PERMITIR-SE

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Na cama já era possível escutar o som das árvores balançando com o vento, os som das folhas se debatendo contra o ar gelado que as incomodavam, se não fosse chover agora pela manhã, provavelmente choveria pela tarde.

No momento em que coloquei os pés para fora do prédio caiu uma gota de água na minha bochecha, uma garoa pequena começou a se espalhar junto ao vento. Apressei os passos, Gabriel estava em frente a calçada, o vento agora estava mais forte, meus cabelos já se encontravam na frente do meu rosto.

Oi - disse Gabriel

Oi - respondi - Vou tentar chegar até o terminal ali antes de cair esse pé d'água.

E como se estivesse zombando com a minha cara após a última palavra ter sido pronunciada começou a cair o mundo.

Corri para dentro da galeria, e Gabriel veio logo atrás. Me sentei em uma das mesas entre tantas, ali dentro era cheio de comércios, entre comida japonesa, churrascaria, lanches e até um quiosque que vendia Açaí.

Limpei os pingos de chuva que estavam presentes na minha testa, e coloquei a minha bolsa no colo. Gabriel começou a fazer o movimento para sentar-se na cadeira a frente.

- Você não vai trabalhar? - Perguntei 

- Você gosta muito de mim ein, carai. Tá chovendo! - disse ele apontando para entrada em indignação em pé com a mão na cintura após voltar a postura em um pulo.

Soltei uma risadinha. 

- Pensei que você ficava fazendo alguma coisa interna quando chovia. 

- Não, se chove não trabalhamos.

- Então tá bom.

Gabriel sentou-se finalmente na cadeira a minha frente.

- Diga moça, o que faz por aqui todos os dias?

- Eu trabalho aqui do lado, sou jovem aprendiz.

- Faz sentido, te vejo passando por aqui todos os dias.

A conversa foi se desenrolando, descobri que Gabriel era 1 ano mais velho que eu, já tinha alcançado a maioridade, morava sozinho em um apê e, estava naquele emprego porque precisa conseguir pagar a faculdade. Ô vida sofrida a do universitário, pensei.

Também contei um pouco sobre a minha vida, disse que cursava canto no Senac, "que dahora" disse ele, falei que meu sonho era ser cantora desde que me conhecia por gente, e que completava os 18 anos só no ano que vem em agosto.

Em alguns momentos da conversa, eu olhava os gestos de suas mãos, ambos deixamos as mãos fechadas e ás vezes aberta por cima da mesa, meu coração dava uns saltinhos quando eu pensava em demonstrar algum possível interesse pegando em sua mão, me aproximei algumas vezes com os meus dedos, mas todas as vezes eu recuava. Gabriel fala pelos cotovelos e, acho que não percebeu as minhas tentativas de pegar em sua mão. 

E por fim veio a parte da conversa que eu mais me interessava em saber

- Você namora? - Perguntou Gabriel

- Não - disse rindo com a voz ressoando na garganta

- E você?? - perguntei olhando em seus olhos, com as sobrancelhas levemente levantadas.

- Não! Eu não vou namorar nos próximos 2 anos.

- Porque?? - Perguntei curiosa, e dessa vez com as sobrancelhas pra baixo junto ao enrugado que se formou em minha testa.

- A última garota que namorei acabou comigo, não quero voltar pra essa vida tão cedo, então me prometi que não iria namorar nos próximos 2 anos.

A notícia ruim é que ele não pretendia namorar ninguém por 2 anos, e a boa é que ele não namorava ninguém. 

- E se alguém mudar isso? - perguntei 

- Eu acho difícil - respondeu ele, como se estivesse desacreditado de que isso aconteceria.
Ou seja, ainda há uma chance pensei.

A chuva já tinha passado, e Gabriel finalizou a conversa informando que teria que voltar pro trabalho. Levantamos seguindo para a frente da loja, me despedi de Gabriel acenando com um leve arquear dos lábios próximo de um sorriso.

- Até - respondeu com a sua mão acenada também. 

Se eu não pedisse agora, poderia perder as chances, nesse momento o coração começou a bater como se fosse correr uma maratona. E se ele falasse que não? Ou começasse a rir?

Lembrei da minha mãe falando em meus pensamentos "O não você já tem minha filha".
Em um impulso sem pensar duas vezes perguntei. 

- Me passa seu número?

- Anota ai - respondeu 

O coração batia como se fosse pular na minha mão, e eu só rezava para que o rubor de minhas bochechas não me denunciasse. 

Entreguei o celular em suas mãos para que ele anotasse o número. 

- Aqui está.

- Obrigada - disse tentando esconder a vergonha com o misto de felicidade que eu estava sentindo. 

Fui embora parecendo uma criança saltitando, sentei no banco do ônibus e a primeira coisa que fiz foi olhar a sua foto de contato. Gabriel usava uma camiseta social justa azul com botões brancos, o cabelo bem cortado, ele estava lindo naquela foto.

E se eu mandasse mensagem? 

Rapidamente antes que eu desistisse enviei um Oi.

Um Clichê por entre as Curvas do espelhoTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang