Capítulo 25

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ARÁBIA 

 - Oh chefe, deixei a doida da Lara lá e ela foi o caminho todo chorando - Caneta disse assim que entrou na boca,

- Eu sou um fudido mermo - passei a mão pelo meu rosto - tô amarradão na dela e fazendo a mina sofrer.

- Tu não pediu minha opinião então não vou dar, mas fica mec que uma hora as coisas chegam no lugar e se ela for pra Minas mermo vai ser bom pra pensar um pouco até tu resolver toda essa lambança que tá rolando - ele coçou a cabeça, sei que ele vai ficar do lado da Lara de qualquer jeito - é muita merda junto pô, é invasão, é alemão arrombado achando que tu é moleque, é milícia querendo mandar e agora a Samantha com essas crises dela, com todo respeito, mas acho que isso é tudo teatro.

- É isso que eu tô indo saber agora, a psicóloga dela chegou ai pra avaliar o estado de saúde dela e tô descendo pro postinho agora pra trocar um papo com ela. 

 Ele não disse mais nada e nem eu, peguei minhas coisas e fui descendo pro postinho andando mermo, essa parada da Lara ir pra Minas tá me deixando pilhadão, mas agora não posso pensar nisso, apesar de tudo eu preciso vê o que a mandada da Samantha tem. Ela foi mãe do meu filho, já quase morreu por mim e esteve do meu lado todas as vezes que eu cai, desde quando eu era só um pé rapado, não posso simplesmente virar as costas agora. 

Entrei no postinho e me falaram o quarto que ela estava.

- Sua mulher tá no quarto 9, da ala 2, só seguir a faixa amarela no chão - a moça da recepção disse.

- Ela não é minha mulher mais não, que isso fique bem claro - sempre vão associar ela a minha mulher, puta que pariu viu - não quero ir ver ela não, manda chamar a psicóloga dela que quero trocar uma ideia com ela, faz favor.

A mulher apenas concordou e sumiu pra dentro do corredor. Pouco tempo depois voltou acompanhada de uma loirinha, nem alta e nem baixa, com uma roupa formal e de óculos, carregando uma prancheta em suas mãos.

- Olá Arábia, eu sou a Camilla, psicóloga que está acompanhando o caso da Samantha - estendeu a mão para mim e eu apertei cumprimentando com um aceno de cabeça - me disseram que quer conversar comigo a respeito - ela parecia um pouco nervosa e aquilo estava me incomodando, mas deixei passar.

- É isso mermo, vamo sentar alí porque esse papo deve demorar - olhei pra recepcionista que entendeu o recado e nos levou até uma sala, nos deixando a sós em seguida - tô ligado que tem a questão de sigilo de cliente e não quero que tu rompa sua ética, mas preciso ficar a par de tudo que está acontecendo com ela e preciso saber o que é o melhor pra ela - fui direto ao ponto.

- Então, desde que começamos os atendimentos ela demonstrou ser uma mulher bastante forte, mas que possuia uma dependência emocional muito forte em você, o que fez com que ela se perdesse, tentamos achar alguns robes e algo que ela gostasse de fazer, além de fazer com que ela se cuidasse mais - ela olha a prancheta em suas mãos e respira fundo, parecendo frustrada - estava tudo indo super bem, começou até a se envolver com uma pessoa, mas quando soube que você estava fazendo o mesmo, e quando soube que era com uma tal de Lara, tudo piorou...

- Mais respeito ao citar o nome da Lara na conversa - fui ríspido a fazendo ficar em alerta.

- Me perdoa se soou como falta de respeito, é apenas porque não a conheço - passou a mão por seus cabelos, mostrando mais uma vez nervosismo, isso já estava começando a me tirar do sério - prosseguindo, ela começou com um quadro de ansiedade e crise de pânico, fazendo com que ela terminasse o relacionamento que havia começado, sentindo medo de sair na rua e crises como falta ar, vômito, diarreia e choro começaram a ser recorrentes, ela deixava claro que não estava feliz em morar no asfalto, como ela mesmo diz, que sentia falta do morro, da casa dela e da rotina, que ali onde ela morava ela não conseguia identificar como sua casa - fez uma pausa olhando novamente pra sua prancheta - o que aconteceu hoje, o desmaio, é algo comum de acontecer em pacientes com esse quadro, mas não é algo normal, sendo o limite que seu corpo conseguiu aguentar, por isso a minha recomendação é que ela volte para a vida que tinha antes, mesmo não sendo mais como sua esposa, mas para a rotina e casa de antes, e que isso seja retirado dela aos poucos.

- E como que faço isso de retirar aos poucos? - perguntei para saber se conseguiria seguir essa ideia que ela quer propor.

- Ela vai voltar a morar na casa que era de vocês e vocês voltariam a conviver, mesmo que sem nenhum vínculo amoroso, que já é a primeira coisa retirada dela, após um tempo de acompanhamento ela mudaria para outra casa, mas ainda próxima a de vocês, depois mudaria para uma casa mais distante e mais próxima ao asfalto, até conseguirmos que ela volte para o apartamento dela - ela falava isso olhando em meus olhos, me passando a credibilidade necessária - mas mesmo ela morando aqui e tendo uma rotina parecida com a que tinha antes, ainda precisa trabalhar, que é a loja que tem no asfalto, se deslocando todos os dias para ver que essa realidade agora faz parte da vida dela, até que ela se acostume com uma nova realidade.

- E tu acha isso tudo necessário mermo? - pergunto sincero - porque eu não tenho tempo de ficar sendo babá de mulher velha.

- Por isso aconselho que sua amiga Thais a acompanhe em todo esse processo.

- Beleza, já pode ir já.

Puta que pariu, mais um problema caindo no meu cu. Se eu fizer tudo que essa tal Camilla está aconselhando minhas chances de voltar com a Lara vão ser cada vez menores, em compensação as chances da Samantha achar que voltou a ser minha mulher e piorar sua dependência emocional em mim vão ser cada vez maiores.

LARA

Tudo bem que minha decisão pode ter sido um pouco precipitada, mas no momento eu só pensava em me desligar de tudo que me fizesse pensar nele. Depois que Caneta me deixou em casa e disse que o chefe não deixou ele trazer nada dele embora, subi e tomei meu banho. Prometi pra mim mesma que só me permitiria chorar por ele ali, naquele banho enquanto a água do chuveiro caia em minha cabeça, se misturando com minhas lágrimas e indo embora pelo ralo.

No sábado mais tarde, liguei desmarcando todos os meus atendimentos, com a desculpa que precisaria fazer uma viagem de emergência, o que não era totalmente mentira. Liguei para minha mãe e avisei que iria de ônibus até Belo Horizonte, sem entender nada ela apenas disse que me buscaria na rodoviária na manhã seguinte e que chegando lá iríamos conversar. Avisei também Victória, que surtou comigo, mas disse que entendia e que estaria ali sempre pra me ajudar no que eu precisasse.

Arrumei minha mala, fechei a casa e tranquei todos os cômodos. Antes de sair fechei todos os registros de água e a chave de luz. Dei uma ultima olhada no apartamento que era meu lar e com o coração apertado tranquei, pedindo um uber até a rodoviária. Eu sei que vou voltar, mas não sei quando, e uma sensação diferente de todas que eu já senti percorreu por todo meu corpo, fazendo com que meus olhos se enchessem de lágrimas.

Foi tudo muito rápido, desde quando cheguei na rodoviária até a hora de embarcar. Chorei tanto que acabei adormecendo, e quando acordei já estava chegando em BH, cidade que vim apenas duas vezes, mas que ganhou meu coração.

Ao desembarcar já vi minha mãe me esperando próximo ao ônibus, peguei minhas malas e fui até ela, que saudade que eu estava dessa mulher.

- Que saudade mãezinha - abracei seu corpo, sendo correspondida por um abraço apertado com sensação de lar - você faz tanta falta no Rio.

- Oh minha filha, a mãe também estava com muitas saudades - beijou minha cabeça e me soltou - vamos que eu ainda tenho uma reunião hoje pela manhã, mas minha tarde é toda sua e você vai me contar tudo que se passa aqui dentro - colocou o indicado em cima do meu peito, e eu apenas concordei com a cabeça, fazendo um bico tentando não chorar.

Entregue à LoucuraWhere stories live. Discover now