Quatorze - O investigador Josh Bethel

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Corey aparentou demorar um tempo maior do que o necessário para finalmente processar o que Melissa havia dito. Parecia ainda perdido pelo mundo paradisíaco que invadiam sempre que faziam sexo. E então seu olhar excitado se tornou algo turvo entre confusão e descontentamento. Melissa repentinamente se viu tomada por um inesperado e estranho sentimento de... Ódio. Por Kate. Porque havia ligado, mais uma vez, para dar notícias ruins, porque a notícia ruim havia tirado o estado de paz em que finalmente havia levado Corey, aquele que lutara tanto para que ele atingisse. Um balde de água fria aquela ligação, um tanto inconveniente, com certeza. Porém, acima de tudo, providencial. Quando Corey formou com os lábios as palavras "o que aconteceu?" Melissa voltou ao estado normal, ao que tinha a capacidade de se preocupar com a informação que Kate havia lhe dado.

-Melissa? – ela chamou do outro lado da linha.

-Desculpe. Fiquei me perguntando quando você vai ligar para dar uma boa notícia...

-Acredite, não gosto de ser a porta-voz das más notícias, mas ainda bem que tenho acesso a elas, não?

-Bem, sim. Fico pensando num modo de te agradecer.

-Eu gosto de finais felizes, construa um com Corey em minha homenagem.

Melissa riu, e então respondeu:

-Estou tentando, mas seu namorado não quer deixar.

-Ele não é exatamente meu namorado e, bem, quanto a isso não posso fazer nada, a não ser passar informações privilegiadas dos movimentos dele.

-E quando ele pretende fazer essa tal "diligência"?

-Esse é a parte mais problemática do problema... Ele está em Londres essa semana e acabou de me ligar cancelando um jantar nosso que aconteceria hoje por conta desta "diligência". Pode ser a qualquer minuto...

-Você acha que é hoje? – a voz de Melissa se tornou mais urgente.

-Bem, se o jantar era hoje e ele ligou remarcando para amanhã, não tenho muitas dúvidas quanto a isso...

Melissa soltou um longo suspiro, e então respondeu:

-Eu preciso...

-Sim, eu sei. Boa sorte.

-Obrigada. – disse por último, e então desligou o telefone.

Muito embora soubesse que deveria estar correndo contra o tempo naquele momento, pensando em um modo seguro e inteligente de sair daquela peculiar nova situação, Melissa se viu parada no meio da sala, nua, com o celular pendendo na mão e o olhar perdido nas listras de sua cortina. Uma cena ridícula de ser apreciada, tinha plena certeza. Porém não conseguiu se preocupar com o que Corey poderia pensar a respeito. Sua cabeça trabalhava para chegar à única conclusão plausível: as coisas estavam ficando mais sérias do que planejava.

De repente pareceu se dar conta do tipo de consequências que ajudar um condenado a fugir de sua prisão traria. Poderia afirmar que o amor por Corey lhe obrigou a fazer certas coisas que, em sã consciência e bem distante daquele maldito sentimento, jamais passariam por sua antes tão centrada cabeça. Corey virou a Melissa recém-formada psiquiatra de cabeça para baixo, desfez seus conceitos e planos, seus ideais e objetivos. Havia nele algum tipo de encanto sobrenatural, único meio de explicar tal fenômeno. Antes não havia pensado na possibilidade de ser investigada pela polícia, parecia algo muito mais simples de lidar quando o que mais importava era o planejamento de uma fuga de um manicômio judiciário muito bem equipado, obrigada. Ser interrogada pelo investigador Josh Bethel, quando ainda no St. Marcus Institute, quando os ideais ainda pareciam frescos na memória, havia sido mais fácil. Naquele momento, contudo, Melissa se viu paralisada por uma espécie nova de pânico, uma que ainda não conhecia, uma que preferia jamais ter conhecido. Porque tinha certeza que não saberia lidar com o que estava por vir.

Lobotomia (Livro II)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora