ℛ𝑎𝑐𝑖𝑛𝑔 ℋ𝑒𝑎𝑟𝑡𝑠 [ᴄʜᴀʀʟᴇs ʟᴇᴄʟᴇʀᴄ]

37 - welcome to new york

Se Charles não tivesse aparecido assim que eu desliguei o telefone, eu não fazia ideia de como teria contado aquilo para ele. Mas acabou sendo melhor assim, já que, com a cabeça ainda atordoada pela ligação de Samantha, a minha boca foi mais rápida do que o cérebro e eu repeti cada palavra que ela tinha me dito, sem ter muito tempo para pensar nas consequências daquilo. Essa reflexão ficou por conta da hora em que entrei no chuveiro, me atingindo como um soco no estômago.

Receber um convite como aquele do Metropolitan Museum of Art era como uma confirmação de que tudo que eu fizera na minha vida profissional tinha valido a pena. Nova York era o sonho da maioria dos estudantes de arquitetura e, como recém formada no mestrado em Arte Contemporânea, o MET era o clímax profissional que qualquer um desejaria, e aquela perspectiva fazia o meu peito inflar com a importância e o significado que aquilo teria para a minha carreira. No entanto, aquilo demandaria mais uma mudança: da Itália para os Estados Unidos, com o enorme oceano atlântico entre mim e a vida que eu construíra nos últimos meses, e essa possibilidade provocava um tremor por todo o meu corpo.

Enquanto sentia a água quente escorrer pelos meus ombros, eu repassava mentalmente a conversa que tivera com Charles minutos antes, em que eu expressei justamente essa preocupação, que me invadiu como uma onda que tomava as areias da praia sem aviso algum.

– Uau, o MET – ele exclamou assim que eu terminei de contar sobre a proposta. – Isso é incrível, Lena – um sorriso iluminou o rosto dele. – Você deve estar orgulhosa!

– Eu estou, mas... – encolhi os ombros, tentando entender o que exatamente se passava na minha cabeça. – É uma grande mudança, eu... – dei um suspiro pesado, erguendo os olhos para ele. – Eu não sei se tenho coragem.

– Mas é claro que tem! – Charles rebateu logo em seguida. – Você é uma das pessoas mais corajosas que eu conheço – ele envolveu meu rosto com as mãos, e meu coração errou uma batida com as palavras doces dele. – Eu entendo pouco de arte, mas sei o quanto isso seria incrível para a sua carreira.

– Seria mesmo – eu murmurei, mordendo o lábio inferior. – O MET é o ápice para qualquer pessoa que trabalha com arte, mas... – hesitei, sentindo o olhar atento do monegasco fixo em mim. – Mas são seis meses, Charles! Com a possibilidade de virar um ano – eu exclamei, sentindo o peso daquelas palavras me atingir como um soco. – É muito tempo para uma mudança tão drástica.

– Eu sei que essas coisas parecem assustadoras – Charles acariciou as minhas bochechas. – Mas isso pode ser uma realização e tanto para você – ele me ofereceu um sorriso doce e cheio de confiança. – Se você não tentar, nunca vai descobrir.

A afirmação de Charles era carinhosa como sempre, e o simples toque de suas mãos quentes no meu rosto tiravam um pouco da tensão que pesava em meus ombros.

– Não é só isso – eu suspirei novamente. – Eu gosto tanto dessa vida que construí para mim nos últimos meses, e... – envolvi a cintura dele com os braços. – Não sei se consigo deixar isso tudo, a gente, para trás.

– Você não vai deixar a gente para trás, amore! – ele exclamou, deixando um beijo suave na minha testa antes de continuar: – Não tem nada que eu ame mais do que ter você comigo nas corridas, ou te encontrar quando eu volto para casa – Charles falou com a voz baixa, afagando a minha nuca delicadamente. – Mas é da sua carreira que você está falando – as íris verde esmeralda me encararam intensamente. – Essa oportunidade é espetacular, você precisa aceitar.

Com o rosto de Charles a centímetros do meu, eu conseguia enxergar cada uma das pintinhas que pontilhavam as bochechas dele, e a forma como as duas covinhas ficavam aparentes com o sorriso terno que ele mantinha nos lábios o tempo todo enquanto conversávamos. Por um lado, a presença dele me envolvia em uma aura calma e tranquila, mas, por outro, milhares de pensamentos confusos pareciam contorcer o meu cérebro, dificultando o meu raciocínio.