um pouco mais do bloco de concreto que parecera se formar no meio do meu estômago, fazendo com que eu me sentisse pronta para devorar a pizza. Ainda assim, eu me mantive em silêncio durante quase todo o jantar, mal conseguindo prestar atenção na série que Charles escolhera para assistirmos naquela noite, absorta na confusão de pensamentos que atravessava a minha mente. "Eu não estou pronta para um trabalho desse", "O que Francesca pensaria sobre isso?", "Será que eles só me procuraram por causa de Charles?", "Por que eles precisariam de mim?", "Será que eu posso dar conta?". Aquelas dúvidas me inquietam tanto que, quando o meu celular vibrou sobre a mesinha de centro, eu quase o atirei longe na pressa de pegá-lo e desbloquear a tela para encontrar a resposta de Francesca.

ℛ𝑎𝑐𝑖𝑛𝑔 ℋ𝑒𝑎𝑟𝑡𝑠 [ᴄʜᴀʀʟᴇs ʟᴇᴄʟᴇʀᴄ]Where stories live. Discover now